terça-feira, 31 de dezembro de 2019

VIM-TE VINTE

O meu 2019 foi marcado por uma tragédia pessoal: a morte do meu cachorro Nacho, que ingeriu veneno de rato. Penso nele até hoje e anda não tive forças para substituí-lo. Aliás, taí uma resolução para 2020: um novo cão. Vira-lata, amarelo, adotado. E já com um ano de idade, para não mastigar a casa inteira e ter noção de toalete. 

Mas a verdade é que o ano que termina daqui a pouco foi legal para mim. Vivi inúmeras aventuras: assisti da plateia à cerimônia dos Tony Awards, fui jurado do "Popstar", estive em Tiradentes e Liverpool pela primeira vez. Conheci Steven Spielberg, Fernanda Montenegro, Gilberto Gil, Matteo Garrone e sir David Attenborough. Entrevistei uma pá de gente bacana, como Bruno Barreto, Maria Bopp, Júlia Rabello, Andréia Horta e Marcelo Adnet. Entreguei um roteiro que eu estava devendo há mais de um ano. Comecei um outro projeto muito bacana, do qual ainda não posso falar nada. Herdei dois gatos. Nunca trabalhei tanto, mas só naquilo que eu gosto. Desejo mais do mesmo em 2020, e para todos nós, amém.

segunda-feira, 30 de dezembro de 2019

AQUELES QUE SOBRARAM


Nesses últimos instantes de 2019, estou correndo para assistir ao maior número possível de concorrentes ao Oscar de melhor filme internacional, uma obsessão recorrente minha. Um título que estava dando sopa faz tempo na Netflix e eu só catei neste domingo foi o candidato da Suíça, "O Despertar de Motti". É uma comédia fofinha e inofensiva sobre um jovem judeu ortodoxo de Zurique, que quer escapar das dates arranjadas por sua "mame" caricata e namorar quem ele quiser - i.e. uma colega de classe "shiksa" (cristã). Infelizmente, minha fruição da película ficou prejudicada depois que o ator Joel Basman tirou a barba e ficou feinho de doer.


Entrei na sessão de "Aqueles que Ficaram" com a maior das más vontades. Queria só ver se esse filme húngaro é de fato melhor que "A Vida Invisível", para ter entrado na lista dos 10 pré-classificados ao Oscar. E adivinha? Mas não é mesmo. Esse ano a Academia revolveu voltar aos velhos maus tempos, quando bastava um longa resvalar no Holocausto para se tornar um forte candidato. Como no tão-chato-quanto "Uma Mulher Alta", a trama deste se passa no imediato pós-2a. Guerra. A história da órfã criada por um estranho até que tem seus momentos, mas não se compara à de Guida e Eurídice. O que fez com que fôssemos ignorados? A cena do pau duro?


Nas últimas horas de 2019, ainda encasquetei o representante do Vietnã, que, por alguma razão misteriosa, está disponível na Netflix. E não é que "Fúria Feminina" é divertidíssimo? É cinemão popular, mas muito bem feito. A trama é básica: uma mulher meio barra pesada tem a filha sequestrada, e bota pra quebrar. Mas as sequências de luta são coreografadas e filmadas de maneira sublime - especialmente uma entre a heroína e a bandidona sapatona, em um vagão em movimento com a porta aberta. E assim cheguei à espantosa marca de 28 candidatos ao Oscar de melhor filme internacional já assistidos (dos quais sete continuam no páreo). Segura que ano que vem tem mais.

WHO WATCHES THE WATCHMEN


Eu li a HQ dos "Watchmen" quando saiu, em meados dos anos 80. Em 2009, vi o filme. Mesmo assim, boiei gostoso no primeiro episódio da série da HBO. O roteirista Damon Lindelof reimaginou a história toda, e resolveu contá-la de maneira não muito linear. Foi só quando essa primeira temporada terminou e as minhas timelines se encheram de elogios que eu resolvi dar uma segunda chance para "Watchmen". Não me arrependi: a produção é fabulosa, e as realidades alternativas sempre me atraíram (nessa aqui, os Estados Unidos ganharam a Guerra do Vietnã e Robert Redford é o presidente da República). Mas, no final, depois de tanto efeito e tanta elocubração, ficou um certo aroma de WTF pairando no ar.

