sábado, 31 de outubro de 2020

CONNERY, SEAN CONNERY

Nunca teve para nenhum outro. Sean Connery foi o primeiro e ainda é, não o melhor, mas o único James Bond. Quem tem dúvida nem precisa ver os filmes em que ele encarnou o agente 007. Basta olhar uma foto como essa aí do lado para sentir o perigo e o sex-appeal que esse escocês exalava, até já bem entrado em anos. Eu até gosto do Daniel Craig, mas acho que seu Bond tem dois defeitos graves: 1) não tem um pingo de classe e 2) é louro. James Bond sabe a ordem dos talheres e tem os cabelos escuros como a noite. Connery teve uma vida abençoada, cheia de prêmios e sucessos, e morreu aos 90 nas Bahamas, enquanto dormia, cercado pela família. Não fica melhor que isso.

VERDEVALDO SE VAI

Glenn Greenwald me causa mixed feelings. Admiro muito a coragem dele, tanto a de enfiar o dedo na cara dos poderosos como a de expor a linda família que formou ao lado do David Miranda. Mas às vezes ele se acha o fodão do jornalismo investigativo, como se cada reportagem fosse capaz de derrubar governos e mudar o curso da história. Não sou só eu, aliás: nas redações, GG é tido por um pavão. E foi com argumentos de primadonna que ele se demitiu do The Intercept, o site do qual era um dos sócios, alegando ter sofrido censura num artigo que queria publicar sobre Joe Biden (os editores dizem que só queriam uma checagem mais rigorosa). O artigo saiu de qualquer jeito, e depois de lê-lo fiquei com a sensação de que o Verdevaldo simplesmente mordeu a isca que o New York Post lançou ao mar, na tentativa de criar uma "supresa de outubro". O jornal pertence a Rupert Murdoch e declarou apoio explícito à reeleição de Trump. Além disso, as acusações contra Hunter Biden são tão capengas que "se perderam no correio". Não que não tenha coisa aí. Por que o filho do vice-presidente dos EUA teria lugar no board da empresa de gás da Ucrânia? É óbvio que rola uma grana grossa nessa história. Acontece que quem está do outro lado é o presidente mais corrupto, divisivo e inepto da história americana. Greenwald age como alguns amigos meus de esquerda, que exigem pureza absoluta de seus candidatos e fodam-se as consequências. Foi essa atitude de "ãin mas a Hillary não é a presidente dos meus sonhos, eu queria o Bernie Sanders" que ajudou a eleger o Bebê Alaranjado quatro anos atrás. Em 2016, a mídia americana deu uma atenção enorme ao fato da sra. Clinton ter usado sua conta de e-mail pessoal para mandar mensagens relativas à sua função como Secretária de Estado - algo errado, sem dúvida, mas que não chega ao calcanhar da montanha de escândalos que Trump já acumulava. GG acusa a imprensa dos EUA do terrível pecado de querer que Trump seja derrotado e Biden eleito. A minha opinião é bem outra. Biden não é imaculado, assim como ninguém é, mas Trump é alguns bilhões de vezes pior. Mais quatro anos de Trump serão um ferimento mortal à democracia no mundo inteiro. Mas isso incomoda menos o Verdevaldo do que uma edição em seu texto.

sexta-feira, 30 de outubro de 2020

CAUTELOSAMENTE OTIMISTA

Se os Estados Unidos fossem uma democracia convencional, as eleições presidenciais do próximo dia 13 já seriam favas contadas. Não há hipótese de Donald Trump superar, nos próximos quatro dias, o abismo de 12 pontos que o separa de Joe Biden, líder em todas as pesquisas nacionais. Mas os EUA pagam o ônus de serem a mais antiga democracia em funcionamento, mantendo em sua constituição um arcaísmo feito o Colégio Eleitoral. O candidato democrata à presidência venceu seis das últimas sete eleições, mas os republicanos levaram a Casa Branca três vezes. Em 2016, o Bebê Alaranjado levou por uma margem mínima estados como o Michigan ou a Pensilvânia, desacreditando as pesquisas que davam a vitória a Hillary Clinton. Isto fez com que muita gente boa ainda duvide da esperada consagração de Biden nesta terça, mas será necessária uma improvável combinação de fatores para que ele perca. Não impossível, veja bem: o site FiveThirtyEight ainda dá 11% de chance de vitória a Trump. Sõ que para isso ele vai precisar que alguma grande confusão aconteça em um estado-pêndulo, e também de uma forcinha da Suprema Corte. Tudo isso me deixa cautelosamente otimista. A derrota de Trump terá um efeito dominó, enfraquecendo não só o Biroliro como a própria narrativa de que a extrema-direita é imbatível. Está na hora de acreditarmos que não é.

quinta-feira, 29 de outubro de 2020

LA VIA CRUCIS EN ROSE

Tomei guaraná Jesus uma única vez, numa época em que ele era vendido meio como piada por uma loja metida a besta em São Paulo. Hoje este patrimônio cultural do Maranhão está nas manchetes, depois do Bozo, em visita ao estado, dizer que viraria "boiola feito todo maranhense" se tomasse o refri. Esse gracejo não é digno da quinta série ou do tiozão do churrasco, provando que temos um desgoverno que sequer sabe fazer piadas ruins. Mas a bicharada deveria adotar o guaraná Jesus como drink oficial do verão e criar versões de gim tônica e negroni com ele. Vamos por Jesus na boca, vamos por Jesus pra dentro. Je vois la via crucis en rose. Só Jesus salva.

NHONHO

Sergio Moro e Paulo Guedes entraram para o desgoverno Edaír com a aura de superministros. O primeiro já rodou e o segundo vive sendo desautorizado. Finalmente percebemos que os verdadeiros superministros são os do núcleo ideológico: Damares, Ernesto, Salles (Weintraub também fazia parte desse grupo, mas teve que ser sacrificado para o STF pegar leve com o Zero-Um). Todos eles comungam das mesmas ideias da familícia Biroliro e, portanto, sentem-se blindados. É por isto que o ministro do Mau Ambiente anda distribuindo insultos como "Maria Fofoca" e "Nhonho", que agradam aos bolsomijons e podem ajudá-lo a se eleger para algum cargo lá na frente. Mas o ataque a Rodrigo Maia pegou especialmente mal, porque o presidente da Câmara dos Deputados tem o poder de atrapalhar bastante a vida do governo. A grita foi tão grande que Salles, com a coragem característica de um birolista, agora diz que sua conta no Twitter foi hackeada. Quem ele pensa que engana? Não contava com a nossa astúcia?

quarta-feira, 28 de outubro de 2020

QUE SUS-TO

O general Pazuello não sabia o que era o SUS quando assumiu o ministério da Saúde. Incomodado com isto, Biroliro resolveu cortar o mal pela raiz: acabar com o SUS. Para quem não leva a sério a pandemia e ainda defende a cloroquina, não chega a ser uma supresa. Mas o Bozo é burro. Não viu que o Chile votou por trocar de Constituição porque a atual, entre outros defeitos, não prevê um sistema universal de saúde. Tampouco percebeu que uma das razões que vão derrubar os republicanos nos EUA, inclusive o Bebê Alaranjado, é a oposição do partido ao Obamacare. Privatizar a saúde é suicídio político em qualquer país. No Brasil, onde a imensa maioria da população depende do SUS para tudo, é um hara-kiri. Como sempre acontece quando as redes sociais estrilam, Mijair voltou atrás e disse que não foi bem assim. Claro que foi. Ele e sua milícia vão continuar a foder com o Brasil. De preferência, na calada da noite, como foi dessa vez.

