domingo, 31 de maio de 2015

GAL CONVENCIONAL

"Estratosférica", o novo álbum da Gal Costa, já é um dos melhores discos brasileiros do ano. Depois de quase quatro anos sem gravar, nossa grande cantora volta com um repertório quase todo composto por inéditas, e assinado pela fina flor da MPB atual. Tem canções de veteranos como Tom Zé e de novatas como Mallu Magalhães; tem ritmos diversos, produção esmerada e a afinação de sempre, apesar da voz de Gal não ser mais o cristal da juventude. E mesmo com tantas qualidades, eu fiquei um pouco decepcionado. Porque, depois do "Recanto" de 2011, este novo trabalho é um passinho atrás. Aquele disco era eletrônico e radical, só com músicas de Caetano e arranjos pós-tudo. Dividiu opiniões, mas eu adorei. Agora Gal está de novo nos trilhos, e na verdade essa é uma constante de sua carreira. Ela sempre se diviviu entre a experimentação sem concessões e a tradição combinada com o comercial. Aqui não há hits apelativos como "Chuva de Prata", e é nítida a vontade de continuar antenada com os tempos que correm. Gal conseguiu, mas eu gosto ainda mais quando ela quando ela manda tudo às favas e joga a música brasileira pra frente.

A SAGRADA FAMÍLIA

Faz 50 anos que essa família LGBT ostenta sua LGBTzice na nossa cara, e só esta semana que eu me dei conta. A teoria nem é nova e tem até página no Facebook, que há tempos não é atualizada. Sim, amiguinhos: o burro aqui finalmente percebeu o óbvio mais do que ululante. O dr. Benton Quest vive uma união homoafetiva com Roger “Banner” Bannon. Jonny é seu filho biológico, fruto de uma relação anterior - quem sabe uma mãe de aluguel? A sra. Quest jamais foi citada em nenhum episódio da série. E o Hadji, olha só que pós-moderno, é o filho adotado vindo de outra cultura e etnia, muito antes da Angelina ter lançado a moda. Os quatro não só vivem em perfeita harmonia como ainda livram o mundo de ameaças como robôs gigantes e pterodátilos redivivos. Mais um argumento para esfregarmos na cara dos homofóbicos que insistem que toda criança precisa de um pai e de uma mãe, nem que o pai seja o Belo e a mãe, a Gracyanne.

sábado, 30 de maio de 2015

O HOMEM QUE FILMAVA DE MENOS

O caso verídico que inspirou "O Homem que Elas Amavam Demais" causou tanta repercussão na França que o trailer do filme já entrega o final. Mesmo assim, me deixei seduzir pela ideia de um filme policial ambientado na Côte d'Azur, nos anos 70. Ainda por cima estrelado pela mãe de todas as divas, Catherine Deneuve, e a estrelinha do momento, Adèle Haënel (que é lésbica na vida real - desculpe, não resisti ao momento secador). Mas eu me arrependi... O roteiro anda em círculos, e nunca deixa claro porque uma moça rica e aparentemente bem resolvida se volta contra a mãe num momento de crise financeira, piorando muito a situação de todos - especialmente a dela própria. O veterano diretor André Téchiné é muito badalado por lá, mas nunca fez um filme de que eu realmente gostasse. Vai continuar me devendo.

sexta-feira, 29 de maio de 2015

EAT THE RICH

Quando eu era pequeno, programa de paulistano era ir ao terraço do aeroporto ver avião subir e descer. Hoje é entrar numa fila do Eataly. O gigantesco supermercado de comida italiana (mas não só) abriu faz dez dias, e parece que não existe mais nada para fazer em São Paulo. Já existem relatos de gente que esperou três horas por uma mesa num dos vários restaurantes que existem lá dentro. Hoje tomei coragem e fui enfrentar a fera. Não era nem meio-dia, e já havia confusão para entrar no estacionamento. Consegui lugar fácil no Piazza, que só depois eu percebi que está mais para bar, mas em poucos minutos havia um enxame ao meu redor. A comida é boa, os preços não são absurdos (o que não quer dizer que sejam baratos) e, ó glória, tomei chinotto, um refrigerante amarguinho que é típico da Itália. Também aproveitei pra fazer umas comprinhas.

A bem da verdade, o Eataly é menos glamuroso do que eu esperava.O fato é que ainda não está totalmente pronto; tenho até a sensação de que foi inagugurado às pressas. Mas também é importante lembrar que, no exterior, o Eataly não é um lugar "premium". Oferece produtos de qualidade, mas a proposta não é elitista. Como no Brasil a gravidade funciona ao contrário, virou um templo de gastronomia sofisiticada. Daqui a pouco vai ter nego criticando tanta "ostentação".

quinta-feira, 28 de maio de 2015

RODÍZIO À BRASILEIRA

A reeleição é tabu em muitos países da América Latina. Não existe, por exemplo, no México, no Chile, no Peru e no Uruguai. A razão é simples: evitar que a mesma pessoa se eternize no poder, se reelegendo sucessivamente (como era o sonho do falecido Hugo Chávez). O Brasil adotou um sistema parecido com o dos Estados Unidos, que permite uma única reeleição do presidente - quanto aos governadores, cada estado americano tem suas próprias regras. Lá a tradição é que o sujeito se aposente depois de seus dois termos, apesar de não ser lei. Mas por aqui parece que a reeleição já era. Achei surpreendente o placar de 452 a 19, o que mostra que todos os partidos estão contra ela. Inclusive o PSDB, que a introduziu nos anos 90, e o PT, que tanto se beneficiou dela. Pessoalmente, acho bom este modelo que está sendo engavetado. E desconfio de qualquer coisa aprovada pelo nosso atual Legislativo, que me parece tão podre quanto a diretoria da FIFA.

TABLEAUX VIVANTS

Existem 25 mil maneiras de se fazer cinema, e acho que o diretor sueco Roy Andresson inventou mais uma. Seu filme "Um Pombo Pousou num Galho Refletindo sobre a Existência" é tão esquisito quanto o título sugere. São 39 vinhetas com a câmera sempre parada e apenas um fiapo de história: dois patéticos vendedores de "novidades", como dentes de vampiro ou sacos de risadas. Alguns desses quadros são engraçados, poéticos ou intrigantes, como o em que um rei do passado invade um bar moderno com todo seu séquito militar. Outros são francamente chatos, para não dizer pretensiosos. "Um Pombo..." venceu o festival de Veneza do ano passado e vem arrancando elogios da crítica. Mas só posso recomendar para quem realmente estiver interessado em ampliar a própria cultura cinematográfica.

quarta-feira, 27 de maio de 2015

PENALIDADE MÁXIMA

Quem diria, hein? Justo os Estados Unidos, um país onde o futebol nunca foi dos esportes mais populares, estão por trás da prisão dos cartolas da FIFA hoje cedo em Zurique. Ou talvez por isto mesmo que esa prisão tenha acontecido: sem desfrutar de ligações intestinais com o governo americano, a quadrilha comandada por Sepp Blatter se revelou surpreendentemente vulnerável. Agora José Maria Marín e seus comparsas terão que lidar não com a justiça de seus países, tão cheias de recursos e juízes amigões, mas com o FBI. Mas como é que fica a provável reeleição de Blatter nesta sexta? E as Copas da Rússia e do Qatar, vão mesmo acontecer? Não sou ligado em futebol, mas este jogo promete fortes emoções.