domingo, 29 de dezembro de 2019

MINHAS PESSOAS DE 2019

Essas não são as 10 pessoas que mais dominaram o noticiário este ano. Sabemos quem são elas: deixa elas lá no canto, quietinhas. Neste post eu quero lembrar de 10 nomes que me inspiraram em 2019, que me deram alguma confiança no futuro. Pensei em incluir artistas como Phoebe Waller-Bridge ou Billie Eilish, mas elas acabaram em outras listas. Então foquei na política. Todos esses 10 se rebelaram contra os poderes estabelecidos. Nem todos venceram, mas a luta continua.
ABIY AHMED
Confesso que eu nunca tinha ouvido falar do primeiro-ministro da Etiópia até ele ganhar o prêmio Nobel da Paz em outubro. Mas é para isto que também serve o Nobel: chamar a atenção sobre causas que nem sempre estão na mídia. O conflito entre a Etiópia e a Eritreia, que se arrastava há décadas, não afetava a vida de ninguém aqui no Brasil, mas o esforço de Ahmed em acabar com ele nos serve de exemplo.
FELIPE NETO  
Eu achava esse moleque insuportável até bem pouco tempo atrás. Só que, em 2019, o maior influenciador digital do país deixou de ser moleque, e começou a usar seu prestígio e seu dinheiro para promover pautas progressistas. Sua reação à tentativa do Crivella em censurar uma HQ na Bienal do Livro do Rio foi nada menos que épica. Mesmo sem disputar eleições, agora ele é um líder político.
FERNANDA MONTENEGRO 
A maior atriz do Brasil completou 90 anos em grande estilo: no olho do furacão, denunciando a censura incipiente e sendo vilipendiada por desqualificados sem caráter. Isto só reforçou sua importância. Fernandona é um farol de lucidez, que vai nos ajudar a atravessar esse mar revolto. E eu ainda tive o privilégio de conhecê-la pessoalmente, de abraçá-la e de contar a ela sua curiosa participação no meu nascimento.
GLENN GREENWALD
O jornalista americano já havia abalado o governo de seu país ao revelar o escândalo do Wikileaks, em 2013. Este ano ele abalou o brasileiro, ao denunciar com a Vaza-Jato que Moro, Dallagnol e companhia bela nunca foram imparciais nas investigações contra o PT. Casado com o deputado federal David Miranda e pai de duas crianças, o Verdevaldo ainda é um símbolo LGBT.

GRETA THURNBERG
Nada como a síndrome de Asperger e a plataforma fornecida por um país desenvolvido para que uma garota de 16 anos consiga enfiar o dedo na cara de todo mundo. Muitas das propostas da pirralha são inviáveis: se seguíssemos tudo o que ela prega, voltaríamos ao mundo pré-industrial. Mas é preciso um radical para que a maioria saia do marasmo. Ela não luta só contra as mudanças climáticas, mas contra toda a boçalidade que se imiscui entre nós.
JACINDA ARDERN
A pacatíssima Nova Zelândia foi sacudida por um sangrento atentado anti-islâmico em março, transmitido ao vivo pelo Facebook. Muitos países reagiriam clamando por mais armas e menos imigrantes, mas a jovem primeira-ministra kiwi fez exatamente o contrário. Cobriu-se com um véu muçulmano para prestar solidariedade aos parentes das vítimas e ainda passou uma legislação restritiva ao armamento. Viu, velharada? É assim que se faz.

JUAN GUAIDÓ 
Faltava um rosto à oposição venezuelana. Faltava alguém para se levantar contra o regime podre de Maduro, quando todos os outros líderes estão no exílio ou na prisão. O jovem deputado se declarou presidente interino do país, levou milhões às ruas e angariou muito apoio internacional. Mas não onde realmente precisava: na corrupta cúpula do exército. Infelizmente, ele deve sair de cena em 2020, depois da fraude eleitoral que está prevista.


