quinta-feira, 30 de junho de 2011

DANILO, O GENTIL

Não há argumento mais convincente do que o dinheiro. Ou a falta dele. Quem assistiu à estreia do talk-show "Agora É Tarde" não deve ter reconhecido o apresentador. Danilo Gentili estava simpático, afável, quase comportado. Nada a ver com o repórter inconveniente do "CQC" ou o twitteiro escrotamente incorreto. A razão do bom-mocismo? A falta de patrocinadores. Nenhuma grande marca quis se associar ao rapaz, e olha que as cotas não devem estar caras. O pior é que o programa não é ruim. Com um pouco mais de polimento, pode se tornar numa versão mais jovem e milhares de vezes mais antenada que o do Jô Soares. Claro que ajustes podem ser feitos. Por que duas mesas com "sidekicks", aqueles comparsas espertinhos que são comuns neste gênero? Uma só já seria constrangimento suficiente. Tampouco alguém espera que Danilo se revele um grande entrevistador - os luminares David Letterman e Jay Leno não o são - mas um pouquinho mais de pimenta cairia muito bem. Ontem o curtíssimo papo com Marcelo Adnet pouco superou o encontro casual de dois conhecidos numa festa lotada e poderia ter rendido muito mais. Mas isto foi só o começo. Ainda não é tarde para Danilo perder a gentileza e se tornar uma alternativa interessante para o fim da noite.

O ARMÁRIO DE OBAMA

Em 1996, quando disputou sua primeira eleição, Barack Obama se declarou favorável ao casamento gay - e perdeu. Em 2008, quando concorreu à presidência dos EUA, ele se declarou contra - e ganhou. Agora Obama diz que sua opinião sobre o assunto está "evoluindo", o que, em linguagem clara, significa que ele está em cima do muro. Ou dentro do armário. Ontem Obama perdeu a oportunidade histórica se assumir, durante um evento com líderes de entidades LGBT. Fez um lindo discurso apoiando a luta pelos direitos igualitários e blá-blá-blá, mas uma posição clara sobre o assunto? Nananina. E isto depois do Senado do estado de Nova York ter aprovado o casamento gay na sexta passada. Quando as pesquisas já indicam que mais da metade da população americana apoia a nossa causa. Por que então Obama continua trancado no closet? Provavelmente por medo de perder votos nos cruciais "swing states", que não tem uma definição clara por democratas ou republicanos. Aposto que, se reeleito em 2012, o cara não terá o menor prurido de dizer que sempre foi pró-gay desde criancinha. Mas aí ele não terá mais nada a perder. Culhão mesmo seria declarar este apoio agora. Só que aqui, como em muitos outros temas, Obama prefere manter a dubiedade. Tenta agradar todo mundo e acaba desgradando a todos. O que me deixa ainda mais puto é que ele é fruto de um casamento bi-racial, que era proibido em város estados (não em seu Havaí natal) até meados dos anos 60. Se o presidente Johnson fosse assim titubeante, o jovem Barack seria considerado bastardo em grande parte do país. #FAIL!

quarta-feira, 29 de junho de 2011

HORROR EM TEMPO REAL

Hoje em dia os filmes de terror se dividem em duas grandes categorias. Tem aqueles tipo "Jogos Mortais", que são quase pornográficos na maneira como mostram mutilações. Até tentei uma vez, mas não carrego os genes necessários para apreciar esses opus. O outro tipo teve seu marco zero com "A Bruxa de Blair": são filmes de orçamento baixo que usam algum truque simples para realçar sua suposta veracidade. Dessa vertente vieram "Rec" e "Atividade Paranormal". Acho mais interessante que a primeira, mas faz tempo que não sou mais aluna normalista para me impressionar com essas coisas. Mesmo assim, fui ver "A Casa Muda" pelo simples fato de ser uruguaio. O exibidor brasileiro tirou o "Muda" do título achando que assim atrairia mais público, mas a verdade é que grande parte da ação não tem mesmo nenhum diálogo, com uma única personagem em cena. Nem poderia ser de outra forma: o filme tem apenas um único take, e a protagonista interpretada por Florencia Colucci está o tempo todo em cena. O ponto de partida é clássico de tão óbvio. Uma moça acompanha o pai, que é uma espécie de faz-tudo, à casa abandonada que ele irá limpar e pintar para ser posta à venda. Os dois passam a noite no lugar, e ela é logo despertada por barulhos estranhos. Daí para a frente, muitos sustos, um pouco de sangue e algumas soluções criativas, como o esbarrão acidental numa câmera Polaroid; a foto revelada mostra alguém atrás da mocinha... A ótima música ajuda este tour de force cinematográfico a se tornar memorável. No cinema não tive medo nenhum, mas "A Casa Muda" cumprirá sua missão se for assistido em vídeo, tarde da noite, quando se está sozinho em casa.

