quinta-feira, 31 de agosto de 2017

A FILHA DA NOIVA


Maria Ribeiro tem razão ao dizer que "Como Nossos Pais" parece filme argentino. É uma história urbana sobre relações pessoais, passada dentro de casas e apartamentos de classe média, com diálogos precisos e tiradas de humor. A crise da protagonista me lembrou a do personagem de Ricardo Darín em "O Filho da Noiva". Aqui ela  tem como gatilho uma revelação súbita logo no comecinho (não é spoiler, está até no trailer), mas as causas profundas são como na obra do Campanella: é a vida, é a vida e é bonita. Ou não, porque problema é o que não falta, e para todos os lados. Com o marido sonhador, o pai mais fora de órbita ainda (Jorge Mautner, uma revelação), as filhinhas pentelhinhas, a já citada mãe que resolveu chutar tudo para o alto (Clarisse Abujamra, excelente), o trabalho frustrante, a libido represada... Sim, nossa heroína tinha tudo para ser uma chata. Mas não é - só um pouquinho - graças à atuação cheia de nuances de Maria Ribeiro, que está de fato fenomenal. Será este o melhor filme brasileiro do ano?

A HORA DA ESTRELA

Está mais do que na hora de Totia Meireles ser aclamada como a grande artista que é. Relegada a papéis coadjuvantes na TV, ela sempre arrasa no teatro musical. E arrasou também em seu primeiro show solo, "Meu Nome é Totia", apresentado ontem em SP. Totia estava nervosa: a voz derrapou nos primeiros números, e ela ainda se esqueceu de algumas letras em cena aberta. Mas compensou com simpatia, carisma e um repertório que misturava temas dos espetáculos de que participou com clássicos da MPB. Agora quero ver Totia protagonizando uma novela.

quarta-feira, 30 de agosto de 2017

NO CONFORTO DO SEU LAR


Escrever a coluna Multitela tem me feito ver ainda mais TV do que antes, porque eu preciso saber o mínimo a respeito do que estou falando. Principalmente dos filmes disponíveis nos serviços on-demand, que estreiam em enxurrada toda semana. Alguns eu vi no cinema, mas outros são inéditos e/ou exclusivos das plataformas. É o caso de "Onde Está Segunda?", um bom thriller de ficção-científica. Em geral não curto o gênero, mas sou obrigado por contrato a ver qualquer coisa onde apareça minha ídala Glenn Close. Aqui ela aparece pouco, e novamente como a vilã. Quem dá um show é a sueca Noomi Rapace, fazendo sete irmãs gêmeas que cresceram em segredo numa sociedade totalitária que só permite filhos únicos. Juntas, as sete parecem as fases da carreira da Cher. Muita porrada e efeito especial nesta produção europeia, que por aqui só chegou ao streaming.

"A Rainha da Espanha" também foi direto para o VoD. Pudera: essa superprodução com elenco internacional fracassou nas bilheterias. É a continuação de "A Garota dos Seus Sonhos", de 1999, onde Penélope Cruz fazia uma jovem atriz em plena Guerra Civil Espanhola. Vinte anos depois, ela é uma espécie de Sophia Loren, com carreira em Hollywood, e volta a seu país natal para rodar uma biografia da rainha Isabel, a Católica. A mistura de piadas do mundinho do showbiz com uma trama política (um dos atores é perseguido pelo generalíssimo Franco) não é das mais sutis, mas há maneiras piores de enfrentar um domingo de chuva e preguiça.

"Terra de Minas", também disponível para aluguel no NOW, foi o único dos cinco indicados ao Oscar de melhor filme em língua estrangeira que não passou nos cinemas brasileiros. O longa dinamarquês conta um episódio polêmico da história de seu país: logo após a 2a. Guerra Mundial, soldados alemães - moleques, na verdade - foram obrigados a desencavar e desarmar os milhões de minas que os nazistas haviam enterrado nas praias de lá. Não é spoiler dizer que muitos foram pelos ares. O tom seco não me pareceu lá muito do gosto da Academia, mas aposto que os velhinhos votantes aprovam no automático qualquer coisa que venha da Escandinávia.

#MEU MOTORISTA ABUSADOR

Aconteceu outra vez. Bastou uma mulher articulada se manifestar - no caso, a escritora Clara Averbuck - para dezenas, centenas de outras virem a público com casos parecidos. O tema da hora são os abusos que elas sofrem nas mãos de motoristas de transporte público, geralmente em situações em que estão sozinhas ou indefesas. Mas nem sempre: ontem mesmo teve um sujeito que ejaculou em cima de uma menina dentro de um ônibus em plena Av. Paulista. Felizmente, a garota deu o alarme, o busão fechou as portas e o tarado foi preso. O episódio ilustra como esse tipo de assédio é comum, cotidiano. Como no hashtag Primeiro Assédio, também tenho a sensação de que todas, sem exceção, passaram pelo menos uma vez por violência semelhante. Clara Averbuck foi corajosa em se expor na internet (e atrair para si milhares de comentários agressivos, de "só quer aparecer" para baixo). Mas ainda estou na dúvida se ela fez bem em não denunciar seu agressor à polícia. Entendo que Clara tenha medo - afinal, o cara sabe onde ela mora, e já perdeu o emprego no Uber. No entanto, continuando solto por aí, é quase certo que ele vá cometer mais crimes.

(Mande a sua história para esta página do Facebook)

terça-feira, 29 de agosto de 2017

RECEBA AS FLORES QUE LHE DOU

E em cada flor um beijo meu... Este antigo sucesso de Nilton César cai como uma luva no mais novo escândalo envolvendo Gilmar Delama Mendes. Pois é, amiguinhos: o impoluto ministro do Supremo e sua mulher Guiomar receberam flores de Jacob Barata Filho em dezembro de 2015. Pois é, fofos: o "rei da corrupção do ônibus" que Gilmar mandou soltar DUAS vezes, de cuja filha Gilmar foi padrinho de casamento e com quem Gilmar não tem a menorrr intimidade, enviou um lindo arranjo floral para este casal que ele mal conhece. Em agradecimento a quê? Favores passados, presentes ou futuro? Isto é um desaforo, um acinte, um caso claríssimo de suspeição. E para impeachment. Ou para renúncia. Já!

BRIENNE OF TARTH, WON'T YOU SPREAD YOUR GIANT LEGS FOR ME?

"Bohemian Rhapsody" serve para tudo, dos Muppets às listas de supermercado. Era só questão de tempo que se transformasse numa canção de fogo e gelo.