ESSES GERMÂNICOS SÃO UNS NEURÓTICOS

Aqui em casa somos fascinados pelo Império Romano. Por isto, quando saiu uma série alemã na Netflix falando da relação entre Roma e os povos germânicos do ponto de vista desses últimos, nós paramos todas as 37 outras que estamos vendo ao mesmo tempo e focamos nela. Só que "Bárbaros" deixa muito a desejar. O roteiro parte de um clichê melodramático que deve ser mais velho do que o Coliseu: dois garotos que amam a mesma menina se tornam rivais quando adultos. Aqui, um deles é um príncipe da tribo dos queruscos, entregue como refém a um general romano. Quando ele reencontra seu povo de origem, sua lealdade balança. Aliás, que boa ideia, mandar justamente para a fronteira germânica um cara que nasceu do outro lado, como se o Império Romano não tivesse zilhões de outras. "Bãrbaros"  conta com poucas locações - basicamente, uma aldeia que lembra a do Asterix e um acampamento romano que parece Babaorum. Quando finalmente eclode a histórica batalha da Floresta de Teutoburgo, os bárbaros usam maquiagens um pouco contemporâneas demais, obviamente criadas por um diretor de arte. Tirando o fato dos romanos falarem latim, não tenho o que elogiar.

terça-feira, 27 de outubro de 2020

FOR MAKE BENEFIT GLORIOUS NATION

Adoro o Borat, mas tem uma coisa nele que sempre me incomodou: a tiração de sarro com o Cazaquistão. Sacha Baron Cohen se aproveitou da nossa ignorãncia generalizada acerca das antigas repúblicas soviéticas da Ásia Central para criar um personagem que não se parece em nada com um cazaque. Os de verdade são muçulmanos e têm traços orientais. O país, cheio de desertos e montanhas, tampouco evoca a aldeia imunda onde mora o Borat - a locação, aliás, fica na Romênia. O governo do Cazaquistão ficou furioso com o primeiro filme e tentou processar Baron Cohen, mas aí aconteceu uma coisa curiosa: o turismo cresceu, pois nunca se falou tanto de lá no Ocidente. Agora, quando a "fita de cinema subsequente" está causando celeuma, os cazaques aproveitaram a onda para lançar uma nova campanha incentivando viagens para lá. E se apossaram de um dos bordões do Borat, "very nice", para designarem a si mesmos. Uma grande jogada de marketing e um sinal de grandeza de caráter. Wawaweewa!

segunda-feira, 26 de outubro de 2020

CHECHÊNIA À MOSTRA

Sou rato da Mostra de São Paulo desde 1983, mas duvido que eu veja muitos filmes nesta 44a. edição. A razão é simples: detesto cinema no computador. Não consigo espelhar na TV, não encontro posição confortável e me distraio com qualquer coisinha. Além do mais, a seleção deste ano não me empolgou muito. Um excesso de títulos obscuros, alguns longuíssimos e de temáticas deprimentes. Fora que eu perdi o que eu mais queria ver, o mexicano "Novo Mundo". O filme de abertura esteve disponível por apenas 24 horas e só mil ingressos seriam vendidos. Quando dei por mim, 40 minutos depois da abertura da bilheteria, já estava esgotado. Pensei em boicotar o resto do evento, mas me senti culpado. Hoje finalmente aluguei "Welcome to Chechnya", de que eu já tinha falado aqui no blog, do diretor americano David France. O documentário sobre a perseguição a gays e lésbicas na república russa da Chechênia alterna momentos onde pouco acontece com outros de tortura, estupro e assassinato que são de sair gritando pela rua. O trabalho dos voluntários que retiram pessoas LGBT da Chechênia é admirável, e não sei como eles vão poder voltar para lá depois de se exporem no filme. Já as vítimas que eles conseguem levar para Moscou tem suas identidades protegidas por deep fakes. seus verdadeiros rostos são substituídos pelas caras de ativistas. Quando um deles finalmente vem a público e dá uma entrevista coletiva denunciando o governo de Ramzan Kadyrov, um efeito descortina sua face real, num momento emocionante. Infelizmente, mesmo com tantas provas, o regime ditatorial checheno continua firme, e teme-se que a violência estatal anti-gay se espalhe por toda a Rússia. Ela também pode chegar por aqui. Não falta gente nesse desgoverno que acha que viado tem que morrer.

A MORTE E A MORTE DE AUGUSTO PINOCHET

Faleceu ontem em Santiago do Chile, por volta das 20h (hora local), o general Augusto José Ramón Pinochet Ugarte. Foi a segunda morte do ex-ditador: ele já havia falecido uma vez, a 10 de dezembro de  2006, mas seu aroma pútrido de morto-vivo ainda empesteava as instituições chilenas. Agora seu cadáver finalmente será sepultado, assim como seu legado autoritário. O povo chileno compareceu em massa às urnas (80%, mais do que em qualquer eleição presidencial) e deu uma vitória acachapante à proposta de uma nova Constituição. Além disso, a Assembleia Constituinte será formada por pessoas eleitas especificamente para formular a nova carta, e 50% serão mulheres. É a segunda boa notícia produzida pela América Latina em uma semana (a outra foi a eleição na Bolívia), e mais um sinal de que a maré da boçalidade finalmente está virando. Semana que vem teremos, provavelmente, a derrota de Trump nos EUA. Daqui a um mês, eleições municipais no Brasil, onde os candidatos apoiados por Biroliro nas capitais derretem feito picolés ao sol...

domingo, 25 de outubro de 2020

SOFIA E SOPAI

A protagonista de "On The Rocks" é uma mulher insegura, cujas fragilidades são exacerbadas pela segurança extrema de seu pai. Impossível não achar que a personagem não tem pontos em comum com a diretora Sofia Coppola, até porque a relação entre pai e filha é uma constante em sua filmografia. Seu sétimo longa-metragem acaba de estrear no Apple TV + e é quase um Woody Allen, de tão gostosinho de se ver. Lá estão uma Nova York glamurosa onde ninguém tem boletos atrasados, portanto dá para perder tempo com bobagem E a bobagem de Laura (Rashida Jones) é achar que o marido, que não para em casa, está tendo um caso com uma colega do trabalho. Ao invés de choramingar com as amigas ou com a mãe, como seria de se esperar, ela encontra um ombro amigo no pai - um marchand que conhece absolutamente todo mundo e nunca se furta a jogar charme para cima de porteiros, garçons e guardas de trânsito. Bill Murray está perfeito no papel, e claro que a gente desconfia que Francis F. Coppola também seja esse homme du monde, à vontade em qualquer situação. "On The Rocks" (a expressão em inglês para um casamento que vai mal das pernas) não entra muito fundo em qualquer relacionamento, mas para um sábado em casa é perfeito.

sábado, 24 de outubro de 2020

ERROU RUDY

O funeral da carreira política de Rudy Giuliani estreou ontem na Amazon Prime Video. O ex-prefeito de Nova York e atual advogado de Donald Trump enterra a si mesmo, numa sequëncia que precisa ser vista para ser acreditada. Aliás, o mistério de Borat continua: 14 anos depois do primeiro filme, Sacha Baron Cohen ainda consegue enganar suas vítimas, mesmo com um monte de câmeras em volta. Giuliani caiu feito um patinho, e vai ter dificuldade em arranjar clientes depois que o Bebê Laranja for expulso da Casa Branca em janeiro. Mas a ambição do quarto melhor repórter da gloriosa república do Cazaquistão é maior do que isso: com "Borat: Fita de Cinema Seguinte", Cohen quer nada menos do que influenciar as eleições de novembro. Duvido que ele consiga, porque muitos americanos já votaram e agora restam só uns poucos indecisos. Isso não tira a contundência da "fita", que dessa vez ainda se dá ao luxo de ter um arco dramático, coisa que não havia no primeiro longa. Cortesia de Tutar (corruptela de "daughter"?), a filha adolescente que Borat quer presentear a algum político dos EUA para que ela more numa jaula dourada feito a Melania. A búlgara Maria Bakalova está tão fenomenal no papel que já tem chance ao Oscar de atriz coadjuvante. Enfim, o mundo piorou muito desde 2006, com o desastroso governo Bush dando lugar a uma onda de extrema-direita que varre quase o mundo inteiro. Naquela época, o primeiro filme do Borat foi um sinal de que os tempos estavam prestes a mudar. Tomara que este novo, tão sarcástico quanto, signifique a mesma coisa.

sexta-feira, 23 de outubro de 2020

A IRA DO IRÃ

Estive em Teerã em 1978 e achei um dos lugares mais feios do mundo. Talvez eu tenha captado as más vibrações: seis meses depois, o xá Reza Pahlevi foi derrubado pela Revolução Islâmica. Mas agora tenho voltadopara lá todos os dias, graças à série isralelense "Teerã" da Apple TV +. É mais uma obra do criador de "Fauda", que eu criminosamente ainda não vi. Porque eu adoro esse tipo de trama que mistura geopolítica e espionagem. Devorei as três primeiras temporadas de "Homeland" e quase me acabei com a sueca "Califado". "Teerã" é da mesma estirpe. A protagonista é uma agente do Mossad de origem persa, infiltrada na capital do Irã para desligar o sistema de defesa aérea do país e possibilitar que Israel bombardeie uma usina atômica. Claro que o plano inicial não dá muito certo, e a moça acaba vendendo bala numa rave clandestina (!). Ainda bem que a plataforma só libera um episódio por semana. Assim dá tempo das minhas unhas roídas de nervoso crescerem um pouco entre um e outro.