TINTIN QUANDO ADULTO

Estava guardando "El Sueño del Celta" para ler nestas minhas férias. O novo livro de Mario Vargas Llosa se passa em grande parte na Amazônia peruana; perfeito, portanto, para se ler durante viagens à Amazônia e ao Peru. Só que o livro é tão bom que provavelmente vou terminá-lo antes de embarcar para Lima neste sábado. Vargas Llosa escreve sem modernices ou pedantismo e agarra o leitor desde a primeira página. Claro que a história baseada em fatos verídicos ajuda muito. Roger Casement é daqueles personagens que, quando for adaptado para o cinema, vai render um Oscar ao ator que o interpretar. Um diplomata irlandês a serviço do Império Britânico no começo do século 20, ele se horrorizou com os maus-tratos a que eram submetidos os nativos do Congo pelos colonizadores belgas e os índios peruanos pelas companhias extrativistas de borracha. Foi agraciado com o título de "sir", só para cair em desgraça pouco depois - quando estourou a 1a. Guerra Mundial, Casement procurou o apoio da Alemanha para a independência da Irlanda e chegou a conseguir armas para os rebeldes. Mas foi preso pelos ingleses e... o fim da história não é segredo, mas não vou contar para não ser chamado mais uma vez de estraga-prazeres. Só adianto que as acusações contra o protagonista pioraram muito quando descobriram seus "Black Diaries", onde ele contava de forma lacônica mas bem explícita os encontros furtivos com cafuçus bem-dotados. Ser homossexual naquela época era crime gravíssimo, e acabou pesando mais do que qualquer coragem ou altruísmo. "O Sonho do Celta" é quase que uma versão para adultos das aventuras de Tintin, pois o personagem é idealista como o jovem repórter de Hergé. E já tenho certeza de que não lerei nada melhor neste ano.

terça-feira, 28 de junho de 2011

BABY-BOI

Agora estou no aeroporto de Brasília, esperando minha conexão para São Paulo. Nosso último dia em Manaus teve um arremate perfeito para este safari visual. Fomos visitar o INPA, o Instituto Nacional de Pesquisas Amazônicas. O melhor é que nossa guia foi Vera da Silva, a maior autoridade brasileira em mamíferos aquáticos e a quem havíamos conhecido em Tefé. Ela nos levou a uns tanques que não são abertos ao público, onde pudemos ver bebês peixe-boi - um deles com um mês de vida, do tamanho de um bebê humano. Claro que eles foram parar lá porque as mães foram mortas. Neste momento o INPA abriga mais de 50 filhotes de peixe-boi. O número aumentou depois que o celular chegou às comunidades ribeirinhas... Esse bicho dócil e lento já foi muito caçado por causa do couro duríssimo, mas hoje é por causa da carne mesmo. É um herbívoro, com parentesco mais próximo a vacas do que a focas. Depois ainda vimos ariranhas, tracajás e até um poraquê, o maior dos peixes elétricos da Amazônia. Fiquei feliz de perceber que ainda lembro os nomes de muitas ordens, gêneros e espécies de animais. Pois é, acho que nunca contei aqui no blog, mas quando eu era pequeno eu queria ser zoólogo.

O RESSURGIMENTO MANAUARA

Estive em Manaus pela primeira vez em janeiro de 1980 e fiquei no mesmíssimo Hotel Tropical que desta vez. O hotel continua o mesmo, apesar de algumas reformas: um casarão-labirinto de corredores intermináveis, o que fez com que o nosso quarto ficasse a uma distância de duas quadras da recepção. A programação visual dos anos 70 lhe dá um certo ar de decadência, mas amigos locais garantiram que não existe nada melhor na cidade. Quer dizer, há dezenas de apart-hotéis e hotéis de negócios, ao lado de dezenas de shoppings, condomínios de luxo e obras ainda não concluídas. O próprio caminho do hotel já entrega. O que era uma estrada no meio do mato há 30 anos é hoje uma espécie de Barra da Tijuca local, com prédios de alto padrão se erguendo às margens do Rio Negro. Está na cara que voltou a correr muita grana por aqui, depois de tantos anos no buraco. Outro sinal dos novos tempos é o Teatro Amazonas. Quando o conheci ele não passava de um museu meio empoeirado. Agora funciona a pleno vapor e está muito melhor conservado. Ontem à tarde fomos visitá-lo e meu marido Oscar conseguiu que fôssemos aos bastidores, ver o palco, os camarins e os urdimentos. É até pequeno para a ópera (uns 600 lugares), mas é simplesmente deslumbrante. Só fico imaginando o frisson que os cantores internacionais sentem de vir se apresentar nesse lugar mítico no meio da selva. Mas é bom lembrar que, apesar de tantas melhorias, Manaus ainda é um lixo em muitos lugares. Feia, caótica e com grande parte da população vivendo em palafitas nas encostas dos igarapés. Ainda bem que o guaraná Baré, menos gasoso e muito mais doce que o que tomamos no Sudeste (apesar de também ser fabricado pela Antarctica) torna a vida mais amena por aqui.

segunda-feira, 27 de junho de 2011

FERVOROSAMENTE BURRA

Como é que uma mulher que foi atriz, que conviveu anos e anos com artistas - e fatalmente com muitos homossexuais - solta uma burrice gigantesca como Myrian Rios, hoje deputada estadual no Rio de Janeiro? Fico tentado a dizer que a religião emburrece. Depois da carreira estagnada e dos casamentos fracassados, Myrian se redescobriu católica fervorosa. Até aí zuzo bem, mas confundir homossexualidade com pedofilia? Até entendo que brucutus como os Bolsonaro façam essa estupidez, mas uma pessoa com a experiência de Myrian tinha que saber melhor. O discurso dela semana passada na Alerj demonstra uma ignorância e um medo imensos, assustadores. Agora está meio mundo caindo de pau nela e outro meio mundo defendendo-a, mas isto nem é um caso de "liberdade de expressão". É burrice, é ignorância, é estupidez. E quem é burro pede a Deus que o mate e ao diabo que o carregue.