(Obrigado pela dica, Douglas Mendes)

segunda-feira, 28 de agosto de 2017

ALÔ ALÔ, ADEUS

Um artista pode ser ignorante do mundo, mas não a ponto de não saber quem é seu próprio público. OK, "artista" é uma forçação de barra para definir Inês Brasil, mas ignorante, sem dúvida, ela é. E nós também somos, por tratá-la como um ícone gay, comprometida com a nossa causa: Inês só se interessa por si mesma, e não tem uma assessoria que lhe aclareie as ideias. A foto ao lado do Bolsonazi foi um tiro no pé ainda maior do que o que Pepê e Neném se deram no começo do mês. Porque Inês ainda tem algo que lembra uma carreira, ou tinha; não duvido nada que seja vaiada em seu próximo show. E não, ela não tem a desculpa de que "não apoia nenhum político", ou que só quer saber de "amor". Quem não apoia político não tira foto com nenhum deles. Quem quer saber de amor nem chega perto do Bolsonazi. Adeus.

SWIFT, SWIFT, BITCH

Deus sabe que eu tentei. Mais uma vez, escutei Taylor Swift com o propósito explícito de gostar dela. Afinal, a mina vende bem no mundo inteiro, já ganhou dois Grammys de melhor álbum do ano (enquanto que Beyoncé não passa da indicação) e está sempre nas manchetes dos sites de fofoca. Mas alguma coisa em sua persona não me cai bem, e eu finalmente entendi por quê. Taylor Swift só fala de si mesma: até aí, zuzo bem, ninguém é mais egocêntrica do que Madonna, que no entanto manda em mim há mais de 30 anos. Acontece que a Swift é uma bitch no sentido mais negativo do termo: rancorosa, encrenqueira, cheia de não-me-toques. Suas brigas públicas com Kanye West e Katy Perry já deram no saco, mas ela insiste. A própria Katy já pediu água, mas nem por isto Taylor deu as caras ontem nos VMAs, apresentado por sua rival. Só mandou o clipe de "Look What You Made Me Do", uma extravagância de autoadoração de que nem a própria Madonna foi capaz. Sem falar que a música em si, que põe a culpa de tudo o que Taylor diz ou faz nos "outros",  é fraquinha a mais não poder.

domingo, 27 de agosto de 2017

DRACARYS

Estou muito tenso com o último capítulo da sétima temporada de "Game of Thrones", que vai ao ar hoje à noite. Não pelo que vai acontecer - meio que já sei tudo, pois já recebi spoilers até do que ainda nem foi filmado - mas pela qualidade dos roteiros da série, que despencou de uma altura maior que a da Muralha. O episódio da semana passada foi uma aula do que não fazer, com uma premissa idiota ("vamos caçar um white walker!") e um deus ex-machina imperdoável ("Tio Benjen!"). Ainda teve Jon chamando Danaerys de Dany, aproximando "GoT" do terreno da fanfic. Só faltam "shippar" o casal como "Joenerys", como já fez este meme sensacional aí acima. Aí vou mandar o dragão tacar fogo em tudo.

sábado, 26 de agosto de 2017

O PALHAÇO DESCABELADO


Eu fui ao programa do Bozo! Calma, eu já tinha uns 27 anos. Fui pela agência onde eu trabalhava, para supervisionar um merchan da Danone. O palhaço deu um iogurte para uma criança da plateia, pediu para ela provar e então perguntou: gostou? Nãããããão, respondeu o moleque, ao vivo e a cores para todo o Brasil. Pena que eu não saiba se aquele Bozo era o Arlindo Barreto, cuja história inspirou "Bingo: o Rei das Manhãs". O filme muda todos os nomes (menos o da Gretchen), mas conta o drama do ator que cheirava, bebia e sofria por não poder revelar sua identidade. O primeiro trailer saiu há quase um ano e deixou muitos gente doida para ver, inclusive eu. Foi quase inevitável me desapontar um teco. Há muitas cenas boas, claro, mas também uma certa mão pesada na trama do filho negligenciado, além de um "só Jesus salva" como moral da história. Vladimir Brichta está fabuloso, mas também tem o único personagem em cena: todos os demais não passam de escadas, inclusive a diretora crente feita por Leandra Leal. Mesmo assim, "Bingo" é um programa obrigatório para quem sobreviveu aos anos 80.

MIMIMIKER

Sempre achei a atitude da Liniker mais interessante do que sua música. Agora acho as duas uma bosta. A cantora trans se crê muito lacradora, mas não segurou a onda de descer para cantar no meio do público e ter sua bunda apalpada ("alvoroçada", segundo ela) por um engraçadinho. Foi ao Instagram Stories e postou um vídeo choramingas, onde reclamava que "objetificaram" seu "corpo preto". Esquece-se ela, como bem lembrou o André Forastieri em sua coluna, que QUALQUER cantor popular que se misturar ao público sem um cordão de seguranças ao redor será apalpado, se não pior. Anitta, Michel Teló, Roberto Carlos, todos eles virariam picadinho. Mas então a Liniker tem razão quando diz que sente meio "culpada" pelo que aconteceu? Não, ela não tem culpa de nada, mas foi pra lá de ingênua (para não dizer burra). Ninguém tem o direito de alvoroçar a bunda do outro sem ter sido convidado, mas a reação de Liniker revela que ela é um dos porta-estandartes da geração mimimi. Autoproclamam-se "divas", "deusas", "pisadoras", mas problematizam o universo quando alguém não bend the knee diante delas. Só queria saber o que Ney Matogrosso, um cantor queer de raiz - e que foi hostilizado inúmeras vezes em seus shows - pensa dessas bichas nutella. Ah, Mimimiker, pra mim você acabou.

sexta-feira, 25 de agosto de 2017

DUPLA DE TRÊS


Escutei o novo álbum dos Tribalistas e tive a mesma sensação de 15 anos atrás: eles são menos que a soma das partes. Qualquer disco solo de Marisa Monte ou Carlinhos Brown é melhor (do Arnaldo Antunes não, credo). As novas músicas soam preguiçosas, como se tivessem sido criadas com eles deitados na rede. Algumas letras tratam de temas sérios como imigração ou polarização política, embora pareçam terem sido escritas para um disco da Xuxa. Mas o primeiro trabalho também foi assim, e vendeu pacas, e ganhou prêmios, e tem faixas que tocam até hoje. Este segundo disco também é agradável. Sei acho que podiam ter se esforçado mais (o Arnaldo não).