O REI VIVE

Como muitos meninos da minha geração, eu torcia para o Santos só por causa do Pelé. Assisti pela TV o jogo em que ele marcou seu milésimo gol, em 1969, e no ano seguinte vi todos os jogos da Copa do México. Em 1990, conheci Pelé pessoalmente. Ele estrelou um comercial escrito por mim, para uma promoção da Elma Chips. Fiquei pasmo com a dificuldade dele em decorar duas linhas de texto. Àquela altura, o cara já tinha feito milhares de reclames e atuado em filmes e novelas - e ainda era um tremendo canastrão. Hoje o rei do futebol completa 80 anos de idade com seu trono intocado. Depois de alguns pretendentes ameaçadores nas últimas décadas, voltou o consenso de que ele foi, sim, o melhor de todos os tempos. A mesma unanimidade não existe quanto a seu caráter. Pelé falou muita besteira ao longo da vida, mas o que realmente pesa contra ele foi sua recusa em reconhecer uma filha que teve fora do casamento. Perfeito em campo, ele se mostrou falho na vida - como qualquer mortal, aliás. Mas foi umas das maiores estrelas negras do século 20, e seu nome até hoje é sinônimo de excelência. O rei ainda vive, e merece ser reverenciado.

quinta-feira, 22 de outubro de 2020

A VACINA E AS VACAS

Pela enésima vez, Edaír cedeu aos mugidos de seu gado. Acusado de traidor, disse que quem traía era quem se comprometia a comprar a "vacina chinesa do Doria", como se ele não soubesse (e tivesse aprovado) que Pazuello faria isto. O recuo funcionou na minionsfera - mas, e no mundo real? Biroliro está sendo xingado de desumano, incompetente e egoísta, até por jornalistas que não costumam se manifestar. Se mantiver a postura tacanha quando chegar a Coronavac e ela se mostrar eficaz, corre o risco de espelhar seu ídolo. O Bebê Laranja passou quatro anos tuitando só para seus seguidores e hostilizando qualquer um que enxergasse como ameaça. Resultado: a eleição do dia 3 de novembro promete ser uma derrota histórica para os republicanos. Pois é, a tática de manter a base energizada funciona só até certo ponto. Chega uma hora em que é preciso governar para todos. Trump nem tentou, e duvido muito que o Pandemito consiga.

A MULHER ESQUECÍVEL

A "Rebecca" de Hitchcock não era um filme de época. A trama se passava em 1940, o ano em que o filme foi lançado. Não entendo por que insistem em refazê-lo do mesmo jeito, só trocando o preto-e-branco original pelas cores. Houve uma minissérie da TV britânica em 1997, hoje lindamente esquecida. E agora há a versão da Netflix, com a protagonista anônima - só a conhecemos como Mrs. De Winter - um pouco mais pró-ativa, ao gosto dos dias que correm. Bobagem: ela precisa ser uma mosca morta para a história fazer sentido. Lily James tem até sal demais para o papel, e de pouco adiantam os esforços em mostrá-la mal-ajambrada. O bonitão Armie Hammer tampouco é Laurence Olivier, e minha adorada Kristen Scott Thomas faz o que pode como a governanta má, reduzida a pouco mais do que uma caricatura. Mas os cenários são deslumbrantes, e o resultado pode agradar à turma que está mergulhando em "Emly in Paris" para fugir da realidade. Eu preferia uma "Rebecca" contemporânea, talvez com um casal gay. Dessa ninguém ia esquecer.

quarta-feira, 21 de outubro de 2020

O PAPA É POC

Quer dizer, não é, mas é S. É simpatizante, como na antiga sigla GLS. Não que eu tivesse muitas dúvidas, mas Sua Santidade deixou claríssimo seu apoio aos casais do mesmo sexo com as declarações que deu ao documentário "Francisco". A atitude do papa é um chute no pau da barraca, e ele deve atrair para si ainda mais ódio da ala tradicionalista do Vaticano e dos blogueiros "cristãos". Só que essa turma já estava perdida mesmo. O verdadeiro alvo do Bergoglio são ex-católicos como eu, que se afastaram da Igreja por causa do machismo e da homofobia explícitas. Isto quer dizer então que vou voltar a ir à missa? Só quando ela puder ser celebrada por uma mulher. 

DEU GATILHO

Adorei "La Casa de las Flores", a sátira às novelas mexicanas que teve três temporadas na Netflix. A série passou meio batida aqui no Brasil, mas foi um êxito tremendo nos países de língua espanhola. Tanto que o showrunner Manolo Caro está em vias de se tornar um Ryan Murphy latino, pois já tem um produto novo na plataforma. Dessa vez, sem um pingo de humor: "Alguém Tem que Morrer" é uma minissérie de apenas três episódios que conta, com a mão mais pesada possível, uma história de viadagem, hipocrisia e repressão na Espanha dos anos 1950. Na ditadura franquista, bastava ser gay para ir em cana, e o roteiro explora essa barbárie sem a menor cerimônia. O protagonista é um rapaz de classe alta que volta a Madri depois de uma temporada no México. O que ele não sabe é que sua família lhe arranjou uma noiva. O que eles não sabem é que ele trouxe um bailarino mexicano na bagagem, por quem está perdidamente apaixonado. O elenco reúne astros hispânicos como a diva almodovariana Carmen Maura, o guapo Carlos Cuevas de "Merlí" e a Paulina de la Mora de "La Casa de las Flores", Cecilia Suárez. Só ela está realmente bem, porque é a ´punica que ganhou um personagem minimamente complexo. Os demais são clichês ambulantes, e as situações forçadas são dignas daquelas pecinhas que encerram as sessões dos circos do interior. Quem estiver a fim de um dramalhão bem produzido vai se regalar. Para mim, essa série obcecada por rifles deu gatilho.

terça-feira, 20 de outubro de 2020

GOOD NEWS, EVERYONE!

A partir de hoje, eu pago meia entrada nos cinemas, nos teatros e nos museus. Posso estacionar nas melhores vagas do shopping, bem perto do elevador. Ônibus e metrô são de graça, inclusive em viagens interestaduais. Estou tentando dar uma de Professor Farnsworth da série "Futurama", que ficou puto quando um raio o rejuvenesceu e ele perdeu todas as vantagens da terceira idade. Porque fazer 60 anos é foda. Tudo bem que é apenas um número e eu aparento 57, mas a sociedade se preparou para me entregar um crachá de velho nesse dia. Agora eu sou oficialmente um senior citizen, e o preço do meu plano de saúde ficou ainda mais caro. O pior é a sensação de que, sendo bem otimista, dois terços da minha vida já se foram. Por outro lado, é sensacional chegar aos 60 e perceber que eu cumpri muitas das missões a que me propus. Também é formidável ter tantas outras missões ainda a completar, pois isso me dá gana para pular da cama e correr atrás. O tempo está passando cada vez mais rápido, mas pelo menos agora o metrô é grátis.