SAFARI SILENCIOSO

Agora que estou de novo em Manaus posso contar com luxo de detalhes como foram os três dias no Mamirauá. Aquilo lá não é um parque nacional, é uma reserva de desenvolvimento sustentável. Tem gente morando lá dentro. Mas o Instituto Mamirauá, ligado ao Ministério da Ciência e Tecnologia, quer garantir que esta população melhore sua qualidade de vida sem destruir a floresta. O que nasceu como uma área de proteção para o macaco uacari, que só existe lá, é hoje um projeto de conservação ambiental de repercussão internacional. E a Pousada Uacari serve como fonte de renda. Mas não é um hotel comum. É um "lodge" para ecoturistas, com algo de colégio interno. A guia acorda os hóspedes às seis e meia da manhã. Antes das oito, nessa época de cheia, já estamos em canoas rumo ao interior dos igapós, as matas alagadas. O almoço é servido por volta do meio dia e meia, e não há carne vermelha no cardápio - por razões práticas, não filosóficas. Depois, mais passeio de canoa, e depois do jantar, que sai às sete e meia, é exibido um documentário ou uma palestra com pesquisadores do boto cor de rosa. Às dez e pouco já está todo mundo desmaiado na cama. Só faltou ter chamada oral, né?

São apenas 10 quartos, espalhados por cinco cabanas. Todos têm terraço com rede e banheiro privativo. Com água quente, que eu nem cheguei a usar por causa do calor. Mas não tem ar condicionado nem ventilador de teto: só ventiladorezinhos na cabeceira das camas, que nem ligamos. Dormimos com os mosquiteiros em volta das camas, mas não havia mosquitos dentro do quarto (já lá fora, ao entradecer...). TV? Quáquáquá. Mas também não faz falta, porque a grande atração é mesmo o programa ao vivo do Animal Planet que se desenrola à nossa frente. Vi todos os bichos possíveis, menos a onça, que na cheia vai para lugares mais altos. O resto, todos: do boto cor-de-rosa à cigana, um pássaro tão antigo que lembra o arqueoptérix. A canoa desliza em silêncio pelo igapó e paramos toda vez que o guia desconfia que há algo interessante por perto. Ninguém pode dar um pio, o que só aumenta nossa percepção dos barulhos da floresta. O mais impressionante de todos é o ronco dos guaribas, ou bugios, que lembra um trovão feroz na distância. Há momentos chatos? Sim, tem horas em que não aparece nada. A vida real não é brinquedo da Disney, com os bichos desfilando uns atrás dos outros. Mas é uma experiência única, impressionante e maravilhosa. Saí do Mamirauá com a sensação de ter visitado outro planeta. E com vontade de gritar como os militares da Amazônia se saúdam: "selva!"

INFERNO VERDE

Tem gente que adora estar desconectada. Ontem visitamos, em pleno lago Mamirauá, um "flutuante" que abriga um laboratório de pesquisas. É uma casa sobre as águas, e nem é das menorzinhas: tem quatro quartos, dois banheiros, sala, cozinha, terraço e uma grande área aberta onde se fazem estudos da fauna local. Tem luz elétrica e rádio-amador, e um zelador que fica lá sozinho a maior parte do tempo. E pergunta se o camarada levou ao menos um radinho, para lhe fazer companhia? Que nada, só um violão. "Rádio traz muita notícia ruim. Aqui a gente fica longe do mundo...", explicou ele com um sorriso. Já eu iria enlouquecer no segundo dia. Aliás, quase enlouqueci nesses três dias na Pousada Uacari. Os passeios são lindos, a cama é boa, a comida idem, mas para mim foi uma provação ficar sem checar meus e-mails de 5 em 5 minutos. No sábado até consegui postar no único computador num raio de uns 10 quilômetros. Mas ontem não deu. Quando tentei me conectar logo após o almoço, a tela do monitor estava verde. Verde claro fluorescente, da cor da imagem aí em cima. Não teve jeito. Fiquei um dia inteiro sem postar nada, pela primeira vez desde novembro de 2008. Hoje, chegando a Tefé, corri para o primeiro computador que me passou pela frente. Aceitei um monte de comentários, escrevi este post na vula e agora vamos para o aeroporto embarcar de volta para Manaus. Mas já vou mais sossegado, porque consegui me conectar. E aí, doutor, é grave o meu caso?

sábado, 25 de junho de 2011

THERE'S NOTHING YOU CAN'T DO

Mesmo aqui nas profundezas da selva fiquei sabendo que o estado americano de Nova York aprovou o casamento igualitário, 33 votos a 29 no Senado local. Dado o tamanho da economia e da população novaiorquinas, este é um fato que vai ter repercussão mundial. Mas agora só quero incorprorar a Alicia Keys e bradar a pelos pulmões:

In New York,
Concrete jungle where dreams are made of,
There's nothing you can't do,
Now you're in New York,
These streets will make you feel brand new,
Big lights will inspire you,
Let's hear it for New York, New York, New York