AS CARAVANAS PASSAM


O Brasil é um país curioso. Até o advento da internet, Chico Buarque era uma unanimidade nacional. Um tesouro, um gênio da raça, tudo o que ele fazia era recebido com chuva de pétalas de rosas. Aí surgiram as redes sociais, e a simples menção do seu nome suscita reações raivosas. Acusam-no de ter se aproveitado da Lei Rouannet para comprar o apartamento que mantém em Paris há mais de 30 anos; mandam-no para Cuba. A mais recente polêmica envolveu a letra de "Tua Cantiga", que abre o álbum "Caravanas". Chico foi chamado de machista e antiquado por dizer na música que "larga mulher e filhos" por causa de um novo amor. Mas o que de fato me incomodou foi a melodia aborrecida: por que escolheram uma canção tão fraca para apresentar o novo trabalho? Muito melhor é "Massarandapió", uma valsinha composta por Chico Brown - neto de Chico e filho de Carlinhos Brown. O rapaz honra seu DNA e estreia em grande estilo, com uma linda letra do avô. Mas nem tudo é fofo em "Caravanas", apesar da leveza e do bom humor que percorre todas as faixas. A letra da canção-título, que encerra o disco, fala nas "picas enormes" dos "suburbanos tipos muçulmanos" que invadem a Zona Sul carioca nos fins de semana de sol, numa boa tradução do medo que a classe média sente desses rapazes de pele escura. Ainda é cedo para saber se vai se tornar um clássico do cancioneiro buarquiano, ou se "Caravanas" vai passar enquanto os cães ladram. Mas Chico não está nem aí: continua apoiando Lula incondicionalmente, o que ainda vai lhe render muitas pedradas, e continua fazendo música pra lá de boa.

quinta-feira, 24 de agosto de 2017

CHOQUE DE REALIDADE

Michel Temer é uma figura tão repelente que às vezes a gente se esquece da incompetência de Dilma Rousseff. Esta semana fomos lembrados, por causa do plano de privatizar a Eletrobrás. Sob a saudosa presidenta, a estatal - que vende um produto que todo mundo precisa, num mercado sem concorrência - conseguiu um rombo bilionário em suas contas. Tudo porque Dilma contrariou a matemática ao forçar a queda no preço da conta de luz, para facilitar sua reeleição. Agora ela diz que a privatização vai "trazer insegurança energética" para o Brasil, como se ainda não tivesse chegado. Pois eu não tenho nada contra. Não acho que o preço da luz vá cair, mas pelo menos é uma estatal a menos para os futuros governos encherem com apaniguados incompetentes que montam esquemas de propina.

quarta-feira, 23 de agosto de 2017

DANCIN' DAYS 2017

Abro a sua cela
Solto seus comparsas
Dou habeas corpus
Pr'amigo é de graça

E leve com você
Seu roubo mais lou, lou, lou, lou, louco
Pra quem é meu amigo
Soltar até que é pouco

A gente às vezes
Solta, solta, solta
Ai, como é bom soltar!

Naquela cela
Cabe tudo
Só não cabe alguém
Como eu
Como vocêêêê

TRANSDISNEY

Uma questão fundamental do nosso tempo é "como seriam os personagens da Disney se eles fossem transgêneros?". OK, não é verdade, mas nem por isto ela deixou de ser respondida. Um artista trans de Nova York que prefere ficar no anonimato (o que não faz lá muito sentido, se o objetivo era dar visibilidade à causa) criou as ilustrações deste post e muitas outras, que podem ser vistas aqui. A Bela Adormecida, por exemplo, virou um patinador do Holiday on Ice.


A Cinderela só precisa caprichar no make-up para ser confundida com o Pablo do "Qual É a Música".


O Hércules ficou a cara da Felicity Huffman, a Lynette da série "Desperate Housewives" (ela inclusive foi indicada ao Oscar pelo papel de uma trans no filme "Transamerica").


"Oi, tio, quer um boquete? Em troca o tio me paga um misto".


Sylvia Design, é você?


"Joffrey. Cersei. Walden Frey..." 

Tá bom, tá bom, a Arya é uma menina cis. E é melhor esse post parar por aqui mesmo, antes que me acusem de transfobia.

terça-feira, 22 de agosto de 2017

EL PATITO ES MI FAVORITO

Só quem viu "Vila Sésamo" quando era pequeno é que consegue captar todo o significado transcendental de Ênio e Beto cantando uma paródia de "Despacito".

SURREALISMO SOCIALISTA


"Afterimage" é lindo e triste, como convém ao trabalho final de um grande diretor. A história verídica do pintor polonês Wladyslaw Strzeminski tem paralelos com a do próprio Andrzej Wajda, que morreu pouco depois de completar este filme. Ambos foram perseguidos pelo regime comunista, mas pelo menos Wajda conseguiu o reconhecimento internacional ainda em vida. A arte abstrata e colorida de Strzeminski, que não seguia nenhuma ideologia, foi proibida na Polônia stalinista do pós-guerra, e ele próprio não conseguia emprego nem como retratista dos líderes de então. O realismo socialista até gerou coisas interessantes, mas sua imposição pelo estado ceifou vidas e obras. O réquiem de Wajda é mais um grito pela liberdade de expresão, tão ameaçada pelos tempos surreais em que vivemos.

segunda-feira, 21 de agosto de 2017

PARTIAL ECLIPSE OF THE HEART

OK, de quem foi a ideia? Por quê colocar Bonnie Tyler cantando "Total Eclipse of the Heart" num navio no Caribe, bem longe da faixa através dos Estados Unidos onde hoje o sol foi totalmente oculto pela lua? Nem na penumbra ela ficou, e ainda foi eclipsada - hehehe - por Joe Jonas, o mais bonito dos Jonas Brothers.