WISHFUL THINKING

É de se lamentar que a Câmara de Deputados tenha mantido tudo exatamente como está e ignorado todas as propostas de reforma política que foram ao plenário. Incrível a nossa incapacidade crônica de andar para a frente. Por outro lado, merece comemoração a dupla derrota de Eduardo Cunha. Não passaram nem o "distritão", nem a emenda constitucional que permite o financiamento particular das campanhas, duas bandeiras absurdas empunhadas pelo presidente da Câmara. Some-se a isto as evidências cada vez mais fortes do envolvimento dele com propinas reveladas pela Lava-Jato, e minh'alma não consegue reprimir uma esperança risonha: será que estamos assistindo ao começo da derrocada do inimigo público no. 1 do Brasil? Pensamento positivo aí, gente!

terça-feira, 26 de maio de 2015

TODA FORMA DE AMOR

Quando eu vi o comercial do Boticário para o Dia dos Namorados, pensei cá comigo: legal, bacana, que bom que cada vez mais empresas admitem que os gays existem (e que podem faturar com eles!). Mas também fiquei com medo que esse anúncio fosse apenas para a internet, como muitos outros gay-friendly produzidos por marcas brasileiras. Não desmereço o esforço, mas aí é mole posar de moderno, né? Mas temi em vão: o filme será veiculado na TV aberta, no intervalo da novela e tudo o mais. Parabéns ao Boticário e a todos os envolvidos.

FAZENDO NAS CALÇAS

Quem acha que todo musical da Broadway é exuberante e conformista vai levar um choque com "Urinal". A bem da verdade, o espetáculo nasceu na Off-Broadway: o circuito de teatrinhos alternativos de Nova York, onde a experimentação e a irreverência dão o tom. Mas o sucesso foi tão grande que a montagem logo foi transferida para um teatrão perto do Times Square, o epicentro planetário dos musicais. Foi lá que eu o assisti, em 2002. Gostei, mas gostei muito mais da versão brasileira que está em cartaz em São Paulo. Talvez porque "Urinal" tenha voltado às origens: o Teatro do Núcleo Experimental, na Barra Funda, é minúsculo, e combina muito bem com a proposta da peça. Aqui não há cenários deslumbrantes nem figurinos luxusosos, e muito menos efeitos especiais. Mas há um elenco excepcional e um libreto extremamente atual. Porque "Urinal" fala de um problema que estamos vivendo, a falta d'água. Num futuro com cara de anos 30, a água anda tão escassa que não existem mais banheiros particulares. Todo mundo precisa fazer suas necessidades em toaletes públicos e pagos, controlados por uma cruel corporação. Além disso, é proibido mijar na rua: quem for pego no flagra será despachado para um vago inferno chamado Urinal. No meio disso tudo há um romance à la Romeu e Julieta e números musicais bastante inventivos. Como se não bastasse, o final subverte todas as expectativas, e mais não posso contar. "Urinal" fica em cartaz até 3 de julho, a entrada inteira custa apenas 40 reais e as sessões de sexta têm entrada franca.

segunda-feira, 25 de maio de 2015

NAVALHA NA CARNE

Se até hoje a vida não tá fácil pra mulherada, imagina na segunda metade do século 19. Foi nessa época que grandes autores criaram protagonistas inesquecíveis. Todas pularam a cerca; todas encontraram o mesmíssimo fim, e pare de ler agora se você não quiser mais spoilers. Foi assistindo à nova versão para o cinema de "Senhorita Julia", a peça clássica de August Strindberg, que eu me dei conta que a moça termina como suas contemporâneas Anna Karenina e Madame Bovary. Rebatizada de "Miss Julie" e transferida para a Iranda, esta adaptação dirigda por Liv Ullmann é pouco mais do que teatro filmado. Com a ajuda de pouquíssima música e apenas três atores em cena, o texto acaba se tornando enfadonho quando deveria eletrizar. Interessante mesmo foi pensar porque todos esses escritores "suicidaram" suas mocinhas. Desenlace dramático inevitável, crítica à sociedade machista à la "Thelma & Louise" ou - gasp - ou nenhum deles sabia lidar de outro jeito com a sexualidade feminina?

RASTAFARIAN TARGARYEN

Este vídeo está na rede há alguns dias, mas só hoje eu consegui vê-lo inteiro. Quem for escravo de "Game of Thrones" não deve perder: trata-se de uma paródia elaborada para o programa beneficente Red Nose Day, uma espécie de Teleton do humor. Mas será que essa galhofa conseguirá calar o pessoal que ainda está reclamando do estupro de Sansa no episódio da semana passada? Aquilo é ficção, people! Estão armando para ela se vingar! E ninguém reclamou quando Ramsay Bolton caçou a flechadas uma de suas namoradas...

domingo, 24 de maio de 2015

OITO OU OITOCENTOS

Hoje o blog completa oito anos de existência, que mais parecem uma eternidade.
Parabéns a vocês que me aturam.

A VOLTA DA GUERRA FRIA


Como faço desde 2009, ontem passei a tarde plantado em frente à TV apreciando a grande final de mais um festival Eurovision. A produção fica ainda mais impecável a cada ano que passa. Pirei no jogo de luzes que subiam e desciam sobre o palco, criando a ilusão de uma espiral. E adorei a presença constante de Conchita Wurst, que aproveitou o intervalo para cantar duas cancões de seu álbum recém-lançado. Já quanto as musiquinhas que estavam no páreo...
A minha favorita foi a candidata da Letônia, "Love Injected". Interpretada por Aminata, uma mulata improvável - a máe é russa e o pai é de Burkina Faso, um pequeno país africano - a faixa tem um quê de experimental e lembra um pouco o som da Björk. Ficou em sétimo lugar, atrás da estreante Austrália (que só foi convidada a participar porque estão se comemorando os 60 anos do evento).

Se o repertório concorrente não empolgou, a apuração foi repleta de emoção. Durante muito tempo estava pintando que a homofóbica Rússia iria ganhar - e, heresia máxima, levar esse Super Bowl das bichas para a Estrela da Morte Moscou no ano que vem. Um amigo meu inflitrado no Wiener Stadthalle me mandou essa foto incrível: a bicharada da plateia empunhou seus celulares sintonizados no Grind'r em sinal de protesto, quando Polina Gagarina cantou a melosa "A Million Voices". Mas no final o Bem triunfou.

O bem bonito Måns Zelmerlöw, quero dizer. E assim, o Eurovision mais uma vez toma o rumo da Suécia, a maior usina de hits da Europa. Desde os tempos do ABBA, os compositores de lá escrevem sucessos por encomenda para o mundo inteiro. Seus clientes incluem tanto divas como Britney Spears quanto rivais no Eurovision como o Azerbaijão, que há anos terceiriza para lá as canções que inscreve no festival. Vitória merecida? "Heroes" não é grande coisa, mas tem refrão pegajoso. Num ano de vas magras, essa até que tá rechonchuda.

sábado, 23 de maio de 2015

A GOLEADA IRLANDESA

Dois a um. No futebol esse placar não é grande coisa, mas na política é. Pesquisas de boca de urna apontam que nada menos que dois em cada três iralndeses votaram pelo "sim" no referendo de ontem, sobre a legalização do casamento gay. Na capital, Dublin, a vitória da igualdade foi ainda mais acachpanate: três a quatro. E isto num país que era quase uma teocracia há pouco mais de vinte anos. A Igreja Católica exercia uma influência desmedida na vida da população. Foi ela quem esteve por trás da campanha pelo "não", que produziu comerciais bastante pesados pregando que crianças precisam de pai e mãe (balela: crianças precisa de amor). Alguns desses anúncios mostravam homossexuais indo contra os próprios interesses, algo que também existe no Brasil. Mas não adiantou: com o apoio de praticamente todos os partidos políticos, o "sim" ganhou com folga. Agora Irlanda é o primeiro país do mundo onde o casamento gay foi aprovado pelo voto popular. Não acho que os direitos de minorias tenham que ser decididos pela maioria, mas essa vitória é histórica.