EU VI O UACARI

Serei breve. Não tenho muito tempo no computador da pousada, porque toda eletricidade daqui é produzida por energia solar e o dia de hoje está meio nublado. Chegamos ontem à tarde à Reserva do Mamirauá, a uma hora e vinte minutos de "voadora" de Tefé. Nunca me senti tão longe de tudo, nem mesmo quando fui ao extremo sul da Patagônia. Talvez porque aqui não haja chão. Não nesta época do ano: é tempo de cheia e o sistema de lagos e igapós na confluência dos rios Japurá e Solimões fica totalmente alagado. Toda a pousada é flutuante. E o que se tem para fazer aqui? Passeios de canoa, basicamente. Ontem nos embrenhamos num igapó (floresta encharcada) atrás do bicho-símbolo da região, que só existe nesta área. O uacari parece um designer monkey: enquanto a maioria dos macacos que conhecemos são pretos ou marrons e meio parecidos entre si, ele é inconfundível. Tem um casacão de pelos off-white e uma cabeça careca e vermelha. Vive nas copas mais altas. Penetramos de canoa no iguapó e ficamos no mais absoltuo silêncio. Tivemos sorte, foi o primeiro bicho que vimos (o pessoal de outra canoa, que seguiu um caminho diferente, não viu nada). E também vimos macacos-prego, guaribas, micos-de-cheiro, biguás, gaviões, garças, lagartos e formigueiros nos galhos das árvores, onde a água não chega. A Pousada Uacari em si está longe de ser um resort de luxo mas é confortável o suficiente. Este ano estou mesmo fazendo algo diferente: além de eco-turismo, estou comendo peixe adoidado, algo raro na minha dieta. E estou gostando - o tal do tambaqui é realmente muito bom. Amanhã conto mais, se conseguir acessar a web de novo. E se os uacaris não me pegarem.

sexta-feira, 24 de junho de 2011

VOU NÃO, QUERO NÃO, POSSO NÃO

E de repente caí num país exótico onde tocam músicas desconhecidas - para mim, pelo menos. Parece que dormi muito e quando acordei essa tal de Paula Fernandes foi coroada imperatriz do Brasil. Que rosto lindo, que voz linda, que musiquinhas chatas. Para onde eu viro só dá ela: do táxi que nos levou a Cumbica a todas as "aparelhagens" das bibocas na orla do lago de Tefé. Como o Banzerê, onde fomos ontem, que tem no cardápio sanduíches sofisticados como o Cacetão e o X-Xoxota. Foi lá também que vi praticamente um DVD inteiro dos Aviões do Forró, com participação especial de Ivete Sangalo e uma produção de humilhar a Madonna. Essa banda espertíssima já co-optou o sucesso do momento, "Minha Mulher Não Deixa Não", originalmente na voz de um certo Reginho. E não é que a porra da música é óteeema? Daquelas que grudam no ouvido e só são extirpadas depois de seis horas de cirurgia. Enquanto isto, uma dúvida me assola: azul ou vermelho? Definir para quem você torce no Boi de Parintins é essencial aqui no Amazonas.

quinta-feira, 23 de junho de 2011

BARRADOS NO DAIME, UOU UOU

Pronto, já aconteceu a primeira frustração da viagem. A União do Vegetal de Tefé não permitiu que Oscar e eu participássemos da cerimônia de hoje à noite. Visitamos o lugar à tarde, conversamos com o Mestre e várias outras pessoas e até provamos frutinhas da chacrona, uma das plantas do famoso chá (o outro é o cipó mariri). Se fosse outro dia, teríamos mais sorte. Mas hoje é a festa de São João da comunidade: vai ter fogueira e bandeirinhas, mas nada de quadrilha ou folguedos. E como nunca tomamos antes, não podemos participar. Entendo que cada religião tem suas regras, e quem sou eu para desrespeitá-las. Mas não consigo esconder minha chateação. E não, não é porque sou um junkie doentio que quer experimentar um barato novo. OK, sou um pouco, mas estava realmente curioso pelo lado místico da coisa. Pessoas que já beberam (não se diz "tomar") falam de experiências incríveis; sei de uma que "viu o amor e amizade". Também quero! Claro que posso ir a um centro no Rio ou em São Paulo, mas não é a mesma coisa. Estou aqui, no coração da Amazônia, cercado de pessoas que eu gosto. Ia ser maravilhoso. Vou ter que me acabar no X-Caboclinho.

TER FÉ

Ia chamar este post de "Urubulândia", mas aí fiquei que nem aquele menino da formiguinha: que dó. Tefé é uma cidadezinha simpática, apesar de ter mesmo muito urubu. MUITO. Nunca vi tanto urubu junto. Nos telhados, nas praças, até tomando banho nas poças perto do lago. A explicação é simples. Eles vieram para cá atraídos pelo lixo. E, segundo os locais, há uns anos eram ainda mais numerosos, porque naquela época não havia nenhum tipo de coleta. Depois que a gente abstrai os urubus dá para focar melhor na cidade e perceber que ela de fato não é grande coisa. Jamais teria vindo para cá se a filha do Oscar não morasse aqui, por causa de seu trabalho como bióloga. Ela garante que a cidade está bombando, graças à descoberta de petróleo nas redondezas e muita fé no futuro. Mas até que existem alguns atrativos. Depois de almoçar carne de sol e tambaqui, fomos tomar mergulhar nos igarapés. A primeira parada foi no Banho do Adílson, com bordas de concreto e música altíssima. Um autêntico Piscinão de Ramos em versão amazônica. Depois rodamos um pouco e, passada uma agrovila, chegamos a um igarapé sem nome, de águas escuras e geladas. E assim se cumpriu a profecia enunciada no título do último post de ontem.

JÁ COMEU TUCUMÃ?