SAKHANAHJ

Baixei o Sarahah algumas semanas atrás e, durante dois dias, recebi mais de 20 mensagens - a maioria bastante simpática, ainda bem. Depois, um silêncio ensurdecedor: a brincadeira perdeu a graça mais rápido que o esfriamento de um suflê. Neste final de semana finalmente chegaram algumas, todas bastante suspeitas. Quem quisesse saber as identidades dos missivistas anônimos só precisava logar no aplicativo Sarahah Exposed (ou Spyer, ou View, ou Reveal), com quem o Sarahah teria estabelecido uma "parceria". Minha primeira reação foi "que puta falta de sacanagem". Primeiro os caras incentivam meio mundo a dizer umas verdades, depois puxam o tapete e desmascaram meio mundo! Mas então minha curiosidade falou mais alto - afinal, eu PRECISO saber quem foi que se arrependeu de não ter transado comigo quando teve a oportunidade. Só que eu não passei dos primeiros cliques: para "deslanchar" o Exposed, o usuário tem que baixar antes uns aplicativos de joguinhos, e deixá-los rodar por pelo menos 30 segundos. Golpe, é claro, mas suspeitei que fosse dos próprios criadores do Sarahah. Hoje descobri que não. Eles não dariam um tiro tão grande nos próprios pés, mas é golpe do mesmo jeito. Portanto, não caia nessa. Se já caiu, baubau: a esta altura, seu cartão de crédito deve estar sendo usado no Uzbequistão.

domingo, 20 de agosto de 2017

O BAGUNCEIRO ALOPRADO

Jerry Lewis foi, para a minha geração, o que os Trapalhões ou o Chaves foram para as gerações seguintes: o palhaço que fazia as crianças rirem, mas que a crítica execrava. Durante um bom tempo, Lewis só era respeitado como artista na França, o que acabou virando uma piada em si mesma. Mas já faz algumas décadas que ele é venerado como o gênio que de fato foi. Eu adorava seus filmes até descobrir Woody Allen, quando tinha uns 13 anos: aí Lewis realmente virou coisa do passado. Só voltei a gostar dele no magnífico "O Rei da Comédia", dirigido por Martin Scorsese em 1983. Na vida real, Jerry Lewis era um santo e um escroto. Foi ele quem inventou o formato "teleton", aquelas maratonas de caridade que se espalharam por todas as TVs do mundo. Mas também nunca se furtou a dizer qualquer besteira que lhe passasse pela cabeça, fosse machista ou homofóbica. Se bem que o castigo já veio: no telefilme "Martin e Lewis", que contava sua rixa de anos com o ex-parceiro Dean Martin, seu papel foi feito por  ninguém menos que Sean Hayes, o Jack de "Will & Grace".

Confira a mítica entrevista que ele deu em 2016, um esplendor de mau humor.

CHEZ NHONHÔ

Durante anos eu passei por aquele casarão numa das esquinas da Avenida Higienópolis imaginando as piores sevícias acontecendo lá dentro. Apesar da aparência elegante, ali funcionava a Secretaria de Segurança e a Divisão Anti-Sequestros, na época da ditadura militar. Foi preciso visitar o imóvel por dentro, numa visita guiada neste sábado à tarde, para saber que ali só funcionava a parte burocrática do aparelho de repressão. Ainda bem: o palacete construído pelo magnata do café Carlos Leôncio Magalhães, mais conhecido por Nhonhô, é um pequeno templo à arte e à cultura, e não merecia ser profanado pela violência. 

Logo na entrada há um balcão onde ficavam os músicos nas festas. No subsolo, um pequeno teatro, mais adequado para recitais de música do que peças teatrais. E no prédio todo, da garagem ao sótão, uma aula de arquitetura e decoração, tantos são os estilos misturados. Há um salão manuelino, um altar em art-nouveau, aposentos em art-déco e detalhes modernistas aqui e ali - inclusive uma parede com padrão geométrico que, suspeita-se, tenha sido pintada por Volpi. 

O próprio Nhonhô não chegou a morar lá: morreu em 1936, um ano antes da obra se completar. Mas sua família habitou o lugar por 15 anos, antes dele mudar de mãos. Hoje pertence ao Shopping Higienópolis, que está promovendo uma extensa restauração. Quando estiver pronta, pretende utilizar o espaço para shows e eventos. Por enquanto ainda há muitas alas fechadas e pouca iluminação nos andares superiores (recomendo a visita num dia de sol...). Mas abrir a visitação já é uma iniciativa mais do que bem-vinda, porque São Paulo é extraordinariamente ignorante de sua própria história.

sábado, 19 de agosto de 2017

THE GODFATHER - PART 2

Quatro anos atrás, o casamento entre Beatriz Barata e Francisco Feitosa Filho foi manchete em todo o Brasil. Nem tanto pela efeméride social em si, mas pela batalha campal que se armou ao redor do Copacabana Palace, onde acontecia a festa. Quis o destino que os pombinhos se enlaçassem justo quando o país vivia sua primeira grande onda de manifestações, e ficou célebre o artigo em que Hildegard Angel chamava o acontecido de "Bastilha carioca". Mas um detalhe passou quase desapercebido no texto da colunista: ela até cita que um dos padrinhos da noiva era o Gilmar Mendes, mas ninguém deu muita bola para isto. Naquela época, de fato o STF não andava tão em evidência como hoje, quando conhecemos melhor seus integrantes do que os da atual escalação da seleção brasileira. Pois é, amiguinhos: o juiz que numa semana absolve o Temer e na semana seguinte convida-o para jantar em sua casa, também é unha e carne com Jacob Barata Filho, o "rei do ônibus", preso ontem à noite no aeroporto do Galeão. Dá até para suspeitar que Gilmar é mesmo o padrinho - no sentido mafioso do termo.

ADENDO: Pela primeira vez na história deste blog, estou reprisando um post. A única novidade no texto, publicado em 3 de julho passado, é este adendo. Porque o resto continua igual, se não pior. Esta semana Gilmar Mendes mandou soltar DUAS VEZES seu compadre Jacob Barata Filho e ainda saiu-se com uma pérola que vai entrar para os anais da cara-de-pauzice brasileira. Disse que o fato de ter sido padrinho da filha de Jacob era irrelevante, porque "o casamento durou menos de seis meses". Quem dera durassem seis meses o que resta de seu mandato no Supremo Tribunal Federal, que ainda tem 12 anos pela frente.

sexta-feira, 18 de agosto de 2017

quinta-feira, 17 de agosto de 2017

BOY NEON


Elias é bonito e resolvido. Trabalha numa confecção e não tem dinheiro no bolso, mas vive feliz e tem muitos amigos. Também tem muitos namorados, ou peguetes - não rolam ciúmes nem cobranças. Essa ausência de conflitos faz com que "Corpo Elétrico" se resuma a um retrato, bastante idealizado, de um gay na periferia de São Paulo. Cadê a homofobia? Cadê a angústia, que para a maioria das pessoas não precisa de quase nada para se manifestar? Elias não está nem aí: bebe, fuma, dança, trepa e anda de moto com a Márcia Pantera, um mito da noite paulistana. "Corpo Elétrico" vem tendo críticas ótimas, talvez porque seja o primeiro filme de pegada pernambucana rodado em SP (o diretor Marcelo Caetano foi assistente de direção em "Tatuagem" e fez o casting de "Aquarius"). Mas não bate com  meu gênero.