LINN DA QUEBRADA
Entrevistei a danada duas vezes neste ano, e em ambas saí de quatro. Como ela é articulada, como sabe das coisas, que combinação explosiva de talento e sabedoria! Depois de comandar seu próprio talk show ao lado da parça Jup do Bairro, a bixa travesty também se revelou ótima atriz em "Segunda Chamada". E ainda soltou uma das frases de 2019: "quem tem que ter medo são eles".

PETE BUTTIGIEG
Acho mais provável que uma lula gigante despenque sobre Nova York, vinda de outra dimensão, do que um homossexual ser eleito presidente dos EUA em 2020. Mesmo este gay sendo branco, de vida regrada e currículo mais do que impecável. Mas o Mayor Pete não está jogando para marcar gol agora. Tornou-se um nome conhecido nacional e internacionalmente, e ainda é muito jovem. Quatro anos passam voando.

TABATA AMARAL 
Nascida na periferia, formada em Harvard, especializada em educação e eleita deputada federal com a sexta maior votação de São Paulo, a menina-prodígio ainda ouriçou a antediluviana esquerda brasileira ao votar pela reforma da Previdência. Quase foi expulsa do PDT, mas tem o passe cobiçado por muitos partidos - e, muito provavelmente, o meu voto, seja lá para o que for.


Aqui termina minha retrospectiva de 2019. No dia 31, solto um balanço pessoal.

sábado, 28 de dezembro de 2019

STAR WAS


Pronto, acabou. Levei quase 42 anos, mas vi todos os nove filmes oficiais da franquia "Star Wars" no cinema, na época em que foram lançados. O primeiro deles, em janeiro de 1978, foi em um cinema de Campinas: eu estava de férias na fazenda da minha então namorada e fizemos uma caravana ao cinema mais próximo. Claro que eu sei que, hoje sendo uma propriedade intelectual da Disney, "Star Wars" não vai acabar nunca. Já está rolando a série "The Mandalorian", que nem com Baby Yoda corre o risco de me pegar. Estou mais do que saciado depois de ter visto o episódio IX, "A Ascensão Skywalker", e não preciso estar com a Força tão cedo. Chega de jedis, chega de sabres de luz, chega de Chewbacca. "Star Wars" já era.

MINHAS MÚSICAS DE 2019

Esse foi o post mais difícil de fazer. Antigamente era mais fácil: só listar os 10 melhores álbuns (que eu teimo em chamar ainda de "discos") e pronto. Acontece que eu não ouço mais álbuns. O único que eu toquei bastante foi o "Madame X" da Madonna, o meu favorito de 2019. Mas isto não quer dizer que eu ouça menos música, pelo contrário. Ouço faixas soltas, faço as minhas playlists, tenho os meus queridinhos. Aqui vão os 10 mais representativos, em ordem alfabética:
BILLIE EILISH
A jovem diva-depressão cometeu a que eu acho a melhor música do ano, "Bad Guy". Billie, na verdade, é uma dupla: ela não seria nada sem as composições e a produção do irmão Finneas O'Connell, um gênio. Em novembro eles voltaram à carga com a maravilhosa "Everything I Wanted", que eu não consigo ouvir sem lembrar do meu cachorro - morto seis meses antes. Vai entender.


DAVI
O ex-integrante da Banda Uó embarcou na carreira-solo com um trabalho bem diferente do de seu antigo trio. O álbum "Ritual", com a dengosa "Coisas da Bahia", traz um sonzinho  que faltava no Brasil, misturando ingredientes locais com uma eletrônica suave. Eu já tinha me rendido ao rapaz quando me dei conta de que ele integra a nova MPBicha. Ponto-bônus!


DINO D'SANTIAGO
O guia de Madonna em Portugal também é um músico completo. Por causa de seus pitacos em "Madame X", fui atrás do álbum "Mundu Nôbu", lançado no ano passado. Aí evoluí para o EP com remixes, de onde garimpei a pérola "Nova Lisboa (Moullinex Remix)" e, no finzinho do ano, me regalei com o EP de inéditas "Sotavento". Filho de caboverdeanos nascido no Algarve, o cara já é uma das principais vozes da lusofonia.