segunda-feira, 19 de outubro de 2020

MAS E A DEMOCRACIA

Há várias lições a aprender com as eleições da Bolívia. A primeira delas é que não há nenhuma onda de direita varrendo a América do Sul. Sim, partidos de direita chegaram à presidência na Argentina, no Chile, no Brasil e no Uruguai, mas em anos diferentes e com consequências mais diferentes ainda. O caso brasileiro parece ter sido um ponto de inflexão. Elegemos um energúmeno tão despreparado que assustamos a vizinhança e perdemos qualquer influência que poderíamos ter. A extrema-direita, para variar, mostrou-se incompetente no poder também na Bolívia. Não pacificou o país nem à força, administrou mal a pandemia e perdeu tanta popularidade que a presidente interina Jeanine Áñez precisou tirar o time de campo. Luís Fernando Camacho, o candidato mais reaça de todos, teve desempenho pífio, e o máximo que os moderados conseguiram propor foi Carlos Mesa, que foi presidente antes de Evo Morales. O resultado está aí: o Movimento ao Socialismo (MAS), o partido de Evo, venceu no primeiro turno. E então chegamos à segunda lição. A estratégia dos caras foi brilhante. Ao invés de insistir num líder indígena mais radical, o MAS deu a cabeça de chapa ao tecnocrata Luis Arce, que foi ministro da Economia, tem educação primorosa e carisma zero. Não ofusca o próprio Evo, que sem dúvida quer voltar daqui a alguns anos. Mas conseguirá? O ex-mandatário divide mais seus conterrâneos do que Lula aos brasileiros, e deu sobejas mostras de que pretendia se eternizar na presidência. Se Arce não for uma Dilma (i.e., inepto), o MAS terá um novo líder, como aconteceu no Equador. A terceira lição é a de que a democracia foi mais forte do que os militares e os golpistas. Biroliro deve estar se borrando neste momento.

QUE MISTÉRIO TEM CARICE?

Carice na Houten não é, nem de longe, um nome conhecido no Brasil. Mas muita gente já viu o trabalho dessa holandesa: ela foi a Melisandre de "Game of Thrones". A sacerdotisa do deus vermelho era uma mulher fria e controlada, sem grandes arroubos, e não deu a Carice a chance de mostrar seu enorme talento. Mas a atriz dá um show em "Instinto", o filme que representou a Holanda no último Oscar e agora está em pré-estreia em alguns dos cinemas reabertos. Sua personagem é mal construída: uma psicóloga experiente que, mesmo assim, se deixa manipular pelo estuprador de quem ela está cuidando em uma prisão (Marwan Kenzari, o Jafar de "Aladim"). A única explicação possível é o tesão em estado bruto, o instinto do título (e o filme só não levou pedrada porque foi escrito e dirigido por mulheres). Mas Carice perde as estribeiras pouco a pouco, uma por uma, até se desesperar pelo buraco em que caiu sozinha. Depois de um começo meio devagar, "Instinto" fica eletrizante. Não o bastante para ser um grande filme, mas sua grande atriz vale o preço do ingresso (que ainda é promocional).

domingo, 18 de outubro de 2020

JACINDA SUA LINDA

Jacinda Ardern ficou conhecida no mundo inteiro no começo de 2019, por sua resposta exemplar ao atentado que matou dezenas de muçulmanos na cidade de Christchurch. A premiê da Nova Zelândia vestiu véu para visitar os parentes das vítimas, recusou-se a dizer o nome do terrorista para não lhe dar visibilidade e ainda promoveu uma bem-sucedida campanha de recolhimento de armas automáticas. Este ano, Jacinda tornou-se uma superstar. É apenas a melhor líder mundial no combate ao coronavírus, mantendo seu país quase livre da doença. Ontem ela foi reeleita num "landsliede", um deslizamento de terra, que é como a imprensa anglo-saxã chama as vitórias eleitorais esmagadoras. A Nova Zelândia é tão evoluída que o partido rival da Jacinda também é liderado por uma mulher. Que um pouco dessa evolução se espalhe de lá pelo resto da planeta.

sábado, 17 de outubro de 2020

O ANO QUE RECOMEÇOU

1968 é chamado no Brasil de "o ano que não terminou", por causa do livro do mesmo nome lançado em 1988 por Zuenir Ventura. A tese do jornalista é que os acontecimentos daquele ano atribulado - manifestações estudantis em Paris, protestos nos EUA contra a Guerra do Vietnã, invasão da Tchecoslováquia por tropas soviéticas, recrudescimento da ditadura militar no Brasil - ainda repercutiam, 20 anos depois. Hoje 1968 está mais de meio século distante de nós, mas tenho a sensação de que começou outra vez. Porque voltamos a discutir assuntos que estavam em voga naquela época, como a igualdade da mulher e o autoritarismo do Estado. É incrível como uma série como "Mrs. America", que retrata a luta das feministas nas décadas de 60 e 70, soa atual. Também é o caso de "Os 7 de Chicago", o primeiro filme peso-pesado da próxima safra do Oscar. O segundo longa dirigido pelo roteirista Aaron Sorkin é um tenso drama de tribunal, condensando em duas horas o longuíssimo (mais de seis meses) julgamento de sete ativistas presos durante os protestos que tomaram Chicago durante a convenção do partido Democrata em 1968. Os sete, que originalmente eram oito, nem formavam um grupo homogêneo, e tinham estilos e objetivos muito diferentes. Mas foram tratados como terroristas pelo sistema judiciário, e foi ótimo ver o longa sem saber o veredito. O elenco quase todo masculino pode dominar a categoria de ator coadjuvante, com incríveis atuações de Sacha Baron Cohen como o tresloucado Abbie Hoffman e de Frank Langella como um juiz escroto. Os diálogos são tão teatrais e eletrizantes que suspeito que Sorkin tenha dado um upgrade na realidade, mas tá valendo. "Os 7 de Chicago é um filmaço, e também o registro de um conflito que voltou à tona.

AFUNDA ROBINHO

Às vezes, muito de vez em quando, eu acho que o Brasil talvez tenha jeito. Hoje é um desses dias. A reação de muitos internautas e de alguns patrocinadores levou o Santos a cancelar o contrato recém-firmado com Robinho, condenado em primeira instância na Itália pela participação no estupro coletivo de uma mulher alcoolizada. De nada adiantou subirem a hashtag LevantaRobinho: ela foi logo sequestrada pelos críticos ao jogador. De fato, os áudios das ligações gravadas pela polícia italiana não deixam margem para a menor dúvida. É chocante constatar que Robinho pensa que enfiar o pau na boca da vítima não é transar. Pior ainda é ele se dizer perseguido pela Globo e dedicar seu próximo gol ao Biroliro. Só confirma que machismo, cultura de estupro e birolismo são tudo uma coisa só. De resto, duvido que ele marque esse próximo gol, porque não vai entrar em campo tão cedo.

sexta-feira, 16 de outubro de 2020

A TRAVESTEEN

Queira ter gostado mais de "Alice Júnior", mas não consegui. O longa de estreia de Gil Baroni é editado como se fosse o vídeo de um influenciador digital, cheio de efeitinhos e gracinhas. Ou seja: não foi feito para a galera da minha idade. Mas a história da jovem trans que se muda de Recife para o sul do Brasil (estado não especificado) e cai num colégio ultraconservador é simpática, e a protagonista Anna Celestino Mota tem carisma. Por outro lado, o roteiro é cheio de incongruências - como assim, o colégio não sabia que sua nova aluna era trans? - e o resto do elenco está todo alguns tons acima, dando um clima farsesco a um drama bastante real. O filme ganhou prêmios em festivais, está em cartaz em alguns cinemas e acaba de chegar à Netflix. Vale a pena pelo final surpreendente, bem cabeça aberta, e por tratar com leveza de um tema que costuma ser trágico.