Porque nos submetemos à Gol? Faz tempo que essa companhia aérea não cobra mais baratinho, mas o serviço de bordo continua uma merda. Tivemos que encarar 4 horas até Manaus esprimidos no mesmo tipo de avião desconfortável que faz a Ponte Aérea. Sem monitor de vídeo, sem musiquinha, sem revista de bordo. E para comer? Batatinha ondulada e rosquinha de coco. Claro que chegamos com fome ao hotel Tropical à uma e meia da manhã, mas a preguiça de pedir room service foi maior. Compensamos no café da manhã, quando fui reapresentado ao tucumã. Essa frutinha típica do Amazonas tem um sabor suprpreendentemente salgado. Devorei um beiju de tapioca recheado com ela, e depois ainda tracei um X-Caboclinho, o sanduíche típico daqui: pão francês com tucumã e queijo coalho. Depois embarcamos num aviãozinho da Trip, que apesar de ser a hélice proporcionou um voo muito mais agradável que o da véspera. Poltrona larga, café fresquinho e a visão impressionante do arquipélago das Anavilhanas, lascas de floresta no meio do rio. Bem-vindos à Amazônia.

quarta-feira, 22 de junho de 2011

A ÁGUA ESTÁ GELADÍSSIMA

Hoje eu saio de fééérias. Vou ficar 25 dias longe do trabalho, emendando com o feriadão que começa amanhã. Mas o blog só para se eu não conseguir conexão. O que é bem possível, porque logo mais à noite embarco para Manaus, e amanhã de manhã para a palpitante metrópole ribeirinha de Tefé. Na sexta encaro um barco até a Reserva Biológica de Mamirauá, onde trabalha a filha bióloga do meu marido Oscar. Não sei onde falhamos na educação desta garota. Ela tem beleza e altura para ser top model, mas preferiu se especializar em desenvolvimento sustentável, que tal? Enfim, lá vamos nós para a pousada Uacari, onde os quartos ficam em palafitas sobre o rio Solimões. Com mosquiteiro mas sem telefone e, evidentemente, sem wi-fi. A ideia original era emendarmos essa expedição amazônica à uma mil vezes adiada viagem ao Peru. Mas quem disse que é fácil ir para lá de Manaus? São pelo menos oito dias de barco até Iquitos, passando pela agradabilíssima fronteira com a Colômbia. De avião o jeito mais rápido é por Rio Branco, no Acre, de onde saem voos para Lima de uma companhia chamada Star Peru... Preferimos fazer uma escala técnica em SP, inclusive para trocar de mala (faz frio em Machu Picchu nessa época). Bons drink não vão faltar nessas férias: vou trazer mate de coca (marca Délisse, sabor yerbabuena), e lá na selva já estou agendando um Santo Daime. Fui!

GAROTO ETERNO

Como muita gente, eu também achei que o Boy George não tinha mais salvação. Estava certo que a carreira do ex-vocalista do Culture Club não passaria mais de eventuais participações em projetos dos outros, como a recente canja no disco do produtor Mark Ronson, entremeadas de prisões e escândalos. Mas qual: o garoto está de volta à forma, sem nem precisar "atacar de DJ". O CD "Ordinary Alien" só tem faixas longas e dançantes, prontas para encarar uma pista, e quase todas são bem boas. A melhor é mesmo o single "Amazing Grace", que eu só fui conhecer agora apesar de ter saído há mais de um ano. Gosto especialmente da presença da cantora portuguesa Ana Lains, que eu cheguei a confundir com Amália. Agora é torcer para que também estejamos errados com respeito a Amy Winehouse.

LEITURAS DIVERSAS

Atenção, bibas alfabetizadas: não percam o número de junho da "Brasileiros". Aproveitando que é o mês da Parada do Orgulho LGBT em São Paulo, a revista dedica grande parte de sua edição a matérias com e sobre gays, lésbicas, trans, etc. Até o inclassificável Laerte aparece numa longa entrevista a Alex Solnik. Nirlando Beirão relembra uma capa histórica da "IstoÉ" em janeiro de 1978 sobre "O Poder Homossexual" que quase levou toda a redação para a cadeia - os tempos mudaram, ou nem tanto. E meu colega blogueiro Guilherme Lacombe, a/k/a Lourenço Cavalcanti, aparece duas vezes. Primeiro ele assina um perfil do jornalista e agitador cultural Celso Curi, que nos anos 70 lançou a "Coluna do Meio" no jornal "Última Hora", a primeira presença assumidamente gay na grande imprensa. Mais adiante Guilherme conta um pouco de sua própria experiência, num depoimento à la "Não Gosto dos Meninos". Então quem quiser ler neste feriado algo mais elaborado que o roteiro das festas deve correr à banca mais próxima. A "Brasileiros" circula com duas capas diferentes este mês: a outra é sobre as festas juninas, mas o conteúdo é o mesmo. Se joga.