EMICIDA 
Eu não sou nada ligado ao rap, mas não posso negar: Emicida é um baita artista sério, cuja importância só cresceu nesses tempos escuros em que vivemos. A essa altura, todo mundo já ouviu "AmarElo", a reciclagem de uma canção do Belchior que virou hino da resistência gay com os vocais de Majur e Pabllo Vittar. Minha sugestão então é "Ismália", um feat. com Larissa Luz e ninguém menos do que Fernanda Montenegro.
JOHAN PAPACONSTANTINO
Como sói acontecer, minha lista dos melhores do ano tem nomes que mais ninguém conhece, só eueueu. Um deles é esse belo rapaz francês de origem grega, cuja música ensolarada carrega muitos elementos do país de seus antepassados. Recomendo vivamente o EP "Contre-Jour" e o single "Pourquoi Tu Cries??", lançado há dois anos mas incluído no álbum. Para facilitar a vida do ilustre leitorado, posto abaixo o clipe dessa faixa. 

LIL NAS X
Quem diria que a música mais tocada no planeta em 2019 seria uma mistura de rap com country, cantada por um rapaz sem medo de se assumir gay aos 19 anos de idade? "Old Country Road" ganhou ainda mais legitimidade quando Billy Ray Cyrus, o pai da Miley, gravou com Lil Nas X uma nova versão. No entanto, mesmo indicado a vários Grammys, tenho dúvidas se esse boy-magia tem uma longa carreira pela frente. Tomara.

LIZZO
Outra queridinha do Grammy é essa gorducha de voz possante e toneladas de carisma. Numa época em que a gordofobia virou pecado capital, é ótimo existir uma diva acima do peso e absolutamente segura de seu sex-appeal (a ponto de fazer uma das strippers de "As Golpistas"). Preciso me conter para não sair pulando feito doido cada vez que ouço "Juice".


MADONNA 
Ah, Madonna. Minha companheira de jornada, desde o longínquo ano de 1983. E em 2019 ela não me desapontou, muito pelo contrário. Madge recuperou o frescor com "Madame X", sem fingir que ainda é uma adolescente. Incorporando fado, batuque, funk carioca, disco, balé e mensagens políticas, foi mesmo o álbum do ano. Mas cadê o clipe de "Faz Gostoso"?

MARRÓN
Outro desconhecido pelas massas que entrou para a minha lista é este cantor e produtor mexicano radicado em Nova York, que eu comecei a escutar no final do ano passado. Este ano ele lançou o belo EP "Futur", com destaque para o single "4am". Como quero ajudar a divulgar essa musiquinha sofisticada, aqui vai seu clipe, talvez o mais barato de todos os tempos:



ROSALÍA 
A Anitta espanhola não lançou álbum novo em 2019 ("Malamente" é do ano passado), mas não teve mês em que essa catalã não aprontasse alguma. Teve feat. para todo lado, indicações ao Grammy e até uma certa polêmica em seu país natal: ela estaria autorizada a bulir com o flamenco, que não é originário de sua região? Não importa. Só importa La Rosalía. La Rosalía.

Claro que eu ouvi muito mais do que só esses 10. Minha playlist da melhores de 2019 ainda tem "Boy with Luv" (BTS feat. Halsey), um tsunami inescapável; a sexy "Mortel" (Fishbach), incluída na trilha sonora da primeira temporada da série "You" da Netflix; a versão de Juliette Armanet para uma música do Queen, "Cool Cat"; a estranha "Festa Tocandira", da misteriosa Flèche Negre; a viciante "Padê e Cachaça", da minha nova amiga Cristianny Ketchy; "Departamentos", dos argentinos Bandalos Chinos feat. Adan Jodorowsky; e toda a trilha do filme "Dear Ex", o representante de Taiwan no Oscar (disponível na Netflix). E tanto mais...

sexta-feira, 27 de dezembro de 2019

11 VEZES BACURAU

Hoje foi o dia em que eu vi muita gente supostamente esclarecida embarcando feliz na história do jornalista casado que tinha 10 amantes e levou cada uma de suas 11 mulheres, em sessões diferentes, para ver "Bacurau". Nem vou citar aqui o nome do dito cujo, porque não é isto o que vem ao caso. O que me espantou foi ver a mágoa de uma mulher enganada (uma das tais amantes , que nunca foram 11, começou o bafafá) evoluir para uma autêntica fake news. Pois é, nem os progressistas estão livres das mamadeiras de piroca.