O DETETIVE AO CONTRÁRIO


A premissa de "O Vendedor de Passados" é super interessante. O protagonista é um expert em criar passados falsos (e críveis) para seus clientes. É uma espécie de detetive particular no sentido oposto: ao invés de procurar alguém para o cliente, ele recria esse próprio cliente com fotos, vídeos e recortes de jornal, tudo lindamente falsificado. E, como no clichê das histórias de detetive, a trama aqui deslancha quando uma loura misteriosa vem lhe bater à porta. Ela também quer um passado, mas não diz por quê. Só exige que seu novo currículo inclua um crime. O filme de Lula Buarque de Holanda vai muito bem até a metade, quando de repente vira um romance complicado entre fornecedor e freguesa. Imagino que o romance do angolano José Eduardo Agualusa seja melhor; não o li. É por isto que saí frustrado, apesar da produção bem-cuidada e dos atores afiados (Alinne Moraes até me curaria). Ficou faltando o final acachapante que a história pedia.

sexta-feira, 22 de maio de 2015

MAGNUM OPUS

Uma causa pode se considerar vitoriosa no momento em que começam a ganhar dinheiro com ela. Pode parecer cinismo, mas é assim que funciona o mundo capitalista onde vivemos. E a propaganda, essa safada, transforma ideais em comércio, mas também tem um papel fundamental para o avanço da sociedade. Ela abraçou o feminismo, está abraçando o casamento igualitário, e começa a se interessar pela transexualidade. Vejam só esta campanha internacional dos picolés Magnum: um produto que é pouco mais do que gordura hidrogenizada com sabor artificial virou um símbolo de libertação, tanto política como sexual. E, mesmo que reclamem os xiitas, isso é bom para todo mundo. Chupemos todos!

(Marta Matui, obrigado pela dica. Você é mesmo uma drag honorária)

BANDEIRA BRANCA, AMOR

Alguns anos atrás, durante uma entrevista para a revista "Bravo", Marco Nanini assumiu que é gay. Não foi uma declaração bombástica: ele apenas deixou escapar que namora homens, como se todo mundo já soubesse (e quase todo mundo sabia mesmo). Alguns sites de fofoca deram destaque, este blog também, e a repercussão foi discreta e positiva. Elogiaram a coragem do ator, quase ninguém criticou e rapidamente passou-se para outro assunto. Esta semana aconteceu algo parecido, mas nem tanto. Luiz Fernando Guimarães - que está promovendo o lançamento de "Acredita na Peruca", sua série no Multishow - contou que é casado há décadas com outro cara, mas que nunca foi de "levantar bandeirinha". Esta expressão mudou tudo: ao invés de louvarem mais um famoso que saiu publicamente do armário, alguns ativistas caíram de pau na suposta acomodação despolitizada do ator. A polêmica rendeu uma matéria interessante no Blogay do Vítor Ângelo, e acabou me atiçando a dar meu pitaco. Claro que eu acho que quanto mais gays se exporem à luz do dia, melhor. E as celebridades têm um papel crucial nessa batalha: se a popular dona Maria souber que o galãzinho de quem ela tanto gosta é bicha, talvez ela não se deixe engabelar pelo pastor que prega o fogo do inferno para os homossexuais. A imensa maioria das pessoas que convive com gays assumidos, no trabalho ou na escola, logo perde o preconceito e passa a defender o nosso lado. Mas daí a exigir que todo gay ou lésbica se torne um militante da causa é um pouco demais. Porque nem todo mundo pode, dependendo de onde vive ou no quê trabalha. Eu tive sorte: nasci num meio bastante liberal, escolhi profissões onde a cobrança heteronormativa é mínima e nunca tive muito a perder ao me assumir. Mas muita gente têm. Especialmente atores: até hoje rola um debate se é crível ou não que um gay faça papel de hétero. Além do mais, a personalidade de cada um influi na militância. Alguns simplesmente não têm saco. São preguiçosos? Egoístas? E quem não é? Acho que não dá para cobrar um comprometimento homogêneo de um segmento que está longe de sê-lo. E ainda tem as diferenças generacionais, o momento de vida e o fascismo latente de alguns militantes, que abraçam causas que lhes parecem sagradas só para cagar regra na cabeça dos outros. Estamos vivendo tempos curiosos na política brasileira, com radicalizações de todos os lados. Isto é bom, porque sempre fomos meio lenientes. Mas o exagero é contraproducente e acaba prejudicando a própria causa. Deixem o Luiz Fernando em paz.

quinta-feira, 21 de maio de 2015

MODERN ADVERTISING

No melhor estilo "Modern Family", a marca de hummus Sabra incluiu um casal gay em seu novo comercial que está sendo veiculado na TV americana,. O mais legal é que esse casal é de verdade: são dois atores casados na vida real. Não gosto de hummus, mas juro que fiquei com vontade de experimentar.

HEEERE'S DAAAVE

O "Late Show" de David Letterman começou a ser exibido no Brasil no distante ano de 1993, logo depois de Madonna ter ido ao programa e causado. A repercussão foi tão grande que o extinto canal pago Superstation adquiriu os direitos para cá, e eu me viciei. Toda noite, às 10, lá estava eu diante da TV. O tempo passou, o mundo mudou, e ontem Letterman fez seu último programa como apresentador. Vou sentir falta das Top 10 Lists (a derradeira foi um arraso, como se pode ver aí em cima), e também do anúncio "Heeere's Daaave" feito pelo bandleader Paul Schaffer no começo de cada programa. Mas Stephen Colbert tem tudo para se dar bem no lugar de Letterman, a partir de setembro. Acho admirável esse traço da cultura americana, do cara saber a hora de parar - e geralmente eles param no auge. Fica a dica para os similares nacionais.

quarta-feira, 20 de maio de 2015

ISSO É QUE É

Ainda reverberando o final de "Mad Men": muita gente achou tão ambíguo quanto o último episódio dos "Sopranos", mas para mim foi claríssimo (expliquei por quê na minha coluna de ontem no F5). Também recomendo a leitura do artigo de Julia Sweig publicado na versão online da "Folha" de hoje. E pego a deixa para postar a versão completa do épico comercial "I'd Like to Teach the World to Sing", que encerrou a série. Esse marco da história da propaganda tem uma história interessante, e eu agradeço ao anônimo que me mandou este link num comentário de outro post. Aquele foi um dos primeiros momentos em que um produto significou mais do que si mesmo. Em miúdos: o anúncio tornou a Coca-Cola mais do que uma bebida refrescante, como ela era vendida até então. Ela virou um fator de união entre as pessoas - cascata pura, mas também a mais pura verdade. Caso contrário não teria feito tanto sucesso, com um jingle que toca até hoje nas nossas cabeças ("isso é que é... Coca-Cola..."). Desde então, surgiram os conceitos de produto. Uma reles batata frita transcende suas qualidade intrínsecas: é algo para comaprtilhar com os amigos. Um remédio para resfriado não alivia os sintomas, mas faz você aproveitar os bons momentos da vida. Essa bulllshitaiada chegou a um ponto de saturação, e hoje a publicidade busca discursos mais diretos para (literalmente) vender seu peixe. Ainda mais porque a paisagem está mudando, e as pessoas de hoje não são mais atingidas por anúncios como as gerações passadas o foram, nos intervalos comerciais ou nos extintos outdoors. Um puta desafio para o pessoal das agências. E um alívio para mim, que aprendi muito neste mundo mas já não faço parte dele.

GOODNIGHT VIENNA


Perdoem insistir no assunto, mas Eurovision me domina, Eurovision me alucina, é hora, é hora, é hora, é hora do Eurovision. E é só uma vez por ano, gentem! Ontem rolou a primeira semi-final em Viena, e claro que Conchita Wurst fez as honras da casa e cantou logo de cara sua música campeã do ano passado, "Rise Like a Phoenix". Aproveito para dizer que o álbum de estreia dela é melhor do que eu esperava. Tem muito hino de autoajuda pras bibas inexperientes, mas também tem letras engraçadas e até um hit para as pishtash. Fecha parênteses: as três horas de programa já estão disponíveis no YouTube, mas cadê pachorra para encarar tudo? A seleção de 2015 está über-careta, e a grande novidade do festival - a banda finlandesa formada por deficientes mentais - já foi sumariamente desclassificada. Ou seja, parece que este Eurosivion não vai entrar pra história. Tô nem aí, tô nem aí...

terça-feira, 19 de maio de 2015

A SÍNDROME DO PUNK

Hoje acontece em Viena a primeira semi-final do Eurovision. Entre os candidatos desta rodada está a banda punk finlandesa Pertti Kurikan Nimipäivät, formada por três portadores de síndrome de Down e um autista. Achei que, por causa das deficiências, eles seriam os favoritos, mas as casas de apostas apontam para mais uma vitória da Suécia. Na verdade, é melhor que os caras vençam por causa de sua música (que eu particularmente não gosto), e não por solidariedade ou peninha. Além do mais, esses apostadores erram muito. No ano passado diziam que a Holanda iria vencer. Não foi bem o que aconteceu, né, Conchita?