A POESIA CONCRETA DE TUAS ESQUINAS

São Paulo é uma das metrópoles mais feias do mundo. Mas nem sempre foi assim: em meados do século 20, a cidade viveu um boom imobiliário e se encheu de ousados arranha-céus, assinados por alguns dos maiores arquitetos do Brasil e do mundo. Especialmente entre 1950 e 1960, surgiram edifícios icônicos como o Itália, o Copan e o Conjunto Nacional. Este período de arrojo e beleza urbana, nunca mais repetido, é o tema do primeiro livro do jornalista Raul Juste Lores, que toda semana destaca em sua coluna na Folha alguma joia semi-esquecida no meio da feiúra. Aqui elas estão reunidas e têm suas histórias contadas, num trabalho tão essencial que até surpreende o fato de não ter sido feito antes. Fartamente ilustrado, "São Paulo nas Alturas" traz até um guia com itinerários a pé por alguns bairros paulistanos, para o interessado observar in loco muitos dos prédios citados. E depois se indagar o que foi que deu errado.

quarta-feira, 16 de agosto de 2017

MUITO COMÉDIA


Escrever a coluna "Multitela" da Folha me fez ver mais TV - como se eu visse pouca antes. Tenho descoberto muitas séries novas, e algumas realmente valem a pena. Como as três sitcoms de que eu falo neste post, já citadas por mim no jornal e todas  protagonizadas por mulheres complicadas. A que mais se aproxima do modelo tradicional, com "one-liners" e piadinhas em todas as cenas, é "Catastrophe", uma parceria entre a irlandesa Sharon Horgan e o americano Rob Delaney criada para o Channel Four e, por aqui, disponível no canal do GNT na plataforma NOW. Os roteiristas também fazem os personagens principais, que se conhecem num bar de Londres, passam uma semana transando e depois vão cada um para seu canto (o dele é em Boston, do outro lado do oceano). Até que ela descobre que está grávida, e ele volta. São três temporadas de apenas seis episódios cada, uma peculiaridade britânica. Por enquanto só vi a primeira, que é um primor. Especialmente o quarto episódio, em que eles suspeitam que o bebê que vem aí pode ter síndrome de Down. Um tema delicadíssimo, que mesmo assim rende risadas e um desenlace magistral. E ainda tem Carrie Fisher fazendo a mãe dele.

Bem mais amarga é "I Love Dick", que tem um ritmo mais solto e cenas que de cômicas não têm nada. É o estilo de Jill Soloway, que fez a badalada "Transparent" também para a Amazon. Aqui a mocinha é uma chata de galochas: uma cineasta fracassada que se muda com o marido para uma cidadezinha do interior do Texas, e fica com a periquita acesa por causa de um escultor local. Ela começa a escrever cartas secretas para seu novo amor, o marido descobre, o cara também descobre, confusão e gargalhadas. Ou não: o tom seco e impiedoso não tem nada a ver com o clima de camaradagem que ainda impera mesmo em séries mais moderninhas, tipo "Girls".

"Better Things" e eu ainda estamos nos conhecendo. Só vi o primeiro episódio, apesar da Fox Premium ter jurado que a primeira temporada completa estaria disponível para seus assinantes (e eu publiquei essa potoca na coluna). Pamela Adlon, discípula de Louis C. K., desenvolveu com seu mestre a história semiautobiográfica de uma atriz que cria sozinha três filhas adolescentes. São todas umas pentelhas, cada uma à sua maneira. Por enquanto, não vi "plot": só o popular "slice of life", sequências soltas que servem para apresentar os personagens. Pamela está indicada ao Emmy, e seu jeito de fazer comédia causa uma certa estranheza no princípio. Mas as críticas são tão boas que eu vou insistir. 

terça-feira, 15 de agosto de 2017

ENVELHECER É BOM

A revista feminina "Allure" é a mais importante publicação americana voltada aos cuidados com a beleza. Por isto, é de se admirar o manifesto que ela publica em seu número atual, com direito a chamada de capa. De agora em diante, a "Allure" vai parar de usar o termo "anti-aging" (anti-envelhecimento). Porque o termo soa como "anti-vírus", como se envelhecer fosse uma doença que precisa ser combatida. Na verdade, é um privilégio, dado que a alternativa seria morrer cedo. A revista vai além: quer evitar frases do tipo "você está linda para sua idade", e conclama a indústria de cosméticos a mudar de linguajar e postura. Já não era sem tempo.

CHERCHEZ LA FEMME

É duro acreditar que, num mercado onde já existem aplicativos de namoro até para cachorro, só agora surja um para meninas que gostam de meninas. O Femme é do Match Group, a mesma empresa que controla o Tinder e dezenas de outros apps. Mas não vai ser gratuito: as interessadas terão que desembolsar, no mínimo, R$ 21,99 por mês. Nada contra; o que realmente me incomodou foi o tom conservador da divulgação, que estressa termos como "relacionamento sério". Já convivi o suficiente com sapatas para saber que elas curtem uma putaria avulsa tanto como a mais promíscua das bichas.

segunda-feira, 14 de agosto de 2017

SIM, VOCÊ É RACISTA

Não é divertido como muitos safados simplesmente ignoram a tecnologia? Cometem crimes em ruas que são monitoradas por câmeras. Roubam celulares que avisam onde eles estão. Participam de manifestações racistas, esquecendo que serão fotografados - e depois, deveria ser óbvio, procurados na internet. É exatamente o que está fazendo a conta do Twitter Yes, You're Racist, que vem identificando vários dos babacas que marcharam em Charlottesville neste fim de semana. Alguns deles já foram até demitidos, bem feito. Talvez devessem ter imitado a Ku Klux Klan e desfilado com capuzes?