MINHAS SÉRIES DE 2019

As séries de TV são hoje a forma de narrativa ficcional favorita da humanidade, mais populares do que os filmes, os livros, as novelas e as mentiras do Biroliro. Todo mundo tem a sua predileta; todo mundo está sempre querendo dicas. O Brasil vem melhorando no quesito, tanto que há três produções nacionais na minha lista das 10 mais. Lista, aliás, que mistura drama, comédia e minisséries fechadas, agora em ordem alfabética:

CHERNOBYL (HBO)
Em 1986, a União Soviética tentou esconder o derretimento de uma usina atômica na Ucrânia, e o resultado foi um desastre ambiental cujas consequências se fazem sentir até hoje. Sóbria e sombria, esta minissérie é uma das melhores dramatizações que eu já vi sobre o que acontece quando a ideologia se sobrepõe aos fatos. Devia ser obrigatória para quem duvida da ciência.

DIX POUR CENT (Netflix)
Eu devorei as três temporadas disponíveis, e não vejo a hora de chegar a quarta. Quero voltar logo ao glamour dessa agência de talentos de Paris, que tem Isabelle Adjani, Isabelle Huppert e Juliette Binoche na clientela.

FLEABAG (Amazon Prime Video)
A melhor coisa que eu vi na TV em 2019 foi o primeiro episódio da segunda temporada dessa sitcom britânica, escrita e estrelada pela espantosa Phoebe Waller-Bridge. Nada mais contemporâneo do que misturar ironia com desespero. Mas não há previsão de uma terceira leva: a moça já está envolvida em trocentos outros projetos, inclusive o próximo filme do 007.

THE MORNING SHOW (Apple TV+)
O carro-chefe do streaming da Apple, que foi lançado com apenas 10 séries originais, não traz novidades formais: é apenas um drama muito bem-feito, ambientado nos bastidores de um noticiário matutino. Mas inova no conteúdo: um dos temas do momento, o assédio sexual no local de trabalho, é abordado de maneira não-maniqueísta, onde ninguém tem toda a razão.

NINGUÉM TÁ OLHANDO (Netflix)
Adoro um certo tipo de comédia sarcástica, que os americanos chamam de tongue in cheek. Também adoro obras que ousam questionar a existência de Deus. A primeira sitcom dirigida por Daniel Rezende tem tudo isso, além de uma das minhas atrizes favoritas: Júlia Rabello, a quem eu tive o prazer de entrevistar três vezes este ano.

THE POLITICIAN (Netflix)
E por falar em tongue in cheek, a primeira incursão de Ryan Murphy ("Glee", "Pose") no streaming não tem papas nessa língua. Viadagem, suicídio, Gwyneth Paltrow e até mesmo a bizarra síndorme de Munchhausen by Proxy - quando alguém é convencido de que está muito doente - estão no cardápio da saga do rapaz rico e gay que sonha em ser presidente.

SEGUNDA CHAMADA (Globo)
O "Sob Pressão da educação" honrou o apelido que ganhou antes mesmo de estrear. As histórias dos alunos de uma escola noturna para adultos às vezes pareceram pesadas demais, mas o elenco primoroso e a direção de Joana Jabace seguraram a peteca com brio. Ah, sim, e viva Paulo Freire!

SHIPPADOS (Globoplay)
Só fui ver a série inteira depois que morreu sua co-autora, Fernanda Young. E fiquei com um gosto mais doce do que amargo na boca: o amor entre Enzo (Eduardo Sterblitch) e Rita (Tatá Werneck), que floresce em plena era dos aplicativos de pegação, é um belo contraponto à estreia de Fernanda na TV, "Os Normais" (2001). Ponto-bônus: Júlia Rabello está no elenco.

SUCCESSION (HBO)
Foi só na segunda temporada que esta série realmente pegou fogo, mesmo falando de um tema alheio a 99,999999% da população: o controle de um grande império de mídia. Mas por que a divina Hiam Abbass não ganhou um papel maior?