(O título deste post foi roubado do documentário sobre a banda PKN, que já era conhecida no rock muito antes de participar do festival mais cafona do mundo. Dureza fazer trocadilho com deficiência mental, viu?)

ATUALIZAÇÃO: Contrariando todas as previsões, a banda PKN NÃO foi classificada na semi-final de ontem. Dos 16 concorrentes, 10 passaram para a grande final de sábado - e os finlandeses não estão entre eles. Ô dó...

segunda-feira, 18 de maio de 2015

ODEIO QUANDO ISSO ACONTECE

Todo mundo esperando que o próximo bafão entre divas pop envolvesse Madonna e/ou Lady Gaga, e eis que as duas estão quietinhas nos seus cantos. O arranca-rabo da vez é entre Taylor Swift e Katy Perry: a primeira acaba de lançar o vídeo para "Bad Blood", que funciona como uma declaração de guerra à segunda. Mas o que foi que rolou? No ano passado, a turnê de Taylor pelos EUA estava a todo vapor quando Katy abiscoitou toda a trupe de dançarinos da "frenemy" para sua própria turnê. E a gente achando que bailarino tem na feira...

WE DON'T NEED ANOTHER HERO

Já tem gente falando que "Mad Max: Estrada da Fúria" é o melhor filme do ano até o momento. Não concordo, porque minha idade mental já ultrapassou os 14 anos. Mas não nego que essa releitura do herói pós-apocalíptico dos anos 80 tem lá seus méritos. Não se trata de um "reboot", nem exatamente de uma continuação. A rigor, o personagem nem é mais o mesmo: Mad Max se tornou pouco mais do que uma marca. Porque Tom Hardy não tem o carisma alucinado do jovem Mel Gibson, e aqui ele faz parte de um grupo - deixou de ser um cavaleiro solitário. Sua presença é importante, mas a verdadeira protagonista é a Imperator Furiosa de Charlize Theron. O filme inteiro não passa de uma longa perseguição com duas horas de duração, e tem detalhes que podem ser considerados ridículos ou cool, dependendo do espectador. Como o guitarrista que acompanha as batalhas, ou o fato das esposas do vilão terem todas caras (e corpos) de modelos de passarela. Mas são elas a chave para entender essa nova iteração de "Mad Max". Quando baixa a poeira, a história nada mais é do que um "reboot" da humanidade, com a volta do matriarcado ao poder. Esse viés feminino e feminista é o que torna a mensagem do diretor George Miller revolucionária, pois o herói é pouco mais que um apêndice de um plano maior. Quem diria? Um filme que parece falar apenas com meninos adolescentes no fundo é subversivo.

domingo, 17 de maio de 2015

LUTAR O BOM COMBATE

Luxemburgo está em vias de se tornar a primeira ditadura gay do mundo. Esta semana o pequeno grã-ducado foi manchete no mundo inteiro, porque o primeiro-ministro Xavier Bettel se casou no papel com seu namorado (ele nem foi o primeiro mandatário homossexual a fazer isto enquanto estava no poder: esta honra cabe a Johanna Sigurdardottir, ex-PM da Islândia). Mas o que a mídia não noticiou é que o VICE primeiro-ministro (segundo-ministro?) luxemburguês é biba também. Ou seja: estamos chegando ao poder, um grã-ducado de cada vez! Se bem que no Brasil parece ainda falta muito. Hoje é o Dia Internacional de Combate à Homofobia, e não vi nada além de alguns posts no Facebook para marcar a data (que é celebrada em 17 de maio porque foi neste dia, em 1990, que a homossexualidade deixou de ser considerada doença pela Organização Mundial da Saúde). O que podemos fazer para lutar esse bom combate? Para começar, acho que devemos reforçar a definição da palavra "homofobia". Pastores evangélicos vêm insistindo que homofobia é tão apenas somente a violência física contra os gays. Isso libera quase todo homofóbico para estufar o peito e dizer que não é, tanto que tem até amigos gays. Nananina: QUALQUER pessoa que for contra a plena igualdade de direitos entre gays e héteros é, sim, homofóbica. Claro que há gradações, uns são mais, outros menos. Mas vamos chamar as coisas pelos nomes certos, certo?

sábado, 16 de maio de 2015

HIBERNAÇÃO

"Winter Sleep" foi Palma de Ouro em Cannes no ano passado, mas demorou tanto para estrear por aqui que já está rolando outra edição do festival. Também demora muito para acabar: são nada menos que três horas e dezesseis minutos, quase todos ocupados por diálogos aborrecidos em casas sombrias. Eu estava esperando ver mais das paisagens fantásticas da Capdócia, onde estive faz dois anos, mas o diretor Nuri Bilge Ceylan gosta mesmo é de blábláblá e escuridão. Já disse aqui muitas vezes que não tenho o chip para apreciar este tipo de filme, mas mesmo assim insisto. Quero entender por que são tão premiados, mas não consigo.

DROGAS, TSARNAEV E ROCK'N'ROLL

Sinto uma forte dissonância cognitiva quando vejo Dzohar Tsarnaev, condenado à morte por causa do atentado à maratona de Boston em 2013. O cara tem cabelo grunge, ouve rock e, segundo seus amigos e conhecidos, é um amooooor de pessoa. No entanto, ele e seu irmão Tamerlan, morto pela polícia, mataram duas crianças e uma moça, além de ferir gravemente dezenas de pessoas. Tudo em nome de uma vaga jihad islâmica: não sei muito bem como que qualquer causa avança quando mata gente a esmo. A família Tsarnaev vem da Chechênia, região russa do Cáucaso que passou por uma violenta guerra civil. Que eles se voltem contra o país que os acolheu é só mais um sintoma de fanatismo descerebrado (um pleonasmo?). Agora o rapaz vai recorrer, provavelmente em vão, e passará algum tempo no corredor da morte. Mesmo sendo maior idade (tinha 19 na época do crime), acho brutal condenar alguém tão jovem. Será que ele se radicalizará ainda mais na cadeia? Ou mudará de ideologia e se tornará a mulher de um outro prisioneiro?

sexta-feira, 15 de maio de 2015

DIVA BEESHA PARA ADULTOS


Passei da idade de comprar um álbum inteiro da Britney Spears, e muito. Também não me identifico com os hinos de autoajuda da Katy Perry, nem com os conselhos para adolescentes feios da Lady Gaga. Ao contrário da Miley Cyrus, já descobri minha sexualidade há muito tempo. E mesmo Madonna, que é mais velha do que eu, às vezes envereda por umas letras sobre briguinha com namorado que faça-me o favor. No entanto, eu me recuso a encarnar o clichê da minha idade e migrar para Billie Holiday ou Maria Callas. Gosto de ambas, mas cresci na era da discoteca: ainda quero bailar, mesmo que mentalmente. Mas com quem? Com Róisin Murphy. A ex-vocalista do Moloko vem fazendo uma carreira solo interessante, mais preocupada em experimentar do que em vender zilhões. Em 2014 ela lançou um dos meus trabalhos favoritos do ano: o EP "Mi Senti", só com canções italianas clássicas em arranjos eletrônicos moderninhos. E agora ela volta com "Hairless Toys", seu primeiro álbum completo desde 2008. São só oito faixas, algumas longuíssimas - "Exploitaition", cujo vídeo está aí em cima, aparece numa versão com mais de nove minutos. Mas minha predileta é "Evil Eyes", menos agitada mas ainda sacolejante. É dance music para gente inteligente e de paladar apurado. Ou, em outras palavras, para idosos como o senhor vos fala.