terça-feira, 21 de junho de 2011

DEI AFETO E CARINHO

Estou a-do-ran-do "Insensato Coração", como há muito tempo não gostava de uma novela. Gilberto Braga sempre foi meu autor preferido e, se não superaram a obra-prima que foi "Vale Tudo", ele e Ricardo Linhares conseguiram criar uma trama envolvente e vertiginosa. Uma semana é muito tempo em "Insensato": quem estava solteira na terça passada hoje já pode estar viúva. O ritmo intenso não deixou surgir a célebre "barriga", aquele longo trecho intermediário em que os personagens apenas almoçam e jantam. O melhor é que a história de Norma, a enfermeira vingativa feita por Glória Pires, parece ter sido pensada do começo ao fim, e não escrita ao deus-dará como em outros porgramas por aí. Outro aspecto positivo é a militância pró-gay, com a homofobia sendo discutida no horário nobre e um casal de bofinhos se formando na frente de todo o Brasil. Gilberto não trai a própria classe: afinal, ele e seu marido Edgar Moura Brasil foram o primeiro casal do mesmo sexo a enfeitar as páginas do "Sociedade Brasileira", o mais seleto catálogo de endereços do país (e não o estilista Carlos Tufvesson e o arquiteto André Piva, como foi fartamente noticiado). Mas claro que a novela não é perfeita. Tem personagens demais, uma necessidade para se preencher os quase 90 minutos diários. Tenho a maior preguiça daqueles jovenzinhos todos e seus namoricos bocós. No entanto, o pior mesmo é o par formado por Eriberto Leão e Paola de Oliveira. Ela é bonita e até que manda médio, mas tem uma cafonice intrínseca que não seria removida nem depois de um internato na Socila. E ele é simplesmente um dos piores atores de todos os tempos, daqueles que consegue transformar qualquer cena num desastre de proporções. Quando os dois aparecem na tela, alegria partiu, foi embora...

LA CORREGIDORA

Josefa Ortíz de Domínguez é uma das heroínas da independência do México. Uma mulher de coragem e princípios que apoiou o movimento que libertou o país do jugo espanhol e que, por ser casada com o corregedor da cidade de Querétaro, entrou para a história com o título que dá nome a este post. Hoje a luta pelos direitos igualitários aqui no Brasil também ganhou a sua corregedora, esta por méritos próprios. Beatriz Figueiredo Franco, do Tribunal de Justiça de Goiás, cassou a decisão do juiz que anulou a união estável de um casal gay e ainda quis posar de não-homofóbico. Jerônymo Pedro Villas Boas agora corre o risco de sofrer um processo disciplinar, simplesmente porque descumpriu o que já havia decidido a mais alta corte da nação. Esta é uma pequena vitória para gays, lésbicas e suas famílias, e é justamente em momentos assim que devemos estender a mão para nossos adversários, em sinal de respeito às opiniões contrárias e para manter aberto o diálog... ah, quem que eu penso que engano? VAI TOMAR NO CU, SEU FILHO DA PUTA! GOSTOU DE SER CORRIGIDO? BEM FEITO! TOMARA QUE AGORA O CASSADO SEJA VOCÊ, SEU ESCROTO DOS INFERNOS! Aham. Continuamos agora com a nossa programação habitual.

NINGUÉM QUER SER HOMOFÓBICO

“O Supremo está fora do contexto social, porque o que vemos na sociedade não é aceitação desse tipo de comportamento. Embora eu não discrimine, não há na minha formação qualquer sentimento de discriminação, ainda demandará tempo para isso se tornar norma e valor social”. Essas palavras são do juiz Jeronymo Pedro Villas Boas, aquele que anulou a primeira união estável registrada em Goiás e determinou a todos os cartórios do estado que não registrem mais contratos semelhantes. A decisão é risível e vai ser facilmente derrubada no Supremo, que ainda detém a última palavra sobre o que é ou não constitucional. Mas sem dúvida que é uma manifestação clara do desconforto de amplos setores da sociedade brasileira com a homossexualidade. No entanto, nem mesmo quando respaldado por argumentos supostamente sólidos, legais ou religiosos, esse desconforto assume seu verdadeiro nome: homofobia.

Ninguém quer ser chamado de homofóbico. Num país que teve a História marcada pelos preconceitos, principalmente o racial, ninguém veste de bom grado a carapuça de preconceituoso. Este é o maior defeito que um brasileiro pode ter nos dias de hoje, e todos fogem dele - ou melhor, fogem de seu nome. Mas na prática continuam com as mesmas ideias e atitudes de sempre, agora disfarçadas de "liberdade de expressão" ou "incorreção política".

Nem os mais ferrenhos inimigos dos gays suportam a pecha. Numa marcha evangélica em Brasília, há duas semanas, surgiu a seguinte faixa: "Daqui a pouco vão chamar a Bíblia de homofóbica". Daqui a pouco? A Bíblia SEMPRE foi homofóbica. E machista, escravocrata, racista, incitadora da violência e obcecada por sexo. Praticamente qualquer comportamento pode ser justificado por alguma passagem bíblica. Mesmo quem diz seguir fielmente o que está na Bíblia faz uma leitura seletiva. Mas voltando ao assunto principal: não deixa de ser curioso como padres, pastores, políticos e pessoas comuns correm para se auto-desculpar, ao mesmo em tempo em nos negam direitos iguais. "Não tenho nada contra gays; só não acho certo eles se casarem..." Tem sim, cara. Não existe meia homofobia, assim como não existe meia gravidez. Quem nos acha indignos de um único direito é homofóbico sim, e merece ser apontado na rua.