A GUERRA DA SEX-ESSÃO


Não vi a primeira versão de "O Estranho que Nós Amamos", estrelada por Clint Eastwood e Geraldine Page. Por isto, não posso dizer se o remake de Sofia Coppola é melhor ou pior do que o original. Só sei que achei o filme escuro demais, arrastado em diversos momentos e com um desenlace mais do que óbvio. Também não entendi algumas coisas: como que sete mulheres atraentes, morando sozinhas bem no front de batalha entre o Norte e o Sul na Guerra da Secessão americana, não eram estupradas por soldados de todos os lados? Como conseguiam sobreviver, se tinham apenas uma horta e uma vaca? O mercadinho mais próximo fazia entregas? Esses detalhes talvez não importem para Sofia, que encena uma batalha dos sexos onde as mulheres saem vitoriosas. Mas, para mim, faltou algo que justificasse o prêmio de melhor direção que ela ganhou em Cannes.

domingo, 13 de agosto de 2017

NOME AOS NAZIS

Recebemos com o leite da mamadeira a noção de que os nazistas foram os piores vilões de todos os tempos. A ideologia racista e violenta que floresceu na Alemanha em meados do século 20 é um saco de pancadas universal, e merece sê-lo. Durante muitas décadas, ninguém se atreveu a defender Hitler em público. Isto começou a mudar nos anos 1990, quando o movimento que nega o Holocausto ganhou visibilidade. Mais recentemente, surgiu na mídia americana a expressão "alt-right",  abreviatura para o que seria a direita alternativa, muito mais irreverente e conectada do que os conservadores de terno e gravata.

Ontem a máscara caiu. "Alt-right" quer dizer neo-nazi, e neo-nazi quer dizer nazista mesmo. Não há nada de jovem ou antenado entre as poucas centenas de rapazes brancos (e pouquíssimas mulheres) que marcharam em Charlotesville, na Virginia, empunhando tochas de jardim, dessas que seguram velas de citronela para afastar os mosquitos. Eles queriam lembrar uma turba atacando o castelo de Frankenstein, mas já viraram piada na internet.

Só que o fato de serem ridículos não os torna inofensivos. Um deles jogou o carro contra uma passeata de "antifas", ou antifascistas - qualquer um que defenda os direitos de negros, mulheres, gays, judeus, etc. etc. Uma pessoa morreu, outras tantas estão gravemente feridas. Também ferido está o presidente Trump, que tentou se safar condenando o ódio "de todos os lados". Mas os próprios nazistas deixam clara sua admiração ao boçal que ocupa a Casa Branca, que não tem culhão para chamá-los pelo que realmente são.

Aqui no Brasil também há quem faça piruetas verbais para se dissociar dessa feiúra toda, acusando o nazismo de ser uma ideologia esquerdista. Não, neném: o nazismo é totalitário, e, na prática, todos os totalitarismos se parecem. Porque, num regime desses, o estado tenta controlar todos os aspectos da vida dos cidadãos. Mas a origem do nazismo e do fascismo é mesmo a direita, que prega a desigualdade entre os seres humanos. É a preponderância do indivíduo sobre a comunidade, um dos pilares da direita, levada ao extremo.

É preciso dar nome aos bois, não pintá-los de outra cor. Nos EUA, a associação está mais clara: foi sob o slogan "Unite the Right" (unir a direita) que se convocaram as manifestações racistas de Charlottesville. Aqui no Brasil, onde falta estudo e decência, há quem caia na empulhação de que o nazismo é de esquerda. Inclusive leitores deste blog, que me mandam longos comentários com links para sites que "provam" essa deturpação. Estou recusando tudo, porque meu blog é a minha ditadura pessoal. Aqui mando eu, e só fala quem eu autorizo. Quer defender suas ideias tortas? Tá cheio de lugar por aí.

UM ADENDO: Para acabar com essa discussão tola de uma vez por todas, sugiro a leitura desse thread no Twitter de um cara que eu nem conheço, o Raphael Harris. É didático, bem escrito, cheio de detalhes históricos e claro como a luz do dia. O nazismo não é "complexo" quanto à sua origem e evolução, como defendem alguns direitistas que eu conheço. É uma aberração da direita, assim como o stalinismo é da esquerda. Lidem com isto.

sábado, 12 de agosto de 2017

ESPUMANTE SELTON


Em seu terceiro longa, Selton Mello elimina qualquer resquício de dúvida: é mesmo um diretor de cinema, não um ator que de vez em quando dirige. "O Filme da Minha Vida" é denso, poético, divertido e bonito - talvez um pouco bonito demais. Cenários e figurinos são tão bem cuidados que às vezes parecem falsos. Como se a história se passasse na Áustria, e não no interior do Rio Grande do Sul na década de 1960. O roteiro também dá uma patinadas lá pela metade, sem ir a lugar nenhum. Mas, de repente, vai, como o trem que abre e fecha o longa. Além do apuro técnico, todos os atores estão bem. Vincent Cassel já sabe falar português, Martha Nowill rouba as cenas em que aparece como uma puta, Johnny Massaro tem "star quality" e o próprio Selton se livra daquele estilo sussurrado de atuar que já tinha virado piada. "O Filme da Minha Vida" é um sério candidato à escolha do Brasil para o próximo Oscar de filme estrangeiro: é bem do jeito que a Academia gosta.

sexta-feira, 11 de agosto de 2017

E A GENTE FAZ UM PAÍS

As letras de Antonio Cícero fizeram parte da trilha sonora do começo da minha vida adulta, na voz da minha ídala de então - sua irmã Marina (na época ela ainda não usava o sobrenome Lima). Mas eu só passei a admirá-lo para valer depois que ele respondeu a um questionário tipo "perfil do consumidor", muito em voga na década de 80 (hoje quem participasse seria acusado de fazer parte da elite branca opressora). Quando perguntado qual seu perfume favorito, o poeta respondeu: "o do meu namorado atual". Aquilo me marcou de um jeito que vocês não fazem ideia. Lá estava uma pessoa pública admitindo, com total nonchalance, a própria homossexualidade. Ontem Antonio Cícero foi eleito para a Academia Brasileira de Letras, onde será - se não me engano - o primeiro imortal assumidamente gay. E o segundo com um pé na cultura pop, depois de Geraldinho Carneiro. Assim, além de marimbondos de fogo, a casa de Machado de Assis agora também tem música, letra e dança.

CORREÇÃO: Comi uma bola colossal ao não citar o Paulo Coelho, que foi imortalizado pela ABL muito antes de Cícero e Geraldinho. Muita gente hoje nem lembra, mas o "mago" foi letrista de Raul Seixas durante muito tempo.