quinta-feira, 14 de maio de 2015

BABANDO EM FRENTE À TV

Adoro filme ou série histórica, mesmo sobre aqueles períodos que já foram retratados à exaustão. Tipo César e Cleópatra, ou Henrique VIII e suas mulheres. Por isto mesmo eu estava ansioso para ver "Wolf Hall" no Netflix. Essa minissérie da BBC é baseada nos best-sellers de Hillary Mantel. A história do rei inglês é contada do ponto de vista de um de seus conselheiros, Thomas Cromwell, e claro que lembra muito a recente "Os Tudors". Mas aqui o monarca está ainda mais bonito, interpretado pelo ruivo-magia Damien Lewis (de "Homeland"). E mesmo assim, com elenco fabuloso e produção de cair o queixo, eu não consegui ficar acordado até o final do primeiro epizzzzzzzzzzz. Dei tanta pescada que precisei assistir de novzzzzzzzzzzzzzzzz. Aí encarei o segundo capítulo, mazzzzzzzzzzzzzzzz. Cheguei a entrar em R.E.M. e a sonhar que eu estava transando com o zzzzzzzzzzzzzzzzz nossa que loucura zzzzzzzzzzzzroincroinc.

CAUSA CERTA, BRIGA ERRADA

Na boa: alguns ativistas negros precisam escolher melhor suas batalhas. No ano passado fizeram um escarcéu por causa de "Sexo e as Negas", um seriado com nada menos que QUATRO protagonistas negras. Este ano, ainda não vi ninguém reclamar de "Chapa Quente". A nova série da Globo se passa em São Gonçalo, uma cidade do Grande Rio com uma enorme proporção de negros na população - e no entanto o elenco é quase todo branco... Hoje saiu a notícia de que o grupo Os Fofos concordou em remover a "blackface" da remontagem de sua premiada peça "A Mulher do Trem". Uma das chefes da gritaria era uma moça do grupo Blogueiras Negras, que vem se notabilizando pela ignorância. Houve um debate aqui em São Paulo anteontem, na data e no lugar (o instituto Itaú Cultural) em que a peça seria exibida. Parece que não adiantou explicarem que o "blackface", considerado racista nos EUA, era uma prática comum no teatro do começo do século passado, que o espetáculo tenta reconstruir em detalhes (sem falar que que um dos atores maquiados é negro mesmo). Claro que eu não faço ideia do que seja sentir o racismo na pele, porque sou branco. Mas também sofro preconceito por ser gay, e sei que de vez em quando também exageramos no politicamente correto. Casos como este me dão vontade de pintar a cara de preto e sair por aí.

quarta-feira, 13 de maio de 2015

VEM NI MIM QUE EU TÔ FACHIN

Não é fácil a vida de candidato de vaga no Supremo. Ainda mais quando o governo está meio jonjo, sem força para impor qualquer nome ao Congresso. Tem até nego dizendo que Luiz Fachin seria um boi de piranha, lançado por Dilma para ser destroçado. Ela então apontaria um nome mais ao seu gosto, então com menos risco de rejeição. Duvideo-dó: a presidenta não tem essa sagacidade política, e Fachin tem tudo para ser mais um juiz amigão que o PT precisa no STF. Por isto mesmo ele penou 12 horas de sabatina na CCJ da Câmara, depois de - fato inédito - ter lançado vídeos nas redes sociais rechaçando acusações absurdas, como a de que seria a favor da poligamia. É neste nível a que chegou nosso debate político? O paranaense ainda meteu pés pelas mãos ao dizer que "não se deve homossexualizar a heterossexualidade", o que não significa absolutamente xongas, mas Marta Suplicy garante que ele é pró-LGBT. Então tá, né?

A VONTADE DE SE SUBMETER

Michel Houellebecq era a capa do "Charlie Hebdo" na semana em que o jornal sofreu um atentado terrorista. A matança atraiu ainda mais atenção para "Submissão", o livro recém-lançado desse famoso escritor francês. Acabou de sair no Brasil pela editora Alfaguara, mas eu li no original parce que je peux. A premissa tem tido muito destaque na mídia: em 2022, uma coalizão formada para evitar a vitória do Front National nas eleições presidenciais da França acaba levando um partido islâmico ao poder. Confesso que eu estava esperando mais política e menos blá-blá-blá sobre a chocha vida pessoal de um professor universitário, o narrador. Mas são muito interessantes as medidas adotadas pelo fictício presidente Ben Abbes. A condução da economia continua a mesma e não há um rompimento com Israel, só uma esfriada nas relações. O que realmente interessa aos muçulmanos é a educação. Além de transformar as universidades públicas em instituições religiosas, eles também querem que as mulheres não tenham mais acesso ao ensino superior. O verdadeiro inimigo são os ateus humanistas, não os cristãos. Também há uma defesa da poligamia que apela para a seleção natural, uma estratégia curiosa - muito muçulmano é tão criacionista como o mais parvo dos evangélicos. "Submissão" está longe de ser uma obra islamofóbica: está mais para uma ficção política light. Mas o verdadeiro tema do livro é a vontade de aderir aos vitoriosos, da qual ninguém está livre.

(Só para quem ainda não sabe: Islã, em árabe, quer dizer submissão)

terça-feira, 12 de maio de 2015

FICA, VAI TER BOLO


Desde que "Friends" terminou, Jennifer Aniston e David Schwimmer foram os únicos do elenco que não tentaram a sorte em novas séries para a TV. Ele investiu na carreira de diretor. Ela foi para o cinema, apesar de fazer participações esporádicas nos programas das zamigues. Depois de algum tempo sem estrelar nenhum filme importante, a eterna Rachel quase foi indicada ao Oscar neste ano. Provavelmente, muito por causa da maneira como aparece em "Cake": mais gorda, mais velha, sem nenhuma maquiagem além de algumas cicatrizes. Mas é verdade que ela está bem como uma deprimida que às vezes consegue transformar sua raiva em ironia, às vezes em desespero. Mas há uma causa concreta para ela se sentir assim, ao contrário da maioria dos depressivos que eu conheço. Portanto, esta causa pode ser superada - e a superação adquire a forma de um bolo de aniversário, que dá título ao filme. "Cake" não é indispensável, mas o bom roteiro e as boas atuações deixam-no um pouco acima da média. Este bolo não solou.

segunda-feira, 11 de maio de 2015

O DIA DAS BURRAS

Agora é oficial: a Zambininha hackeou o Twitter da Luciana Genro. Porque só uma personagem fictícia de humor seria capaz de expelir uma asneira tão monumental como esta com que a Lu nos brindou na véspera do Dia das Mães. A ex-candidata do PSOL parece não saber que nem toda mulher tem vocação para ser mãe, e que o dinheiro não tem xongas a ver com isto. Acaba pagando não só de machista, como também de burra. Não votei nela no ano passado (fui de Eduardo Jorge no primeiro turno), mas lhe tinha simpatia. Só que, depois dessa e da do filho do Alckmin, agora estou ficando com HORROR. Passa, burra, eia, xô.