quinta-feira, 15 de outubro de 2020

QUEREM DESCRIMINALIZAR A HOMOFOBIA


Em julho do ano passado, quando o STF equiparou a homofobia ao racismo, o então ministro Celso de Mello deixou bem claro: a decisão não interfere com a liberdade religiosa. Isto quer dizer que nenhuma igreja será obrigada a casar pessoas do mesmo sexo e que padres e pastores podem continuar pregando contra quem se afastar da heteronormatividade. Um ano e pouco depois, com Celso já aposentado, a AGU resolveu pedir "esclarecimentos" ao Supremo. Quer saber se a criminalização da homofobia não interfere mesmo-mesmo-mesmo na tal da liberdade religiosa. “A proteção dos cidadãos identificados com o grupo LGBTI+ não pode criminalizar a divulgação – seja em meios acadêmicos, midiáticos ou profissionais – de toda e qualquer ponderação acerca dos modos de exercício da sexualidade”, diz o recurso. Ou seja: psicólogos "cristãos" poderiam continuar a dizer que o "homossexualismo" é uma doença curável, e qualquer "ponderação", vulgo insulto, estaria protegida. No limite, gays poderiam ser barrados em lojas, escolas, empregos e restaurantes, desde que o proprietário alegasse razões religiosas. Ou seja: acabou-se a criminalização da homofobia. O recurso foi encaminhado a Celso de Mello, quando já se sabia que seu provável sucessor Kássio Marques talvez não seja tão esclarecido assim. Se cair nas mãos dele, vamos gritar por nossos direitos e apontar os podres desse desgoverno. Gay pode gostar de levar na bunda, mas pelo menos não enfia dinheiro no cu.

A CORRUPÇÃO É UMA MERDA

A cada dia que passa, o Brasil de Biroliro se afunda mais no esgoto. Literalmente. O caso do senador Chico Rodrigues  (DEM-RR), vice-líder do governo no Senado, é de uma repugnância inédita mesmo para os baixíssimos padrões brasileiros. Já tínhamos visto dinheiro na cueca; "entre as nádegas", como a imprensa diz para não chocar o leitor, só na história do Papillon. A internet está se esbaldando em cima dessa cagada homérica, e o gado tenta mudar de assunto subindo o trending topic #Hilary (com um L só, porque eles não têm o hábito da leitura). Já o Bozo partiu pra ignorância: diz que é tudo fake news e que o cagão nunca fez parte do governo (mesmo tendo vídeo circulando por aí em que ele diz que vive uma "união estável" com o Chicocô). Portanto, parem de ligar o vice-líder do governo ao governo! E lembrem-se: agora há mais uma razão para usarmos máscaras.

quarta-feira, 14 de outubro de 2020

#METOOSA

Outro dia, outra treta envolvendo a história e o politicamente correto. A de hoje envolve a estátua "Medusa com a Cabeça de Perseu", do argentino Luciano Garbati, que ficará por alguns meses em frente ao tribunal de Nova York onde Harvey Weinstein foi julgado. A obra foi saudada como a cristalização do espírito da campanha #MeToo e, logo em seguida, criticada por ser da autoria de um homem. Acontece que Garbati a esculpiu em 2008, e sua intenção era apenas inverter a narrativa da famosa escultura renascentista de Benvenuto Cellini. Mas qualquer obra ganha novos significados através dos tempos, e também quando é inserida num novo contexto - foi o que aconteceu com aquela da menininha, também em Nova York, que no original jamais estaria peitando um touro. Na "Medusa", há um detalhe delicioso: a cabeça que a górgona segura é a do próprio Garbati. Disso as feministas não reclamam.

TÃO LONGE, TÃO CLOSE

Pronto. Começou de novo. Glenn Close está com um filme novo na praça e, para variar, cotadíssima para o Oscar (dessa vez, de atriz coadjuvante). A Netflix divulgou hoje o trailer de "Hillbilly Elegy" (eu me recuso a usar o cafonérrimo título brsileiro, "Era Uma Vez um Sonho"). Nos sites de cinema, especulava-se que o longa só sairia no começo de 2021, às vésperas das indicações. Mas sai em novembro, e as redes sociais estão em polvorosa. Pelo menos, eu estou. Será que agora vai Glenn faz uma véia escrota, que usa calça comprida e fuma sem parar. O papel está a dois dias de caminhada de sua última tentativa com a Academia, "A Esposa", quando ela perdeu para Olivia Colman. A ironia é que Olivia novamente está no páreo, competindo na mesma categoria por "The Father". Vem mais uma desfeita por a[i? Outra que aparece feiosa e sem glamour no trailer acima é Amy Adams, que já acumula seis derrotas no Oscar (Glenn tem sete). A concorrência para atriz principal está mais acirrada, mas é óbvio que ela tem chances. Glenn tem ainda mais, e tomara que desencrue. Chegamos ao ponto em que o Oscar é que precisa ganhar Glenn Close, e não o contrário.

terça-feira, 13 de outubro de 2020

CLEÓPATRA MARAVILHA

No começo da década de 90, ao mesmo tempo em que se cunhou o termo "politicamente correto", também surgiu nas universidades americanas um movimento que pretendia resgatar a negritude dos antigos egípcios. A onda pegou a ponto de Michael Jackson fazer o (ótimo) clipe de "Remember the Time" com Eddie Murphy como um faraó e Iman como sua mulher. Era uma reação ao fato de Hollywood ter, historicamente, escalado atores brancos e até louros para personagens como Ramsés, Nefertiti ou mesmo Jesus Cristo. Mas a ideia não tem respaldo na realidade. Houve, sim, dinastias negras vindas do que hoje é o Sudão, mas os antigos egípcios eram parecidos com os atuais - pele e cabelos morenos, típicos do Oriente Médio. Esta semana rolou uma treta nas redes por causa da escolha da isralense Gal Gadot pela diretora Patty Jenkins - as duas fizeram juntas "Mulher Maravilha" - para o papel de Cleópatra. Ninguém ligou para a notícia de que a história da mais célebre rainha da Antiguidade finalmente será contada de um ponto de vista feminino. A lacrosfera preferiu reclamar de Gadot não ser negra. Melhor seria se reclamassem que não é grega. Cleópatra era 100% helênica, da dinastia ptolemaica, descendente de generais de Alexandre, o Grande. Temos bustos e moedas que mostram sua real aparência física. Ela também era uma mulher culta, que falava várias línguas. E, como era costume em sua família, aderia à religião e aos costumes egípcios - tanto que se casou com seu próprio irmão. Mas o escândalo para por aí. Cleópatra foi vítima da fábrica de fake news do imperador romano Augusto, que derrotou a ela e a Marco Antonio, e depois pintou ambos com o o suprassumo da depravação. Vamos ver se o filme trata disso.

ATAQUE UNIVERSAL

Em 2007, reagindo a uma matéria da Folha, bispos e fiéis da Igreja Universal encheram de processos a jornalista Elvira Lobato, da Folha. Ela e seus advogados precisaram se deslocar por rincões remotos do país até o STF acabar com a farra e julgar tudo improcedente. Mesmo com esse fracasso anterior, a IURD está usando a mesma tática contra o escritor J. P. Cuenca. que parafraseou Voltaire (ou Jean Meslier - a autoria da citação original é incerta) e tuitou que o Brasil "só será livre quando o último Bolsonaro for enforcado nas tripas do último bispo da Universal". Cuenca foi imediatamente desligado do site brasileiro da Deutsche Welle, onde assinava uma coluna. Agora é alvo de uma violenta tentativa de intimidação, semelhante à que vem sofrendo a jogadora de vôlei Carol Solberg. A ironia é que a extrema-direita abusa das postagens de teor violento nas redes sociais - quando não parte para ameaças diretas e até violência física. Vamos ver como esses dois casos se desenrolam. Seus desfechos indicarão até que ponto estamos atolados no esgoto.

segunda-feira, 12 de outubro de 2020

EU ME CHAMO ROSA

Era assim que minha falecida avó chamava a adaptação para o cinema de "O Nome da Rosa", que ela viu em 1987 e não entendeu nada. E isto porque o roteiro tomava muitas liberdades com o livro de Umberto Eco, acrescentando mais ação e jogando a discussão intelectual para terceiro plano. Até a justificativa do título - uma homenagem ao poder das palavras - virava uma referência à menina que mexe com o noviço Adso, "de quem eu nunca soube o nome" (por isto vovó se confundiu). Mais de 30 anos depois, eis que surge uma minissérie em oito episódios, disponível na plataforma Starzplay. É fiel ao romance? Nããão. Pelo menos a trama central segue a mesma, mas há acréscimos desnecessários como uma moça guerreira - item obrigatório em todas as histórias medievais desde o sucesso da Arya de "Game of Thrones". Não entendo isso. Por que insistir em vulgarizar um livro que vendeu 50 MILHÕES de exemplares?