DISTRITÃO FEDERAL

Vai ser difícil a sociedade se mobilizar contra o chamado "distritão". Porque o projeto, que passou raspando pela comissão especial da Câmara para a reforma política, faz todo o sentido à primeira vista. Elegem-se os candidatos ao legislativo que tiverem mais votos e ponto. Com o fim do sistema proporcional, acabam os puxadores de voto à la Tiririca, que arrastam consigo um bando de nulidades em quem ninguém votou. Lembro com carinho da Senhorita Suely, que se tornou vereadora no Rio de Janeiro com pouco mais de 500 votos, só porque concorreu pelo PRONA, o partido do Enéas. Mas o "distritão" não resiste a um exame mais detalhado. Recomendo a leitura deste curto artigo do Bernardo Mello Franco, publicado na Folha de hoje, explicando que o que nos espera é um desastre de proporções afegãs, no qual os mesmos políticos de sempre conseguirão se eternizar no poder. Se mesmo assim você ainda não se convencer, lembre-se: Eduardo Cunha e Michel Temer são a favor do "distritão".

quinta-feira, 10 de agosto de 2017

VELHO CHICO

Chico Buarque deve ser o último artista brasileiro que ainda usa a palavra "cantiga". Mas não é só por isto que ele soa antiquado (e nem pelo apoio acrítico e irrestrito ao PT). Hoje eu li no Huff Post este artigo interessante de Flavia Azevedo, onde ela conta que, junto com algumas amigas, se incomodou com o trecho da letra de "Tua Cantiga" onde Chico diz que larga mulher e filhos pela nova amada. Um homem que abandona os próprios filhos é o terror de qualquer mulher, e mesmo as que fazem o papel da "outra" não querem mais ter este débito em suas contas. "Caravanas", o novo álbum do cantor e compositor, só sai no final deste mês. Vou esperar ouvir tudo antes de dar meu veredicto.

quarta-feira, 9 de agosto de 2017

PRETTY WOMAN

Eu nunca tinha ouvido falar na soprano sul-africana Pretty Yende até ontem de manhã, quando li que ela está se apresentando em São Paulo. Menos de 48 horas depois, estou apaixonado por esta moça de nome delicioso. Seu álbum de estreia, "A Journey", traz árias como "Una Voce Poco Fa", de "O Barbeiro de Sevilha", e outras menos manjadas. Também inclui sua versão para o "Dueto das Flores" de "Lakmé", que a inspirou a estudar canto lírico depois de escutá-lo num comercial da British Airways. Sim, é quase um clichê, mas é belíssimo. Assim como bicha que gosta de ópera. Viens, Malikaaaa...

VOLVERÉ Y SERÉ MILLONES


Há mais de vinte anos, li um livro sensacional do falecido escritor argentino Tomás Eloy Martínez: "Santa Evita", com as peripécias do cadáver da ex-primeira-dama. Embalsamada logo após a morte, a mando de seu viúvo, Eva Perón foi escondida em lugares inusitados - atrás da tela de um cinema, que tal? - e levada para a Espanha e a Itália. Fui ver "Eva Não Dorme" esperando pelo menos parte desta saga rocambolesca (o filme não é baseado no livro). De fato há alguns pontos de contato, mas a pegada do diretor Pablo Agüero é quase impressionista. O longa, na verdade, é um compilado de cenas avulsas com personagens próprios, entremeadas por impressionantes imagens de arquivo. Gael García Bernal só aparece no começo e no fim, e mal abre a boca; o francês Denis Lavant protagoniza uma sequência impactante, mas que parece teatro filmado. Ainda mais teatral é o cativeiro do general Aramburu, sequestrado por guerrilheiros peronistas. Tudo isto para dizer que "Eva Não Dorme" só é recomendado  para quem se interessa pela Evita histórica, muito mais estridente que a vivida por Madonna. É o meu caso.

terça-feira, 8 de agosto de 2017

OVO VIRADO

Não votei no João Doria e não morro de amores por ele. Ainda mais agora, que o prefeito de São Paulo virou BFF do Temer. Mas jogar ovo nele - que venceu uma eleição em primeiro turno, portanto transborda legitimidade - é mais do que ridículo. É contraproducente, pois gerou uma resposta do Doria igualmente ridícula. Estou de saco na lua do "nós contra eles", seja de que lado vier. Me dá vontade de tacar ovo em todo mundo.

MANÁ DO CÉU

Leio por aí que o centrão, o PMDB, o DEM e outros demônios estão tramando a candidatura de Henrique Meirelles à presidência, com Rodrigo Maia como vice. Não duvido da competência técnica do ministro da Fazenda, mas hahahaha, as if. Até parece que o povaréu desinformado vai votar num sujeito sem carisma, que acaba de aumentar o preço da gasolina. E os mais bem pensantes estão todos com hó-rreur de Temer, o Ladrão o Velho, e passarão ao largo de qualquer coisa que cheire a naftalina. Sem falar que Meirelles agora cogita elevar a alíquota máxima do IR para módicos 35%, uma porcentagem digna de país escandinavo com serviços públicos excelentes. Vai precisar chover maná e água de côco para que se eleja o primeiro presidente brasileiro... nascido em Anápolis, Goiás. Pensou que eu ia dizer outra coisa, né?

segunda-feira, 7 de agosto de 2017

BARBEIRAGENS

Houve um tempo em que qualquer comercialzinho mostrando um casal gay era recebido com fanfarra aqui no meu blog. Hoje eles já fazem parte da paisagem - até no Brasil se tornaram mais frequentes. Nem por isto vou deixar de registrar os melhores, como esse filme americano das fraldas Luvs. O interessante é que é só mais um da campanha "Primeiro Filho, Segundo Filho", que a marca já veicula há alguns anos. Ou seja, gay é mesmo o novo normal. Ou está se tornando.

MARIDO NEURÓTICO, ESPOSA NERVOSA


O pessoal reclama que eu vou muito ao cinema mas não gosto de nada. Só que, de vez em quando - muito de vez em quando - aparece um filme que me deixa de quatro. É o caso de "Monsieur e Madame Adelman", que pode ser mal descrito como uma comédia amarga de Woody Allen falada em francês. O bonitão Nicolas Bedos dirigiu, estrelou e ajudou a escrever roteiro e música; só falta ter pau grande. Ele e sua mulher Doria Tillier (também atriz e co-roteirista do filme) se inspiraram em si mesmos para contar uma história de amor que dura 45 anos, com todos os altos e baixos possíveis. A montagem ágil, o uso esperto da trilha sonora e o espantoso trabalho de caracterização são as cerejas de um bolo consistente, onde as risadas se sobrepõem a um relacionamento complexo e crível. "Monsieur e Madame Adelman" deve ser indicado a um monte de prêmios no fim do ano. Mas um ele já levou: conseguiu a rara proeza de não me fazer olhar para o relógio.

domingo, 6 de agosto de 2017

MINA DE OURO

Tem um comercial de operadora que, toda vez que passa na TV, me faz largar tudo e correr para vê-lo. Não estou querendo mudar de plano, nem acho que o filme tenha uma puta ideia. Mas tem uma puta execução, com uma coreografia que me dá vontade de aderir. Esta semana descobri que os (poucos) vocais da trilha são da lendária Mina, monumento vivo do pop italiano. Aí baixei a faixa, e agora ensaio no banheiro. E não, este post não é jabá. Mas quem me dera.