JOGA PEDRA NA YOANI


"A Viagem de Yoani", um documentário sobre a tumultuada visita ao Brasil da famosa blogueira cubana, não traz nenhuma grande novidade para quem acompanha o noticiário. Mas funciona como uma cápsula do tempo: é quase impensável que manifestações contra a presença de Yoani em nosso país se repetissem hoje em dia com a mesma virulência. Ela esteve entre nós em fevereiro de 2013, pouco antes das manifestações de junho daquele ano - para mim, o marco zero da quebra do encanto da esquerda brasileira. Depois disso vieram as eleições de 2014, o acirramento entre coxinhas e petralhas e o desastroso início do segundo mandato de Dilma. Duvido que atualmente, quando a presidenta enfrenta panelaço até mesmo em eventos privados, Yoani seria recebida com tantas pedradas. Além da quase total desmoralização do petismo, também houve o reatamento diplomático entre Cuba e os Estados Unidos - segundo a moça, uma vitória dos irmãos Castro, mas também um ponto de inflexão crucial na história da ilha. Nada disto desmerece "A Viagem de Yoani": o filme é didático, com uma moderna linguagem visual e ótima trilha sonora, e imparcial até onde dá. Porque é óbvio que quem se dá ao trabalho de seguir a blogueira em suas andanças é bastante simpático a ela. Eu também sou, e acho ridículas as acusações de que ela seria agente da CIA. E se for? E se receber mesmo dinheiro dos ianques? Por acaso a Venezuela e outros governos latino-americanos não dão uma forcinha para Cuba? E o famoso "ouro de Moscou", que era pago a comunistas ao redor do mundo durante a Guerra Fria? O grave seria se Yoani fosse apenas mercenária, sem acreditar em causa alguma. Não é o caso. Tudo o que ela quer é uma sociedade plural, com opções políticas, menos maniqueísta e com acesso livre à internet. Por isto que não pega bem criticá-la no Facebook, que é bloqueado em Cuba. Queda la dica.

"FRIENDS" DA TERCEIRA IDADE


Minha mestra Marta Kauffman sempre diz que "Fiends", sua obra-prima, é sobre aquele período da vida em que nossos amigos se tornam nossa família. A época em que acabamos de sair da faculdade e já deixamos (ainda que mentalmente) a casa dos pais, mas ainda não tomamos tento na vida. Por isto mesmo ela se recusa a produzir uma "reunion" de sua série: não faria sentido juntar novamente Rachel, Joey e os demais, porque eles, agora casados, com filhos e profissões estáveis, não são mais os mesmos de antes. Faz sentido. O curioso é que agora Marta retoma este tema - amigos que se tornam família - na outra ponta da vida. "Grace & Frankie" é sua primeira sitcom desde que "Georgia" flopou três anos atrás, e já está com toda a primeira temporada disponível no Netflix desde sexta passada. Assisti a quatro episódios, e já fui conquistado. Mas aos poucos: não se trata de um "Friends" da terceira idade, apesar do que o trailer sugere. Não há uma sucessão de gargalhadas, inclusive porque este novo seriado foi gravado no estilo "single camera": em estúdio, sem plateia nem claque ("Friends" era "multi camera" e, apesar dela nunca aparecer no vídeo, havia uma plateia assistindo).

O ponto de partida de "Grace & Frankie" não podia ser mais atual. Dois sócios num escritório de advocacia resolvem assumir que são "casos" há mais de 20 anos, abandonando as respectivas esposas para viverem juntos. Elas, que não são exatamente amigas, se veem forçadas a compartilhar a casa de praia que possuem em conjunto, mas onde nunca estavam ao mesmo tempo. E uma espécie de dependência mútua surge entre as duas, ainda que sejam totalmente diferentes. Jane Fonda faz Grace (eu trocaria este nome, por causa de "Will & Grace"), mais convencional; Lily Tomlin é Frankie (que nos EUA pode ser apelido feminino), riponga envelhecida e consumidora de drogas. Ver essas duas atrizes juntas, que são amigas na vida real, é um privilégio. Some-se atores do naipe de Martin Sheen e Sam Waterston, mais o texto da Marta, mais uma produção requintada, e danou-se: passei boa parte do fim de semana com essas "meninas". A segunda temporada já está garantida, e aposto que alguns Emmy também.

domingo, 10 de maio de 2015

O DIA DO PAI

Hoje é Dia das Mães, mas também estou pensando muito no meu pai. Porque faz exatamente dez anos que ele morreu - caraca, como o tempo passa. Parece que foi outro dia que ele começou a se queixar de um resfriado que não passava nunca. Consultou-se com seu médico, que era cardiologista, e o cara só receitou antigripais. Passou mais de um ano sentindo falta de ar, até que foi internado. Morreu em dez dias. Diagnóstico final: fibrose pulmonar, provavelmente incitada pelos muitos anos em que fumou sem parar. Eu até senti um certo alívio egoísta. Tive medo que ele se tornasse um vegetal, requerendo cuidados diuturnos. Tinha 84 anos.

Papai teve uma vida mirabolante. Vindo de uma família classe média da Tijuca, mas muito bonito e refinado, casou-se com uma das moças mais "bem" (e ricas) do Rio de Janeiro. Apenas dois anos depois de ter lutado na FEB, voltou à Europa em grandessíssimo estilo: os sogros acompanharam o jovem casal na lua-de-mel, levando até mesmo um carro no navio. Mas este primeiro casamento não durou. Depois de três filhos e muitas brigas, eles se separaram. Logo em seguida papai conheceu minha mãe, uma paulista 16 anos mais nova. Casaram-se no Uruguai em 1959 - naquela época nem se falava em divórcio no Brasil - e eu nasci um ano depois.

Minha relação com ele sempre foi complicada. Ele não participou muito da minha infância, pois estava sempre viajando a trabalho - às vezes passava meses seguidos no exterior. Só nos aproximamos no final da minha adolescência, quando eu resolvi aceitá-lo como ele era: distante, temperamental, turrão. Nunca lhe contei com todas as letras que eu era gay, e ele também nunca me perguntou. Acho que preferia assim, pois sempre tratou meu marido com simpatia. Nos demos muito bem nos últimos anos de sua vida, mas hoje eu me arrependo de não ter lhe feito mais perguntas. Como foi sua infância? O que eu sei, soube por outros. Até hoje acordo de vez em quando esquecendo que ele se foi, morrendo de vontade de telefonar.

Esses dez anos voaram. Parece que foi ontem que o enterramos. Sua morte pode ter me liberado: não sei se eu teria feito este blog tão assumidamente gay, dois anos depois de sua partida. Mas não guardo ressentimentos, só saudade, e ainda tive a sorte de ouvir que ele se orgulhava de mim, antes de morrer. Estou em paz com ele, e espero que ele também esteja comigo. Até daqui a pouco, papai.

sábado, 9 de maio de 2015

A COBRA NÃO FUMOU


Como é que um filme brasileiro sobre os pracinhas que lutaram na 2a. Guerra Mundial estreia sem nenhum alarde, justo na semana em que se comemoram os 70 anos do final do conflito? "A Estrada 47" foi quase todo rodado na Itália durante o inverno, com produção esmerada e enquadramentos clássicos. Mas, sinto dizer, falta roteiro. A história verídica dos cinco soldados que conseguiram retirar as minas de uma estrada importante para os Aliados é meio genérica: tirando o estranhamento local com relação aos brasileiros, eles poderiam ser de qualquer lugar. Os atores fazem o que podem com seus personagens inexpressivos, e são todos velhos demais para os papéis. Também não há nenhuma contextualização além das fotos de época no começo e no final. Não se fala por que o Brasil entrou na guerra, nem a enorme consequência que ela teve para nós - o fim do Estado Novo. Se Getúlio Vargas não tivesse caído, provavelmente sua ditadura teria durado tanto quanto a de Franco na Espanha, até os anos 70, e nossa história teria sido compeltamente diferente. Mas eu divago. Enfim, já disse aqui no blog que faltava um puta filme sobre a FEB (onde meu pai lutou). Ainda falta. "A Estrada 47" preencheu só um teco dessa lacuna.