Palavras são poderosas e precisam ser usadas. Não podemos deixar barato quando um Cheque Bolsonazi vomita barbaridades, ao mesmo tempo em que jura de pés juntos que não está discriminando também. Claro que está. Vamos revidar esse jogo verbal, porque os reaças já não gostam de ser chamados pelo que realmente são. Daqui a pouco vão pensar duas vezes antes de "expressar livremente" suas ideias "politicamente incorretas". E quem sabe, no futuro, mudá-las um pouco.

segunda-feira, 20 de junho de 2011

OR MAYBE COVERED WITH BEES

"Weird Al" Yankovic não é muito conhecido no Brasil, mas lá nos Estados Unidos ele construiu uma carreira com mais de 25 anos só fazendo paródias de músicas pop. Todo mundo já foi satirizado por ele, de Michael Jackson ao Nirvana. Agora ele vem com "Perform This Way", devidamente autorizado por Lady Gaga. Não achei o vídeo dos mais engraçados, mas gostei de duas coisas. Uma é o cameo de Madonna (não a verdadeira, é claro). A outra é o efeito que aplicou o rostinho de "Weird Al" no corpo de uma gostosa. Não ficou parecendo a Ximbica?

POR OUTROS CAMINHOS

Parece consenso geral que a Parada do Orgulho LGBT deste ano, em São Paulo, será menos festiva que das outras vezes. Menos festas, menos DJs internacionais, menos gente vindo de outras cidades e estados. Dos meus amigos cariocas que vinham sempre, nenhum estará aqui: uns estão se poupando para viagens mais longas, outros optaram por programas diferentes. Não sei se é só no meu entorno, mas sinto uma voltagem mais baixa no ar. Vai ver que o feriadão recheado de agitos perdeu o ar de novidade. E o gigantismo da Parada em si atraiu muitos problemas, o que afastou alguns mais assustados da Avenida Paulista.

Por um lado este relativo esvaziamento é uma pena. Acho que pela primeira vez temos conquistas concretas a comemorar. Por outro pode ser bom. A Parada sempre buscou ter caráter político, mas nunca foi muito além de uma maxi-micareta. O tema de 2011 não poderia ser mais pertinente: “Amai-vos uns aos outros”, um confronto direto com as religiões que perseguem os gays. Tomara que esse declínio no teor de oba-oba ajude os participantes a terem mais consciência na cabeça, e não só litros de vinho químico.

O calendário de festas está mais magro, mas de os eventos paralelos nunca foi tão farto. De todos, o mais interessante para mim é o encontro de Blogueiros Gays que acontece no sábado, dia 25, às 4 da tarde, no auditório da FNAC da Paulista. Mas aviso desde já ao meu fã-clube que não estarei presente: este ano, pela primeira vez em muitos, vou viajar no feriado de Corpus Christi. Oscar e eu iremos visitar a filha dele, que é bióloga, na reserva ecológica onde ela trabalha no Amazonas. Estaremos comendo pirarucu enquanto a galera em São Paulo estará comendo outras coisas.

Vou terminar o post dando uma forcinha pros amigos: quem ainda tiver gás no domingo à noite pode se jogar na Babyy Party, que acontece no hotel Cambridge com produção do Tiago Becker e do Aron Cohen. A grande atração é a DJ americana Twisted Dee, que eu já vi várias vezes em ação e é realmente divertidíssima. Mais informações sobre a festa? Clique aqui.

PAREM AS MÁQUINAS:
Recebi uma mensagem do empresário da Twisted Dee informando que a DJ não vem mais para tocar na Babyy Party. Que pena...

domingo, 19 de junho de 2011

A CAIPIRA SOFISTICADA

Há três anos eu desci o pau na k. d. lang aqui no blog, por causa de seu chatíssimo disco "Watershed". Mas o fato é que ela continua sendo a maior cantora branca viva. Seu alcance e domínio vocal fazem Mariahs e Christinas não passarem de feirantes gritadeiras. Por isto não resisti e comprei o novo trabalho de Kathryn Dawn, seu nome verdadeiro e ultra-feminino que ela correu para deixar mais "butch" ao usar apenas as iniciais. "Sing it Loud" foi gravado com um banda country chamadas Siss Boom Bang e perto deles k. d. torna-se mais um dos rapazes. As canções são todas tranquilas, perfeitas para este domingo de sol de inverno que faz em São Paulo - experimente aqui a faixa-título. É música com raízes caipiras mas acabamento elegante, do tipo que vai queimando em fogo lento até ficar pirogravada no cérebro. Mas gosto ainda mais de k.d. quando ela se aventura para fora do universo rural; quem sabe da próxima ve ela volta ao jazz, aos standards ou até mesmo à - ta-daa - dance music?

sábado, 18 de junho de 2011

PARIS É UMA FESTA

"Meia-Noite em Paris" é um filme delicioso, que entraria para a lista dos melhores de Woody Allen se o diretor não tivesse forçado demais o final exageradamente feliz. Ele parece querer compensar a amargura de seu último trabalho, "Você Vai Conhecer o Homem dos Seus Sonhos". Aliás, já faz um tempo que anda alternando filmes pessimistas ("Vicki Cristina Barcelona") com otimistas ("Tudo Pode Dar Certo"). Mas voltando a Paris: realmente o final me incomodou um pouco, assim como a americanice meio jeca de Owen Wilson. Aqui ele é mais um alter ego de Woody, um escritor inseguro e com medo de morrer que está prestes a se casar com uma chata de galochas. Numa viagem pré-lua-de-mel com os pais dela a Paris, ele se deixa seduzir pela cidade (o que não é difícil) e acaba transportado para os anos 20, os tempos da "festa móvel". Aí espectador começa a se sentir cultíssimo, ao reconhecer na tela as celebridades da época: Picasso, Hemingway, Scott Fitzgerald, Josephine Baker. Especialmente bem estão Kathy Bates, como Gerturde Stein, e Adrien Brody, que se diverte muitíssimo recebendo Salvador Dalí. Marion Cotillard também faz com elegância mais uma vez uma mulher misteriosa. Quem está mais ou menos é Carla Bruni, que aparece em rápidas três cenas. Diz a lenda que Woody a queria para o papel que acabou ficando com Marion. A primeira-dama da França, que nunca havia atuado antes, faz pouco mais do que uma ponta. Por baixo de todo o glamour, o filme trata de um tema bem cotidiano: a eterna insatisfação que sentimos no presente e a nostalgia por um passado tão bom que na verdade nunca existiu. A Marta Matui, que foi comigo ao cinema, fez um bom post sobre o assunto. É uma sensação realmente curiosa. Nem quando as coisas estão bem o presente é o tempo em que queremos viver. Nem aqui nem em Paris.

