quarta-feira, 26 de julho de 2017

TEXTÃO MATOGROSSÃO

Perdão se aborreço, mas preciso voltar ao assunto Ney Matogrosso. Já tinha dado por encerrada a mini-treta em que me envolvi com alguns leitores deste blog neste post da semana passada, mas só ontem tomei conhecimento das declarações desastrosas que Johnny Hooker deu sobre um dos maiores ícones brasileiros de todos os tempos. Não, não acho que Ney seja incriticável: nenhum artista está acima do bem e do mal. Mas o que Hooker disse no Facebook é mais um exemplo da arrogância de uma geração que acha que o mundo começou com ela. Também mostra que o pernambucano não é lá muito bom em interpretação de texto - se é que ele leu a já famosa entrevista que Ney deu à Folha até o fim.

Johnny Hooker tomou vergonha na cara e apagou o post. Mas claro que, à essa altura, a internet registrou suas palavras para todo o sempre:

"É inconcebível ler a frase "Que gay o caralho, eu sou um ser humano" no país que mais mata LGBTs do MUNDO (!!).Vinda de um artista cuja carreira em grande parcela se apoiou na bandeira da luta dessa comunidade, de seu próprio público. Um artista genial que perdeu o andar que o mundo tomou, ficou cristalizado, um cânone. O que um dia foi uma das maiores forças libertárias do país hoje se reduz a reproduzir o senso comum do "fora todos". E ainda declara em outra parte "não sou travesti, sou homem, tenho pau e gosto de usá-lo" e só me vêm à cabeça as figuras de Linn da Quebrada e das Bahias, "mulheres de paus", comunicando pro agora e pro depois.  E em tempos de ‘Gay é o caralho’ a única resposta possível é que vai ter gay pra caralho, vai ser gay pra caralho sim, cada dia mais gay, cada dia um level a mais igual Pokémon".

Johnny, QUALQUER lugar onde o Ney esteja vai ter gay pra caralho. Porque Ney já estava rebolando e se assumindo gay muito antes de você nascer. O visual, as letras das músicas, a voz, tudo deixava claríssima a orientação sexual sem que ele precisasse dizer mais nada. Mas ele disse: em 1978, durante o governo Geisel (ou seja, em plena ditadura militar, com a censura bombando), Ney deu uma entrevista histórica à versão brasileira da "Interview", onde se declarava homossexual com todas as letras já na chamada da capa. A revista chegou a ser investigada por incentivar comportamentos desviantes, como se estivesse hoje na Rússia de Putin. Queria muito ver você ter a coragem de fazer o mesmo.

(Em tempo: a foto da "Interview" que ilustra este post foi roubada do Facebook do Mario Mendes, que já colecionava a revista antes de ir trabalhar na própria)

Ney Matogrosso jamais esteve no armário, mas se recusa a ser definido apenas como homossexual. Ele é muito mais do que sua sexualidade - como, aliás, qualquer um de nós. Foi isto o que ele disse à Folha, mas a militância emburrecida que temos hoje achou por bem problematizar um cara que abriu caminhos para ela. Inclusive para Johnny Hooker, que já copiou, inconscientemente ou não, maquiagem e figurinos de Ney. E que também disse nesta entrevista de dois anos atrás que "rejeita rótulos" e que "não existe música gay, existe música de gente".

Encerro este textão com outro, de Nelson Moraes, que já está viralizando:

Estava o Ney Matogrosso em seu camarim, terminando de retocar a maquiagem pro show, quando reparou que o reflexo no espelho apresentava, como direi, movimentos milimetricamente atrasados em relação aos dele próprio. Observou melhor, fez mais alguns gestos, e notou que o gap entre o que ele fazia e o que o reflexo mostrava devagarinho ia se ampliando, até chegar a algo como dois ou três segundos de atraso, o suficiente pra imagem no espelho se configurar como independente. Por fim o Ney sacudiu a cabeça e o reflexo não fez nada, só ficou olhando.
– Você é quem mesmo? – perguntou o Ney.
– Acho que não fomos apresentados – disse o reflexo, saboreando os primeiros respiros de vida própria. – Eu sempre me espelhei em você.
– Reparei – disse o Ney, olhando pro relógio do camarim.
– Você sempre foi um modelo que...
– Escuta – o Ney falou –, o show começa em um minuto. Você podia ir direto ao assunto?
– Claro. Aquilo que você disse.
– O que eu disse?
– “Que gay o caralho. Eu sou um ser humano.”
– Sim. E…?
– Olha – e aqui o reflexo tentou uma leve sacudida de cabeça, como se o atraso na imitação mostrasse que ele é quem ditava o ritmo. – Você tem que pedir desculpas por aquela frase. Pegou muito mal, e nós, que transgredimos a…
– Sabe qual é o problema do mundo? – falou o Ney, já se levantando.
– Não.
– Reflexo que não tem espelho em casa. Te enxerga.

35 comentários:

  1. De dramas imaginários vive a internet. E o ser humano.

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  2. Tony, é o que você comentou em outro post, a moda é o ativismo!! Os publicitários vendem atitude e colocam os bestas para brigarem,lembra do Falabella com o Sexo e as Negas? O tanto de negro ofendido? Nem repararam o quanto de negro a série empregou. O problema das novinhas é que se hoje elas beijam no shopping, nas ruas, na balada hétero, elas devem isso aos Neys, aos Lampiões, aos Trevisans aos Dzicroquetes que vieram primeiro.