FOI DE PROPÓSITO?

Das duas, uma. Ou o ministro Marco Aurélio de Mello é ingênuo feito um peixinho dourado, ou então ele fez de propósito. Como é difícil acreditar que um juiz do STF não faça a menor ideia de que o injustiçado que ele está mandando soltar é um chefão do narcotráfico de altíssima periculosidade, prefiro a segunda hipótese. Marco Aurélio aproveitou a primeira oportunidade para expor o absurdo que é esse jabuti enfiado pelo Congresso no projeto anticrime de Sergio Moro, que garante a libertação de alguém que não tenha sua prisão preventiva revisada depois de 90 dias. A ideia, claro, era proteger os políticos enrolados na Lava-Jato, mas não dá para criar uma lei só para eles. O resultado está aí. André do Rap deve ter mandado uma solene banana para o Brasil enquanto fugia de helicóptero para o Paraguai, como o Marco Aurélio da novela "Vale Tudo". Aliás, que coincidência, não? Dois Marcos Aurélios espertinhos.

domingo, 11 de outubro de 2020

UM VELHO E UMA VELHA

Depois de quase sete meses intermináveis, voltei ao cinema. A justiça poética fez com que o retorno se desse na mesma sala onde assisti ao meu último filme em março, no Belas Artes. E o filme foi exatamente o que eu mais queria ver quando começou a quarentena: "Os Melhores Anos de uma Vida", a terceira parte de "Um Homem e uma Mulher". Quem não viu os anteriores - especialmente o primeiro, um clássico absoluto - não vai se interessar pela história de Jean-Louis Duroc e Anne Gauthier. Ele separado, ela viúva, os dois se apaixonam e vivem um caso tórrido, mesmo com os filhos em volta. Mas ela ainda não está pronta para se casar novamente. Pede seis meses para pensar, e eles acabam se desencontrando. O segundo filme é esquecível, mas este novo é muito bonito. A começar por Anouk Aimée, ainda deslumbrante. Aos 88 anos de idade, ela continua sendo a mulher mais glamurosa do mundo. Já Jean-Louis Trintignant está um caco aos 90, parecendo uma caveira falante. Mas a química entre os dois permanece lá, assim como a trilha sonora de Francis Lai - a mais bela de todos os tempos - devidamente retrabalhada por Calogero. Como eu estou a 10 dias da terceira idade e acabo de completar 30 anos de casado, o filme falou de perto para mim. É uma linda reflexão sobre a passagem do tempo. Também é o antípoda de "Amour", o filme de Michael Heineke que ganhou todos os prêmios e também tinha Trintignant como parte de um casal apaixonado. O amor ali era o da convivência, da cumplicidade inoxidável trazida pelos anos de vida em comum. Já o amor de Lelouch é a paixão avassaladora, o futuro encruado que não aconteceu, o romance ideal porque é impossível. "Os Melhores Anos de uma Vida" não tem muita trama, mas é pleno de sutilezas. Os filhos de Anne e Jean-Louis, agora na terceira idade, são feitos pelos mesmos atores que os encarnaram quando criancinhas no longa de 1966. Nenhum dos dois ficou muito bonito, e a presença deles só ressalta como o casal original era - e ainda é - composto por duas grandes estrelas de cinema. Um velho e uma velha, lindos.

sábado, 10 de outubro de 2020

OS RAPAZES DA RODA

Acaba de sair mais um #DeuNaSemana no canal Põe na Roda com a minha coluna mensal LGBTV. Dessa vez, com um assunto incontornável: "The Boys in the Band". Você ainda não viu? Vão cassar tua carteirinha do vale, hein? Eu apareço aos 6'30". Aproveite, são meus últimos dias de cabelos longos.

sexta-feira, 9 de outubro de 2020

ONDE MOURÃO O PERIGO

Quando acabou a ditadura, o Brasil foi leniente com os militares. Ao contrário do que aconteceu na Argentina, aqui ninguém foi em cana ou sequer julgado. O resultado está aí: a cultura golpista persistiu e hoje temos um vice-presidente que defende um torturador em entrevista para uma TV alemã, protagonizando mais um vexame internacional desse governo, o vigésimo só esta semana. O general Hamilton Mourão parece um sujeito moderado e até simpaticão perto da escrotidão do Biroliro, mas é tão ruim quanto. Foi punido duas vezes durante o governo Dilma por graves indisciplinas e chegou a ser despachado para a reserva, só para ressuscitar na chapa que venceu as eleições de 2018. Não nos deixemos enganar. Um impeachment o conduziria diretamente ao poder, e o regime de exceção tão sonhado por essa corja seria instalado de maneira muito mais sutil do que as canhestras manobras do Bozo. É bom ficar esperto, até porque - dizem - Mourão periga o ser vice de Sérgio Moro em 2022.

WHATEVER GETS YOU THRU THE NIGHT

John Lennon estaria fazendo 80 anos no dia de hoje. Entre as muitas homenagens que o ex-Beatle vem recebendo, uma me chamou a atenção: a entrevista que Elton John deu a Sean Ono Lennon, filho de John e Yoko, num podcast da BBC. Hoje em dia não lembramos direito, mas os dois popstars foram muito amigos na década de 70. Chegaram a compor e gravar juntos, e Elton é o padrinho de Sean. Talvez tenham sido mais do que amigos. Elton confessa que os dois fizeram "naughty things" que não podem ser noticiados. Também fala de um "whirlwind romance", um romance arrebatador, sem entrar em mais detalhes. Não há porque duvidar que eles tenham sido namorados, Aquela época era bem mais liberada e avançada do que a nossa, e não houve maior iconoclasta na história do rock do que John Lennon. Pode ter sido só uma brincadeira, algo que os levou ao fim da noite. Mas só de pensar neles juntos eu já fico mais contente.

quinta-feira, 8 de outubro de 2020

BODAS DE PÉROLA

Hoje nós fazemos 30 anos de casados. Também faz exatas três décadas que nos conhecemos. Pois é, foi tudo no mesmo dia. Ou na mesma noite. Para quem ainda não sabe: no dia 8 de outubro de 1990, eu estava no Ritz da Alameda Franca, um restaurante que existe até hoje aqui em São Paulo. Comecei a trocar olhares com um cara que estava sozinho em outra mesa. Tomado de coragem etílica, fui lá falar com ele. Fomos para seu apartamento e eu nunca mais voltei para a casa da minha mãe, com quem eu ainda morava. Minto: voltei para pegar roupa. Passamos de absolutos desconhecidos para casados, sem a fase do namoro no meio. Eu só me dei conta uns dois meses depois, quando fui buscar minha televisão e outros apetrechos lá na mami. Ele tinha uma filha de 10 anos, que morava no Rio mas vinha visitar a cada 15 dias. E um cachorro, que também veio do Rio e logo me adotou. Pacote completo.

Nesses 30 anos, é claro que passamos por altos e baixos. Fomos ricos, fomos pobres, mudamos de cidade, perdemos pais, perdemos pets, perdemos empregos. Mas nunca tivemos uma crise séria. Jamais estivemos a ponto de nos separar. A essa altura, não concebo mais minha vida sem ele, mesmo brigando toda noite por causa do controle remoto. Eu consegui o maior dos meus objetivos: um amor duradouro, um companheiro de jornada. Não é pouca coisa, não. 