YEARS AND YEARS (HBO)
Quase que um longo episódio de "Black Mirror" dividido em seis partes. O futuro próximo do Reino Unido, com políticos populistas, tecnologia invasiva, crises migratórias e quebradeira geral, já começou. Pena que muita gente parou de ver quando morreu XXXX.

Menções honrosas: AMIZADE DOLORIDA e SPECIAL, duas séries de pegada LGBT que estrearam na mesma época na Netlfix e têm formato inovador: episódios de apenas 15 minutos, que podem ser vistos durante uma viagem de metrô.

By royal appointment: a terceira temporada de THE CROWN. Depois de um hiato de dois anos, a série voltou à Netlfix com um elenco totalmente renovado e mais suntuosa do que nunca. Qual é o seu episódio favorito? Eu estou dividido entre os dois protagonizados pela princesa Margaret (a esplêndida Helena Bonham-Carter) e aquele da freira grega que é mãe do príncipe Philip.

 Last and, yes, least: eu também me decepcionei com o final de GAME OF THRONES. A oitava e última temporada teve episódios sensacionais, mas o desfecho da epopeia pareceu apressado, como se os roteiristas estivessem com um táxi com o taxímetro ligado esperando na porta. O fim da série da HBO também marca um momento histórico: foi a última vez em que todo mundo assistiu ao mesmo programa ao mesmo tempo.

quinta-feira, 26 de dezembro de 2019

MIAU A PIOR


Não foi a cats-átsrofe que eu esperava. Meu amor pelos musicais e pelo camp evitou que eu fugisse do cinema. Nem por isto "Cats" é um bom filme. A pelagem digitalizada deixou mesmo os atores muito esquisitos. Jennifer Hudson consegue oversing umas das músicas mais over de todos os tempos, "Memory". E quem foi que aprovou a sequência das baratas? Mas o maior problema é mesmo o diretor Tom Hooper. Ele produziu uma versão da peça que é pouco mais do que teatro filmado, apesar dos efeitos digitais e dos cenários suntuosos. Baz Luhrman talvez fizesse algo menos careta, com cenas piscodélicas e a indispensável viadagem. Só o magnífico Ian McKellen se salva. O resto já foi pro céu dos gatos.

MEUS FILMES DE 2019

O ano foi ótimo... no cinema. Fui fazer a minha lista dos 10 melhores filmes do ano e, quando dei por mim, já eram 25. Veio coisa boa de todo lado: de Hollywood, do Brasil, da Geórgia, da Coreia, da Netflix. Pela primeira vez, títulos realmente importantes só puderam ser vistos no streaming. 2019 ainda foi glorioso para o cinema nacional, com prêmios em todos os festivais importantes, mas também foi o ano em que o desgoverno de plantão fez o que pôde para acabar com nossa indústria do audiovisual. Temo pelo que (não) vem em 2020. A seguir, em ordem de preferência, meus favoritos do ano que ora finda:

1) PARASITA
O vencedor do Festival de Cannes também é o franco favorito para o próximo Oscar de filme internacional, e fez por merecer. O novo longa do sul-coreano Bong Joon-Ho consegue ser popular, consequente e surpreendente, tudo ao mesmo tempo. O que poderia ser uma premissa cômica para a novela das 19h - família de vigaristas consegue emprego em uma mansão - vira uma fábula sombria sobre a desigualdade.


2) ERA UMA VEZ... EM HOLLYWOOD
O nono filme de Quentin Tarantino também é o melhor de todos, o que não é dizer pouco. O diretor reconstrói a Los Angeles de 1969 em cores vibrantes e ainda reescreve a história. Só não está no topo da lista porque não toca no tema do ano - a desigualdade social - mas é um libelo divertido contra o fanatismo e a boçalidade.

3) BACURAU
Será que ainda estaríamos no páreo do Oscar se o filme inscrito fosse de fato o melhor brasileiro do ano? O longa de Kléber Mendonça Filho e Juliano Dornelles é uma fábula alucinada e sangrenta, que alguns dispensaram como simplista ou maniqueísta. Não captaram a ironia e as referências pop da obra, ou ainda não estão incomodados com o Biroliro. Porque "Bacurau" é isso: um grito de desabafo contra um governo proto-autoritário. O filme certo na hora certa.