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    1. 13:17, pérolas aos porcos!! elas querem descer até o chão.

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    2. Cuidado vão te arregaçar como Velha Podre e os demais adjetivos que as "Dorian" acreditam ofender. Sendo que as estúpidas nem supõe Dorian...ou gritam pedindo um intérprete de texto.

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    3. O mio babbino caro
      Esse carinha deve ter vislumbrado a oportunidade de + 15 min. Ainda bem que foi ele, se é o Lininker a essa hora já estaria linchado como preto. Apenas acredito que não dá para jogar toda a militância numa vala comum, e viva "T-Q-I-L-A".

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    4. 13:17 Oras bolas por que os negros não poderiam ficar ofendidos com o que entendem que o ofendem. Empregue negros na dramaturgia geral não no gueto. Cada um sabe onde o calo dói. São situações distintas desta. Ninguém aqui é tonto, corra os olhos nos dramas televisivos "#só white". Teriam que rever isso enquanto ainda há tempo, tem um pessoal aí que já está sem paciência.

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    5. Metade da população brasileira é parda ou preta. Mas ainda é "normal" termos programas com convidados brancos apenas. Enquanto as pessoas não perceberem o absurdo que é ter uma mesa redonda só com brancos, vai ser difícil discutir. Liguem a CNN ou a Fox News ou qualquer outro canal americano e percebam que nunca falta diversidade, ainda que o percentual de negros nos EUA seja muito menor.

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    6. Mas isso aqui é Brasil!!!! Somente vão se tocar quando... você sabe quando né.

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    7. João, com todo respeito, mas acho complicadíssimo sequer tentar comparar tanto a questão de etnia entre Brasil e EUA, assim como todas as questões que vem a tiracolo, como sociais, econômicas etc. Sao dois mundos muito distintos e complexos.

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    8. 21"41 Lá vem as relativizações, para que continue tudo da forma como sempre foi, mas é só mais canalha útil, para ser bonzinho.

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    9. Anônimo, 21:41h, os EUA tiveram efetivamente uma segregação oficial e esse é o argumento utilizado pelos negadores do racismo no Brasil. Contudo, relativismo cultural é um obstáculo, não uma solução. Pessoas são sempre comparáveis e medidas tomadas num país podem, sim, ser aplicadas em outro. Fato é: quantas pessoas negras (leia-se pretas ou pardas, utilizando a terminologia do Censo) você vê na TV e quantas você vê na rua? No Rio de Janeiro, cidade preta e parda, isso é ainda mais gritante e, curiosamente, é onde boa parte da produção audiovisual do Brasil é produzida.

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    10. E dá para mostrar elefante para quem não quer ver...

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  3. Quem acha que inventa a roda jamais será criador de nada e quem sabe que nada o limita e que nada se inventa voa na frente, sem soberbas pobres ou enganos toscos.
    é isso aí Tony, adoro!!!!

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  4. Nossa que barraco. A velhinha Ney versus novinha Hooker. Ambas querendo IBOPE encima da causa LGBT.

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    1. O Ney tava querendo Ibope não. A Folha é que o procurou, para entrevistá-lo por causa da homenagem que ele recebeu no Prêmio da Música Brasileira.

      Já o Hooker está lançando disco novo esta semana...

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  5. Ney rainha, Hooker nadinha

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  6. Joao Hooker indo no caminho das Pretas Gils da vida, uma carreira de polêmicas e nenhuma música que valha a pena ou seja remarkable. São os subartistas, primos ricos das subcelebridades.

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  7. Até gosto do Hooker... mas foi desinfeliz essa postura... isso se aprende amadurecendo, não tem jeito...

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    1. Isso, passa a mão na cabecinha da criança, toda paciência e tolerância afinal a vida é boa.

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  8. Fico tão feliz que FINALMENTE a bicharada está se dando conta do horror que se tornou a militância lgbtqiuaxyzocaralho... \o/ Qualquer pessoa minimamente inteligente já se deu conta que esse povo quer mesmo é faturar com polêmicas infundadas e mentiras estatísticas ("país com mais crimes homofóbicos" é o meu peru de chapéu).

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    1. 02:28 Bom argumento para desfrutar de conquistas suadas, sem levantar uma palha. Também pode ser chamado de parasita.

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    2. Conquista suada hahahahahaha
      Conta aí onde vc já suou pela causa. Não serve sauna.

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    3. 15:46 Não seja mais ridículo do que já conseguiu ser.

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  9. Pelo visto o Hooker é do tipo que só lê a manchete e já sai metendo textão. Esse novo mundo de especialistas em tudo.

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  10. Parem de problematizar e polemizar as coisas. A gente entende oq o ney disse e tb entende oq o jhonny disse. Semeie amor e menos disse me disse. Bjs

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  11. "...Não, não acho que Ney seja incriticável: nenhum artista está acima do bem e do mal." Você também está achando isso de Bibi Ferreira e Sílvio Santos? Eles não eram acima do bem e do mal?

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    1. Vá reler o meu post sobre a Bibi Ferreira, que eu me explico lá. Se você AINDA não entender, o problema não é meu.

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  12. Você pegaria o Ney Matogrosso? (Eu pegaria, mas só naquela época dele novinho nos secos e molhados).

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    1. (Dyrce fofoqueira) Vo conta tudo pro seu marido
      num é assim tem que ter quimica

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  13. A entrevista do Ney é ótima, muito lúcido. Concordo com absolutamente tudo que foi dito, mas deve ter faltado interpretação de texto aquele outro...

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