Nós demos uma grande festa em 2005, quando completamos 15 anos juntos. Foi um fim de semana inteiro na fazenda do meu irmão em Petrópolis, com direito a bufê da Locanda della Mimosa, chuva de arroz e festa noturna à beira da piscina. Queríamos fazer algo ainda maior este ano, mas veio a pandemia. Para nós, se Deus quiser, será só mais um episódio que enfrentamos. Ano que vem, tomara..

quarta-feira, 7 de outubro de 2020

KAMALA, MESA E BANHO

Comparado ao forrobodó da semana passada, o debate entre Kamala Harris e Mike Pence quase deu soninho. Dava até para perceber como ambos desviavam das perguntas feitas pela mediadora para recitar textos previamente ensaiados, louvando a si mesmos e atacando o adversário. O vice de Trump também quis imitar o chefe interrompendo a senadora várias vezes, ou se estendendo em respostas por muito além do tempo que dispunha. Tudo isso sem o charme e o veneno do Bebê Laranja, o que significa que Pence só mostrou ser um velho branco sem carisma. Joe Biden também é, mas Kamala é bonitona e sabe fazer amor com a câmera. Só que tudo isso é forma, e o que interessa é conteúdo. Deu pena ver o apagado Pence tentando convencer que o atual governo fez um bom trabalho contendo o coronavírus ou que a Casa Branca realmente se importa com a saúde do povo. Kamala pôs a mesa e deu um banho.

P.S.: entrou uma mosca no debate. Adivinha onde ela foi pousar? Na bosta, claro.

VAMOS FODER COM O GOVERNO

É claro que eu não gosto do Alexandre Frota. O cara me processou em 2016, por causa desta minha coluna no F5. Mas perdeu rude, como também perdeu todos os outros processos que movia naquela época. De lá para cá, o ex-ator pornô aderiu ao Biroliro, foi eleito com Biroliro e rompeu com Biroliro. Não sei exatamente o que se passou nos bastidores, mas o Frotinha quer vingaaançaaa. Quer derrubar a familícia, mostrando provas do que todo mundo sempre soube: Carluxo, Bananinha e uma turminha da pesada comandam o Gabinete do Ódio. Que, aliás, ficou meio sem função, depois que o Edaír se aliou a todos que eles odiavam. Sim, o mecanismo brasileiro já se acomodou ao Bozo, pois viu vantagem em ter um juiz amigão (e mentiroso) no STF. Só que eu ainda acho que o esquema todo pode cair, pois os rolos são muitos e os desafetos, mais ainda. Pode ser um repeteco da queda do Collor: algum magoado põe a boca no trombone, e as cartas vêm abaixo. Moro e Joice já tentaram, em váo. Chegou a vez do Frota?

terça-feira, 6 de outubro de 2020

ESCOLHA SEUS HUMANOS COM CUIDADO

Quem não gosta de cachorro, bom sujeito não é.

LUIZA LACRADORA

Assim como só a sua avó usa a palavra "broto" ou só o seu pai fala que você "puxa fumo", só a extrema-direita é adepta do termo "lacração". As bichas que inventaram a gíria já estão em outra há muito tempo, mas os minions acham que é, aham, lacrador dizer bobagens feito "quem lacra não lucra" (o que nem verdade é). Hoje a Defensoria Pública da União entrou com um processo contra o Magazine Luiza, pedindo 10 milhões de reais como indenização por um suposto "marketing de lacração". Não sou jurista nem aqdvogado, mas duvido que um processo desses vá muito longe. O trainee só para negros do Magalu é uma ação afirmativa, algo reconhecido pela lei. Mas o que o defensor Jovino Bento Junior quer é, aham, lacrar. Quer agradar ao gado birolista e, quem sabe, se candidatar à próxima vaga que abrir no STF. Lacrado mesmo continua o mercado de trabalho para os negros, mas não por muito tempo. Os pretos e os pardos já descobriram que são maioria.

segunda-feira, 5 de outubro de 2020

MEU VINHO, MEU VÍCIO

Não fumo, não jogo e bebo só socialmente. Mas estou viciado no site FiveThirtyEight, comandado pelo estatístico Nate Silver. O cara ficou famoso quando previu com precisão o número de votos que Barack Obama teria no Colégio Eleitoral em 2008, e repetiu a perfomance nas eleições de 2012. Nas de 2016, é verdade, ele derrapou feio, como quase toda a mídia que não cravou a vitória de Trump. Mas Silver é o primeiro a dizer que estatística não é bola de cristal, e hã sempre a possibilidade das coisas sa~irem de outro jeito. O cara se recuperou nas midterm de 2018, e só o gado mais fanatizado não o leva a sério. Este ano, o FiveThrityEight atualiza todos os dias o resultado provável da eleição de 3 de novembro, âs vezes mais de uma vez. E adivinha - Biden neste momento está com 81% de chance de sair vencedor, enquanto o Bebê Laranja tem apenas 18%. Veja bem, não é a porcentagem de eleitores que vai votar em um ou em outro, é a probabilidade de cada um deles ser o vitorioso. Sinto informar aos minions que ainda me leem que o Trump murcha todo dia, pois não sobe nas pesquisas e o tempo está correndo. Mesmo com este cenário tranquilizador, eu não resisto. Não passo duas horas sem checar se o Trump caiu mais um pouquinho. Olha, caiu!

WINTER IS OVER

Esse desgoverno não trata bem nem seus apoiadores mais fiéis. Já longa a lista de abandonados pelo caminho: Gustavo Bebbiano, Joice Hasselmann, Major Olímpio... A mais nova integrante do clube é Sara Giromini, que agitou as redes sociais na noite de ontem com um longo desabafo. Não, ela não é nazista. Ninguém passa de feminista radical a extremista de direita se não for desequilibrada. E, pelo texto que a maluca divulgou, o que ela quer mesmo é papai e mamãe, não a instalação de um estado totalitário. Isto não faz ter um pingo de pena dela, assim como tenho pena de um serial killer. Sara foi usada e descartada, porque não serve mais aos objetivos da familícia. Ela não tem maior importância, mas não é a única que está desapontada com a adesão dos Biroliro ao centrão. Mais interessante será ver como o gado se comporta, já que hã cada vez menos bandeiras que justifiquem o mito. A gritaria na internet já começou. Seria só engraçado, não fosse o risco do Edaír resolver agradá-los comentendo mais um despautério. É bom ficar atento.

domingo, 4 de outubro de 2020

ORGULHO SEM PRECONCEITO

Até o começo da semana passada, pouca gente tinha ouvido falar dos Proud Boys, um dos mais violentos grupos neonazistas dos Estados Unidos. Aí veio o primeiro debate entre Joe Biden e Donald Trump, e o Bebê Laranja não só se recusou a criticar os rapazes, a pedido do mediador Chris Wallace, como ainda mandou palavras de encorajamento a eles. No dia seguinte, a frase "Stand Back and Stand By" já estava em camisetas produzidas pelos meliantes, que acharam que já estava na hora de saírem das sombras. Mas a alegria durou pouco: a hashtag #ProudBoys foi sequestrada pela bicharada nas redes sociais, com um monte de casais gays postando suas fotos com ela. Eu também aderi: dá uma olhada no meu perfil no Twittrer, no Facebook ou no Instagram. Criou-se o mito de que a extrema-direita é imbatível na internet. Parece que o jogo virou, não é mesmo?