HAPPY LITTLE DAY, JIMMY WENT AWAY


Tanta gente me falou bem de "Em Ritmo de Fuga" que eu me deixei convencer. O filme é quase que um musical para adolescentes que não gostam de musicais, só de filmes de ação. As muitas cenas de perseguição, a pé ou de carro, são sempre embaladas por clássicos do rock e da música negra. A mesma trilha sonora que o protagonista Baby ouve em seus iPods modelo 2002 (aliás, o título original, "Baby Driver", é muito melhor que o brasileiro). Baby é uma fantasia ambulante: guia melhor que o Speed Racer, dança feito um funkeiro das antigas, grava muito do que lhe dizem e depois transforma essas gravações em remixes para as pistas. Ah, e também mora com um velho negro surdo e paralítico, numa das maiores forçações de barra da história da sétima arte. No entanto, mesmo sendo lindo e talentoso, Baby é introvertido e caladão. Não tem namorada, e seu silêncio incomoda os ladrões de banco para quem ele dirige o carro nas fugas. Ou seja: Baby não tem pé nem cabeça, como, aliás, o filme todo. Que não deixa de ser divertido, porque as sequências de ação são mesmo bem dirigidas e o elenco ainda traz Kevin Spacey, Jon Hamm e Jamie Foxx. Sem falar no resgate de "Brighton Rock", uma faixa do Queen que nunca foi um hit, mas que combina com porrada e tiroteio.

sábado, 5 de agosto de 2017

TENTE ESQUECER EM QUE ANO ESTAMOS

"Ai, ai, meu Deus
Mas o que foi que aconteceu
Com a música popular brasileira?"

Rita Lee lançou "Arrombou a Festa" em 1977, metendo o pau em quase todos os medalhões da MPB da época. Dois anos depois, gravou uma nova versão e atualizou a letra. Sobrou para Chico Buarque, Caetano Veloso, Gilberto Gil, Roberto Carlos, Raul Seixas, Martinho da Vila... Todos reverenciados hoje como talentos indiscutíveis. Mas será que Rita já não estava captando no ar a decadência da nossa música? Muitos pesquisadores concordam hoje que o apogeu se deu no começo dos ano 70. Nos primeiros anos daquela década, saíram trabalhos seminais como "Clube da Esquina", os Novos Baianos e os Secos & Molhados. Além da inovação musical, as letras transbordavam qualidade (as dos S&M eram quase todas poesias famosas). E mesmo assim os caras vendiam muito, tocavam nas rádios AM, iam ao programa do Chacrinha e eram conhecidos pelo povão.

Luiz Melodia foi um dos expoentes do período. "Pérola Negra" é uma canção sofisticadíssima, com timbres de jazz e letra isenta de clichês, e ainda assim se transformou num clássico popular. Aliás, toda a obra do cantor e compositor carioca, falecido ontem, é de um refinamento absurdo. No entanto, ele só faturou nos primeiros anos de carreira. Sem se dobrar às regras do mercado, em pouco tempo Melodia foi relegado à categoria cult, onde permaneceu até a morte.

Enquanto isto, as paradas  embregueceram de vez. O "mainstream" da MPB se encolheu num nicho, e os bárbaros transpuseram as muralhas. O resultado é o panorama desolador que vivemos hoje, dominado pelo sertanejo mais rasteiro, com musiquinhas chinfrins recheadas de rimas pobres. Não que eu também não goste de porcaria: adorei "Deu Onda", acho que a bobagem faz parte do pop.

Mas cadê o outro lado? Cadê a garotada com o calibre de um Melodia, um Belchior? Tem gente ótima por aí, eu sei, mas meio escondida. Claro que estou soando velho, reclamando de não me encaixar mais nos tempos que correm. Pode ser. Tentei ouvir Simone e Simaria, não deu. Prefiro música alfabetizada.

sexta-feira, 4 de agosto de 2017

SENTE O DRAMA


De quantas séries dramáticas o cerumano consegue dar conta ao mesmo tempo? No momento eu acompanho três, e não sei dizer qual é a minha preferida. Só a mais badalada: "Ozark", lançada pela Netflix há duas semanas e já saudada como a sucessora de "Breaking Bad". A diferença é que o protagonista Marty Byrde já é corrupto desde o piloto. Jason Bateman, que eu só conhecia de comédias, está ótimo no papel, além de dirigir alguns episódios. De Laura Linney, nem preciso falar nada além de que continua fantástica. Mas para mim a grande revelação é Julia Garner, que faz uma garota white trash que já é um gênio do crime aos 17 anos. Aliás, crime é o que não falta na idílica represa no estado de Missouri onde se desenrola a ação: tem talvez um pouco de bandido demais, mas caso contrário não haveria série. Exageros à parte, "Ozark" é mesmo de prender a respiração.

Também muito tensa, mas em chave mais cerebral, é a minissérie argentina "Jardim de Bronze", que está sendo exibida pela HBO. Faltam apenas dois capítulos para a revelação do que aconteceu com Moira, a menininha sequestrada aos 4 anos de idade e por quem seu pai ainda procura dez anos depois. Algumas mortes são ridiculamente violentas, compensadas pela beleza esguia do ator Joaquín Furriel - não estivessem seus olhos eternamente inquietos. Buenos Aires aparece como um cenário triste e sórdido, e o único personagem com algum senso de humor não sobrevive muito tempo. A melancolia portenha combina com o gênero policial.

As únicas armas presentes em "Quando Fazemos História" são os cassetetes dos homofóbicos e os punhos erguidos dos gays e lésbicas que deram impulso ao movimento LGBT, em São Francisco. A época - a virada da década de 70 para a de 80 - também coincide com o aparecimento da AIDS, o que tornou a luta pelos direitos igualitários ainda mais difícil. O roteiro de Dustin Lance Black se concentra em três figuras principais - um rapaz branco que foge de casa, uma sapatinha politizada e um negro que foi da Marinha - enquanto que estrelas como Whoopi Goldberg ou Rosie O'Donnell surgem em pequenas participações. O engajado diretor Gus Van Sant faz aqui quase que uma continuação do premiado "Milk", contextualizando e ampliando a saga contada naquele filme. Uma minissérie obrigatória para qualquer biba que se preze - especialmente as que acham que as nossas conquistas atuais se devem ao Johnny Hooker.