DISTRITAMENTE NECESSÁRIO

A eleição na Grã-Bretanha aconteceu no mesmo momento em que o debate sobre o voto distrital esquenta no Brasil. O partido Conservador do primeiro-ministro David Cameron venceu em mais da metade dos distritos do país, garantindo maioria na Câmara dos Comuns e mantendo Cameron no cargo por mais algum tempo. O curioso é que o Ukip, um partido de extrema-direita, teve cerca de 13% dos votos - mas, como venceu em apenas um distrito, terá apenas um representante no parlamento. Acho lindo que esses homofóbicos racistas fiquem longe do poder, mas estou sendo casuísta. Como quase todo mundo que entra nesta discussão: repare que quem defende o voto distrital no Brasil tem a ganhar com ele, e vice-versa. O distrital eliminaria distorções como deputados eleitos com pouquíssimos votos só porque estão numa coligação vitoriosa, e reduziria o número excessivo de partidos que temos hoje. Também criaria uma conexão mais direta, em teoria, do eleitor com seu representante no Congresso. Mas tornaria muito mais difícil a eleição de defensores de minorias ou pautas específicas. Não existe sistema perfeito, e, neste momento, eu tendo a preferir o misto, adotado na Alemanha. Mas estou aberto à discussão. Qual desses tipo de voto descritos aí embaixo parece ser o mais justo para você? Mande ver nos comentários.

sexta-feira, 8 de maio de 2015

DOMÉÉÉSTICA, SEM CARTEIRA ASSINADA

"Quando Meus Pais Não Estão em Casa" é o primeiro filme de Singaoura a estrear no circuito comercial brasileiro. Mas não é exatamente cine-turismo: quem for esperando ver paisagens vai se decepcionar. Porque a história se passa no final dos anos 90, quando a arquitetura de lá era bem diferente de hoje. O diretor Anthony Chen prefere planos fechados nos personagens, e a ação quase nunca sai de um condomínio de classe média muito do sem graça. Mas serve para compararmos a maneira como as empregadas domésticas são tratadas aqui e na Ásia. A moça filipina do filme come na mesa com os patrões, dorme no mesmo quarto de um garoto de dez anos e é chamada de tia por ele. Em "compensação", tem pouquíssimas folgas e precisa fazer bicos como cabeleireira enquanto o moleque está no colégio, para suprir o salário de fome. "Ilo Ilo" (o título original, que até agora eu não sei o que significa) ganhou o Caméra d'Or no festival de Cannes de 2013 (o prêmio para cineastas iniciantes) e foi o indicado por seu país para concorrer ao Oscar daquele ano. Não é imperdível, mas é curto e interessante o suficiente.

O NÓ DA QUESTÃO

Qual é a porcentagem de gays na população? Como contar os gays? Bom, para começo de conversa, defina gay. É a pessoa que sente desejo pelo mesmo sexo? É quem exerce este desejo? Quem se identifica como homossexual? Esta é uma das razões pelas quais os recenseamentos não fazem perguntas sobre orientação sexual, mesmo nos países mais avançados (mas alguns, como o brasileiro, perguntam sobre casamento e união estável entre gays). E se a coisa já é vaga nos lugares onde os homossexuais são considerados cidadãos plenos, imagina onde eles podem ser presos ou enforcados só por serem o que são. Pesquisas apontam para um número baixo, que vai contra o senso comum: pouco mais de 1% da população da Grã-Bretanha, por exemplo, "vive" como gay, ou seja, saiu do armário. Mas o número de bibas e fanchas deve ser bem maior. Eu diria que é alguma coisa entre 5 e 10% - mas, mais uma vez, defina gay. Sexólogos dizem que pelo menos uma entre cinco pessoas tem algum tipo de experiência homossexual ao longo da vida, que pode não passar de um beijo bêbado. Por outro lado, muitas vezes temos a nítida impressão de que o mundo inteiro é gay, só lhe falta oportunidade. De qualquer forma, se somarmos os parentes e os amigos, dá bem mais que a quantidade irrisória apontada por Ziraldo em seu infeliz depoimento na semana passada. Talvez sejamos menos do que imaginamos, mas ainda somos muitos.

quinta-feira, 7 de maio de 2015

CHACRINHA ME DOMINA

Chacrinha me alucina. É hora, é hora, é hora. É hora da buzina. O programa que acaba... e não terminou nunca. Mais de um quarto de século depois de sua morte, Chacrinha continua balançando a pança. O musical que leva o seu nome é a mais completa tradução do que foram seus programas de auditório, talvez a expressão mais autêntica e original da brasilidade da nossa TV. Há momentos do segundo ato em que eu me senti na plateia da "Buzina", da "Discoteca" ou do "Cassino" - apesar dos nomes diferentes (o primeiro tinha calouros, o segundo, astros consagrados, e o terceiro misturava tudo com dois ovos em cima), a bagunça era sempre a mesma. E sempre diferente. Vocês querem bacalhau? Terezinhaaa...

Ontem tive o privilégio de assistir a "Chacrinha, o Musical" na festa dos cinco anos do canal Viva. O evento no Teatro Alfa, em São Paulo, contava com chacretes e sósias do Velho Guerreiro recebendo os convidados, e na plateia estavam ninguém menos que as icônicas Elke Maravilha e Rita Cadillac. Mas o melhor era o espetáculo em si: luxuoso, com figurinos deslumbrantes e um elenco melhor ainda. Só o orçamento para os direitos das músicas (inúmeros grandes sucessos da MPB, até os anos 80) deve ter sido maior que o PIB do Suriname. E reinando sobre tudo está Stepan Nercessian, que foi um pitéuzinho quando jovem mas hoje encarna o barrigudo Abelardo Barbosa à perfeição. Já vi muita gente boa imitando Chacrinha, mas o que Stepan faz em cena vai além: os mínimos gestos, as inflexões de voz, a doideira no palco e a amargura nos bastidores. O texto de Pedro Bial e Rodrigo Nogueira não livra cara da Globo nem do Boni, mas passa ao largo do boato de que o apresentador e seus filhos cobravam jabá dos artistas que queriam se apresentar nos shows que promoviam fora da TV. Não faz mal: a trajetória de um dos nomes mais emblemáticos da nossa cultura do século 20 está lá, e, o mais importante, seu espírito também. Ainda bem que as novas gerações podem conhecê-lo através das reprises do Viva. E poderão ver este musical também, que será exibido em cinco partes pelo mesmo canal, a partir do dia 25, sempre às 23:30. Roda, roda, roda e avisa...

quarta-feira, 6 de maio de 2015

PROTEJA AS LE CREUSET

Este governo incompetente não merece que você arranhe as suas melhores panelas. Baixe agora o aplicativo gratuito iPanelaço e leve seu protesto no bolso!

MINTCHURA

Alguém aí acreditou quando, durante o programa político da noite de ontem, Rui Falcão disse que o PT irá expulsar qualquer membro que for condenado pela Justiça? Não, né? Uai, e por que deveria? O partido não só manteve em seus quadros como ainda fez moções de desagravo a réus do mensalão como José Dirceu e José Genoíno. Também vem descumprindo quase todas as promessas feitas numa das campanhas eleitorais mais mentirosas de todos os tempos. Então nem precisamos discutir. Com mais um desses contratempos me aposento e vou morar na Pavuna.

terça-feira, 5 de maio de 2015

ZUMBIDOS

"Entre Abelhas" é o primeiro longa-metragem com DNA do Porta dos Fundos. O diretor Ian SBF também dirige quase todos os esquetes do grupo, e o elenco encabeçado por Fábio Porchat traz vários outros atores que despontaram com o Porta. Mas quem for ao cinema esperando rolar de rir vai se decepcionar. O ponto de partida do roteiro é digno de Woody Allen: um rapaz recém-separado passa a não ver mais as pessoas que o cercam. No começo são estranhos, mas aos poucos seus amigos e parentes também vão sumindo. Uma premissa prenhe de situações cômicas, mas só umas poucas delas chegaram à tela. A pegada de "Entre Abelhas" está mais para o dramático, e lá pelas tantas o filme chega a ficar monocórdico - até que acaba de repente. É uma proposta ousada, e é nítido o esforço de Porchat (também co-autor do roteiro) para não ficar marcado apenas como humorista. Mas dificilmente vai fazer sucesso. E não posso deixar de pensar que, se fosse um filme americano chamado "Among Bees", o distribuidor brasileiro teria mudado o título para algo do tipo "Um Cara Muito Louco".