PB & J AND APPLE SLICES

Digo e repito que eu torço para que o Trump morra de Covid-19, com muitas dores e falta de ar. Sou mesmo uma pessoa ruim, pagã, não-temente a Deus. A única coisa que faz suspeitar de que haja mesmo uma entidade superior é a suspeita de que o Bebê Laranja tenha pego o vírus de Amy Coney Barrett, sua indicada para a Suprema Corte. A fofa só contou depois do coquetel de lançamento de sua candidatura que estava "se recuperando" da doença, e dezenas de convivas presentes foram contaminados. Tudo indica que Trump está mesmo mal, tomando doses fortíssimas de remédios experimentais. Torço, sim, para que ela bata as botas, mas não agora. Prefiro uma lenta e dolorosa agonia até depois da eleição, e que ele deixe este plano com consciência suficiente para saber que perdeu. A vantagem do Biden aumentou nos últimos dias, contrariando os sonhos de quem achava que essa internação teria o mesmo efeito que a facada teve sobre a campanha do Biroliro em 2018. Há duas diferenças cruciais. A primeira é que o Bozo ainda era bastante desconhecido do povão que não lê jornal, então muita gente ficou com peninha do pobrezinho. A segunda é que a facada foi dada por um terceiro. Trump, ao contrário, só faltou beijar na boca do coronavírus, de tanto que ele estava implorando por uma infecção. Seus índices estão caindo ainda mais nas pesquisas, pois os americanos sabe que ele não fez nada para se proteger. E ainda estão tirando sarro dele, como no esquete que satirizava o debate no "Saturday Night Live" de ontem. Aproveite, porque pode ser das últimas vezes em que Alec Baldwin imitará o Bebezão. Por outro lado, Maya Rudolph deve ter emprego garantido por muitos anos, como a futura presidente Kamala Harris. Maravilhoso o momento em que ela se apresenta como "Mamala" e promete "pb & j and apple slices" (manteiga de amendoim com geleia e fatias de maçã) para os dois debatedores. Fica esperto, porque o futuro chegou.

sábado, 3 de outubro de 2020

INIMIGA DE SI MESMA

Eu cresci lendo os nomes de Betty Friedan, Gloria Steinem e Bella Abzug nas revistas. As feministas americanas tiveram seu auge político e midiático na década de 70, e essas mulheres corajosas eram notícia toda semana. Mas só agora fiquei conhecendo melhor a arqui-inimiga número 1 dessas pioneiras: Phyllys Schlafly, que liderou o movimento contra a aprovação da Emenda dos Direitos Iguais, que equiparia homens e mulheres perante a lei. É difícil crer que uma mulher seja contra isso, e os argumentos de Phyllys não paravam em pé. Ela temia que meninas fossem convocadas para a Guerra do Vietnã, ou que mulheres divorciadas perdessem a guarda dos filhos. No fundo, era uma mulher arguta e educada, que não conseguiu trabalhar na área que a fascinava - política externa e defesa - justamente por causa do machismo. Voltou então sua enorme energia para uma causa que era simpática aos homens, e fez um estrago considerãvel. Sua história é contada em "Mrs. America", uma minissérie de produção suntuosa e elenco espetacular que acaba de estrear no canal Fox Premium 1. Cate Blanchett faz a sra. Schlafly, e as grandes líderes do campo oposto são vividas, de maneira impressionante, por atrizes do calibre de Rose Byrne, Tracey Ullmann, Margo Martindale e Uzo Aduba (esta última venceu o Emmy de atriz coadjuvante em minissérie, a única vitória entre as 10 indicações  que "Mrs. America" recebeu). Além dos ótimos diálogos e da direção impecável, o programa ainda discute a fundo o maior dos temas da atualidade, que é a emancipação da mulher. É inacreditável que, quase meio século depois, ainda estejamos vivendo as mesmas situações que as personagens. Mas, como diz minha amiga Mariliz Pereira Jorge: se não existisse mulher machista, não haveria mais machismo.
Uma das coisas que mais me agradou na série foi o tema de abertura. "A Fifth of Beethoven" tocava nas festinhas e na trilha de "Saturday Night Fever", e é uma escolha pouco óbvia para um programa tão politizado. Um dos melhores de 2020.

sexta-feira, 2 de outubro de 2020

PORQUE TORÇO PARA QUE TRUMP MORRA

Donald Trump está com Covid-19. Torço para que o quadro se agrave e ele morra. Nada pessoal. Quer dizer, um pouco. Não consigo emular totalmente o artigo do Hélio Schwatrsman de quase três meses atrás, em que o articulista da Folha torcia pela morte do Biroliro. A existência do Bebê Alaranjado me ofende, e suas ideias me ameaçam. Se ele deixar esse plano, vou festejar. Mas será que ele está mesmo doente? Sei não. Em julho passado, depois de passar meses se recusando a apresentar seus testes, o Edaír de repente se infectou com o coronavírus. Justo no momento em que o Queiroz estava preso e suas chances de impeachment cresciam. O Despreparado saiu de circulação por três semanas e, quando reapareceu, sua popularidade começava a aumentar por causa do auxílio emergencial. Trump pode estar usando tática parecida. Sua participação calamitosa no debate de terça aumentou ainda mais a diferença que o separa de Joe Biden, líder nas pesquisas, e sua declaração em favor dos Proud Boys pegou mal mesmo entre os republicanos. A Covid-19 pode servir para ele faltar aos próximos debates e - quem sabe - angariar alguma simpatia entre seu público-alvo, notório pela falta de compaixão. Eu não tenho a mínima. Torço para que este obeso de 74 anos morra com dores terríveis e seja recebido no inferno pelo próprio Satanás. Seria mais do que justiça poética. Seria justiça, period.

(Antes que uma normalista aponte o dedo, o "porque" do título do post está errado de propósito. Se eu usasse a forma correta para a frase, "por que", o título se quebraria em duas linhas, e eu tenho HORREUR a isto. Outra coisa: não, os Simpsons não previram a morte do Trump. A imagem acima é fake.)

quinta-feira, 1 de outubro de 2020

SUPREMO EGOÍSMO

É incrivelmente escrota a maneira como o Biroliro está escolhendo seu primeiro ministro para o STF. Para quem ainda tinha dúvida, ele deixou claríssimo que só tem uma coisa naquela cabeça suja: sua sobrevivência política. Não está nem aí para os evangélicos, os lavajatistas, a direita histérica e o bem do Brasil. Deixou todo mundo que o apoia a ver navios e escolheu um juiz bem pouco conhecido, mas que tem duas vantagens. A primeira é ser nordestino, e fazia tempo que a corte não tinha ninguém da única região do país onde o Bozo perdeu. A outra é que Kassio Nunes é cupincha dos políticos do Centrão e contra a Lava-Jato. Uma garantia de que, tirando os petistas, ninguém mais irá para a cadeia por corrupção. Talvez devêssemos estar contentes, pois não foi dessa vez que o indicado é um reaça terrivelmente evangélico. Veja só o que acontece nos EUA. Amy Coney Barrett, que o Bebê Laranja quer para a cadeira de Ruth Bader Ginsburg na Suprema Corte, tem ligações com uma organização religiosa que trata as mulheres como "handmaids". Ainda em que não foi aqui, não é mesmo?

BEBI, LIGUEI

Sim, "The Boys in the Band" está datada. Não de todo: alguns dos dramas vividos pelos nove homens gays que se encontram numa festinha de aniversário em Nova York, no distante ano de 1968, ainda se repetem nos dias de hoje. Tem a poc histriônica que não arranja namorado. Tem o homem que foi hétero a vida toda e acabaou de largar mulher e filhos para ficar com um boy que não lhe promete 100% de fidelidade. Tem dois caras que se cumprimentam como se não se conhecessem, apesar de já terem transado na sauna. Tem o garoto de programa que é o "presente" do aniversariante, burro feito uma porta mas louco para agradar. Só que o texto de Matt Crowley é anterior a Stonewall e a todo o movimento pelos direitos igualitários. Surgiu numa época em que ser homossexual ainda era uma vergonha a ser escondida a qualquer preço. Todos os nove rapazes odeiam a si mesmos em diferentes graus, e ninguém mais do que o anfitrião Michael (Jim Parsons). É dele a ideia que destrói a festa de uma vez por todas: aproveitando a bebedeira generalizada, cada um dos convidados deve telefonar para o amor de sua vida e se declarar, mesmo que o felizardo jamais tenha desconfiado desse amor todo. Esse jogo serve para que cada um dos atores tenha pelo menos uma grande cena. Todos eles participaram do revival da peça na Broadway dois anos atrás, dirigido pelo mesmo Joe Mantello que assina o filme da Netflix. Isto faz com que algumas interpretações estejam um pouco over para a telinha, mas relaxa, bee. Você está vendo um documento histórico. Um retrato da vida gay de 50 anos atrás, tão diferente e tão parecida com a de agora. A nova versão de "The Boys in the Band" mostra o quanto evoluímos - todo o elenco é gay assumido, algo impensável antigamente - e o quanto ainda falta para sermos aceitos, inclusive por nós mesmos.