4) CORINGA
Quem lê esse blog sabe que eu sou que nem o Scorsese: não curto filme de super-herói. Mas a influência scorseseana é óbvia nessa história de origem do maior inimigo do Batman, com Joaquin Phoenix superando Heath Ledger no papel que deu a este um Oscar póstumo. Junto com "Parasita" e "Bacurau", "Coringa" forma a grandiosa trilogia anti-desigualdade de 2019.

5) DOIS PAPAS
O Ratzinger não é tão fofo nem o Bergoglio tão santo como faz crer o filme de Fernando Meirelles. Os dois pontífices tampouco se encontraram para trocar confidências antes da renúncia do primeiro, mas não importa. Os bastidores da Igreja, os diálogos precisos, os atores gloriosos, tudo funciona como que por bênção divina. Gostoso feito pizza com Fanta.

6) DOR E GLÓRIA
Não é o meu Almodóvar predileto, mas seus melhores momentos talvez sejam o auge de toda a carreira do diretor. Antonio Banderas está sublime como o alter ego Salvador Mallo, e a meditação sobre o período que vai do florescer da sexualidade à melancolia crepuscular é mesmo de pegar de jeito o espectador. No dia nem gostei tanto, mas aos poucos o filme cresceu em mim.

7) DOWNTON ABBEY
O ciclo de uma das melhores séries da década se fechou com um longa irretocável. Uma volta olímpica para todos os personagens, que se dividiram entre uma dezena de tramas paralelas e ainda enfrentaram juntos o maior white people problem de todos os tempos - o rei vem visitar! E agora? De quebra, uma das melhores frases de Lady Grantham: "eu não discuto, eu explico".

8) VICE
Donald Trump é uma figura execrável, mas a gente se esquece que, antes dele, houve um governo republicano realmente letal: o de George W. Bush, cuja eminência parda, o vice-presidente Dick Cheney, é retratado sem piedade nessa ousada cinebiografia. A cena em que ele e a segunda-dama começam a se recitar as falas de "Macbeth" já entrou para o meu hallzinho da fama particular.

9) ROCKETMAN
A história de Freddie Mercury é mais pungente, mas a biopic de Elton John consegue se ater aos fatos sem deixar de ser delirante. Ao contrário de "Bohemian Rhapsody", este aqui é um musical escancarado, com números coreografados e alguma sacanagem. Se Rami Malek não tivesse ganho tudo no ano passado, Taron Egerton estaria favoritíssimo este ano - inclusive porque ele canta para valer.

10) HOMEM-ARANHA NO ARANHAVERSO
Será que eu escorreguei no banheiro e bati a cabeça no chão? Ou, então, entrei pelo Tonyverso. Este que está escrevendo é a minha versão que gosta de filme de super-herói, porque há dois exemplares ligados ao gênero na minha lista dos melhores do ano. Esse aqui é uma animação delirante que mistura várias técnicas, uma viagem lisérgica sem o consumo de substâncias ilícitas.


Ainda tenho dúvidas se os colocados de 6 a 10 mereciam mesmo estar neste ranking. Qualquer um dos próximos 20 poderia estar no lugar deles. Concorda?

BABENCO - ALGUÉM TEM DE OUVIR O CORAÇÃO E DIZER: PAROU 
BOY ERASED 
BREXIT 
BUOYANCY 
E ENTÃO NÓS DANÇAMOS 
ENTRE FACAS E SEGREDOS 
A ESPOSA
FORA DE SÉRIE 
AS GOLPISTAS 
HISTÓRIA DE UM CASAMENTO 
O IRLANDÊS 
JUDY
MORTO NÃO FALA 
NUNCA DEIXE DE LEMBRAR 
O PÁSSARO PINTADO 
O REI 
SÍLVIO E OS OUTROS 
SÓCRATES 
SYSTEM CRASHER 
A VIDA INVISÍVEL

Esses 20 estão em ordem alfabética. Não consigo ordenar por preferência. Estou exaurido, esses posts de retrospectiva cansam demais. Amanhã eu continuo.