ELES ESCOLHERAM O AMOR

Estou chorando hectolitros com a campanha de Dia das Mães da Gol, e não só com o comercial do Gilberto, do Rodrigo e do Paulo Henrique. Claro que este é o mais marcante, mas todas as três histórias são emocionantes e pertinentes. Parabéns à companhia, que marcou um verdadeiro gol de placa ao encampar essa bandeira (agora quero ver os fundamentalistas boicotarem-na). Uma única lástima: esta ação histórica está restrita à internet. Merecia ter ido para a TV.

segunda-feira, 4 de maio de 2015

O VELHINHO MALUQUINHO

Não é de hoje que o Ziraldo fala merda. Sua passagem pela Funarte, durante o governo Sarney, ficou marcada pela defesa intrasigente da broa de milho. Há alguns anos, ele atacou a internet, essa bobagem desnecessária. Durante uma visita a Poços de Caldas, o cartunista atacou Fernanda Montenegro por ela ter aceito o papel de uma lésbica na novela "Babilônia", e ainda mostrou que sua cabeça não é muito diferente da dos pastores homofóbicos. Muito triste essas declarações virem do autor de "Flicts", um clássico da literatura infantil brasileira que prega o respeito às diferenças. Ziraldo está velho, e sua opinião, assim como a de Bibi Ferreira (que pegou bem mais leve do que ele), não merece ser levada em conta. São ecos de um passado opressivo, do qual ele parece sentir saudade. A verdadeira maluqice é não se adaptar aos tempos que mudam. A panela na cabeça não deixa que as ideias se arejem.

LISTA DE ENCOMENDAS


Finalmente aconteceu. Diminuí drasticamente a minha aquisição de álbuns, físicos ou não. Passei até mais de umês sem comprar nada, um recorde absoluto. Agora saí do jejum: uma amiga que mora nos EUA veio nos visitar e aproveitei para encomendar umas coisinhas na Amazon (para entregar na casa dela lá, porque aqui leva uns dois anos para chegar). Entre elas está "A Quien Quiera Escuchar", o novo do Ricky Martin. É verdade que o galã boricua nunca gravou um disco inteiro bom na vida, mas este último me pareceu bem mais tímido que o anterior, "Música + Amor + Sexo". Talvez ele não queira correr maiores riscos, agora que é gay assumido. Ricky, mais uma vez, ignora o mercado americano e grava apenas em espanhol - a exceção é "Adiós", com versos em inglês e francês. Nada muito bom, nada muito ruim, a não ser a ótima "Náufrago". Ele continua melhor ao vivo.

Tampouco caí de amores pela dupla canadense Purity Ring, muito badalada no momento. "Another Eternity" é curto e agradável, mas as faixas soam parecidas entre si e demoram a se destacar umas das outras. Levei um tempo para escolher minha favorita: "Bodyache", que não tem bem um vídeo, tem um GIF. É eletrônica light com vocais femininos bem finiiinhos. Se ouvir demais, enjoa. Fora que, nessa categoria etérea, ninguém ainda superou The Xx.

Mas uma das encomendas que minha amiga me trouxe entrou direto na lista dos melhores do ano. "Homage" é o disco que Jimmy Somerville sempre sonhou em gravar, e parece ter sido feito em 1978. Como o título diz, é uma homenagem à música disco, e todas as faixas têm refrões contagiosos, desses que a gente sai cantando logo de cara. O ex-vocalista do lendário Bronksi Beat passou a vida cantando em falsete, e, a essa altura do campeonato, sua voz não está mais cristalina como no tempo de "Smalltown Boy". É até penoso ouvir o esforço que ele faz para atingir as notas mais agudas de "Some Wonder". Mas talvez minha favorita seja a animadérrima "Travesty", onde ele parece mais à vontade. Pena que esta maravilha não tenha vídeo.

domingo, 3 de maio de 2015

SHINE BRIGHT LIKE A DIAMOND


Filmes com protagonistas negros não costumam ir bem de bilheteria no Brasil. Sobre negros na periferia de Paris, então, já viu: uma sala só em São Paulo e olhe lá. Mas a realidade mostrada por "Garotas" não é distante do que se passa nas nossas periferias. Marieme é filha de imigrantes africanos e, apesar de má aluna, é bastante ajuizada. Ajuda a mãe, que está sempre ausente no trabalho, a criar as irmãs menores, servindo de escudo entre elas e o irmão mais velho. Mas, quando repete o mesmo ano na escola pela segunda vez, se vê tão sem perspectivas que acaba entrando para uma turma (para não dizer gangue) de meninas da pesada. Lindas, agressivas, descoladas, elas cometem pequenos furtos para arranjar grana e fazer seu programa predileto: alugar um quarto de hotel para beber e dançar sem serem incomodadas. É numa dessas festinhas que acontece a cena mais icônica do filme, uma coreô de "Diamonds" que deve ter deixado Rihanna orgulhosíssima (confira o clipe aí em cima). Marieme muda o nome para Vic e se torna uma bully, mas seus problemas só estão começando. O roteiro de Céline Sciamma é melhor que sua direção, e "Garotas" seria melhor se fosse mais compacto. Mas é um pequeno diamante que merece ser visto por mais gente.

sábado, 2 de maio de 2015

A EMBAIXADA DE MARTE


Dois anos atrás, comprei ingressos para "Bandália", o espetáculo que marca a volta dos Dzi Croquettes, então em cartaz no Rio. Chegou a hora de ir para o teatro, e onde foi que eu meti os bilhetes? Sumiram. Evaporaram. Passaram para o universo paralelo. Nem tive ânimo de conseguir outros, pois a lotação estava esgotada. E me conformei: perdi os Dzi Croquettes nos anos 70, vou perder de novo. Para sempre. Mas o mundo dá voltas, e eis que ontem um amigo me ofereceu dois convites para vê-los aqui em São Paulo. Lá fomos nós, evitando a imensa fila na porta do João Caetano e mesmo assim pegando lugar só no fundo da plateia, já lotada por convidados.

Só dois dos Croquettes originais participam: Ciro Barcelos, que era o mais novinho da trupe e se mantém espetacular aos 62 anos, e Bayard Tonnelli. Cláudio Tovar fez os figurinos, mas não entra em cena. Os demais são todos jovens, um mais gostoso que o outro. Também são todos exímios bailarinos, o que faz com que "Bandália" seja basicamente um show de dança. Meu marido, que viu a primeira encarnação do grupo, sentiu falta de mais humor e contestação. De fato, lá pelas tantas achei que o objetivo era mostrar um pouquinho de cada estilo coreográfico do planeta: rock, samba, tango, flamenco, funk... Também não ajudou um dos primeiros números, onde eles aparecem "apenas" como homens: parecia show de boys numa buatchy qualquer. Para mim, o cara só vira Dzi Croquette quando é dúbio, misturando purpurina e peito peludo, bigode e cílios postiços. Afinal, eles já faziam isso 40 anos antes de Conchita Wurst. Ainda bem que a maior parte do espetáculo respeita esse cânone. E por isto aos poucos eu fui me rendendo à mistura de revival, novas ideias e história. Ciro, o idealizador, conta muito da trajetória do grupo, e lembra que a casa onde todos moravam em Santa Teresa era conhecida como "embaixada de Marte", onde de certa forma ele habita até hoje ("subi a ladeira e nunca mais desci"). Faz parte do programa o clássico "As Borboletas Também Sangram", ao som de "Assim Falou Zaratustra" - sim, ficou datado, mas é um monumento. Mas meu ponto alto pessoal foi o número do candomblé, onde Iemanjá, Ogum, Oxóssi, Oxum e Iansã encarnam no palco. Saí do teatro contente, porque agora tenho os Croquettes no meu currículo.