sexta-feira, 17 de junho de 2011

CHAPELEIRAS MALUCAS

Você ainda acha "ridículo" o chapéu que a princesa Beatrice exibiu no casamento do primo? Claro que é, mas também é um digno representante da arte inglesa do millinery. Este adorno que tanta celeuma causou fica tímido quando comparado aos que algumas damas britânicas usaram anteontem nas corridas do "Ladies' Day" no hipódromo de Ascot. Teve até chapéu engajado em causa social, como aquele lá de baixo - que é parte de uma campanha pela conscientização dos riscos da malária (estou falando sério). E sabe o que mais? God save those hats, porque moda também é diversão. Clica aqui que tem mais fotos desse memorável convescote social.

JE M'EN FOUS

Isto não se faz. Estou aqui quietinho no meu canto, tentando levar a minha vida em paz e sem incomodar ninguém. Até que um belo dia me cai um meteoro na cabeça: disco novo do Biolay! Pior ainda, é a trilha sonora de um filme estrelado por ele!! Putaine faute de sacanage. Agora perdi totalmente o foco em qualquer outra coisa. Nada mais me interessa: trabalho, amigos, marido, fiquem bem, adeus. Abre parênteses para quem ainda não sabe: o cantor francês Benjamin Biolay é meu noivo secreto já há vários anos. Ele nem suspeita da minha existência e é hétero de carteirinha, mas não importa. Somos prometidos um ao outro num nível cósmico. Fecha parênteses. Enfim, aí no alto está o trailer de "Pourquoi Tu Pleures?", que nem parece ser grande coisa - como se fizesse alguma diferença. E aqui está a melhor faixa da trilha, a delicadamente nomeada "Le Bonheur Mon Cul". Sei que corro o risco de muitos leitores também se apaixonarem pelo meu fiancé, mas não faz mal. O Biolay já é meu e ninguém tasca.

quinta-feira, 16 de junho de 2011

VAI DORMIR, CARALHO

Vou bater minha cabeça na parede até arrebentar: porque eu não tive essa ideia antes? Um livro infantil para adultos! Talvez porque eu não tenha filhos, então não tropeço nos mesmos insights que as pessoas que se reproduzem. Nunca teria me ocorrido um título tão genial como "Go the Fuck to Sleep" (cuja tradução livre dá nome a este post). Mas ao escritor americano Adam Mansbach ocorreu, e justamente porque ele tem dois filhos pequenos. Na verdade, o título surgiu antes do livro em si. Certa noite, exausto por tentar por na cama seu caçula, Adam escreveu no Facebook: 'não percam meu próximo livro infantil, "Go the Fuck to Sleep"'. Vários de seus amigos gostaram e daí para conseguir um ilustrador e uma editora foi um pulo. Uma versão em pdf vazou na internet meses antes do lançamento oficial, mas isto não impediu o livro de estrear esta semana em primeiro lugar na lista dos mais vendidos do "New York Times". Apesar do ligeiro escândalo, pais no mundo inteiro agradecem por finalmente verem impressas as palavras de desabafo que traziam presas dentro de si. E eu, que sempre gostei de crianças, mais uma vez não me arrependo muito de não tê-las.

O livro é todo em versinhos. Olha só este exemplo, que amor:

The eagles who soar through the sky are at rest
And the creatures who crawl, run, and creep.
I know you’re not thirsty. That’s bullshit. Stop lying.
Lie the fuck down, my darling, and sleep.

A IDENTIDADE DO AMOR


Gostaria de ter mais tempo para ver todos os filmes que estão passando no Festival Varilux do Cinema Francês. Alguns títulos vão entrar em cartaz em breve, mas outros não tem estreia confirmada no Brasil. Por isto corri para assistir a "Os Nomes do Amor", que ganhou os Césars de melhor atriz e melhor roteiro original e é uma comédia romântica politizada. Isto mesmo: o romance improvável entre um caretão e uma maluquete, tantas vezes usado em outros filmes, aqui é entremeado por uma discussão sobre a identidade francesa. Esse debate passa meio por cima das nossas cabeças brasileiras, mas por lá está na ordem do dia. Tanto que o título original é "Le Nom des Gens", "o nome das pessoas", para enfatizar o quanto a origem étnica sela os nossos destinos (o cara tem mãe judia e a moça tem pai árabe). O filme fez muito sucesso na França e tem várias piadas estritamente locais, o que limita seu potencial de exportação. Mas outras são realmente boas, e a desinibição da linda Sara Forestier vale o ingresso. Ela topou fazer uma cena em que sua personagem simplesmente se esquece de se vestir, e só percebe que está nua em pelo quando entra no metrô...

quarta-feira, 15 de junho de 2011

MORRE, SARNEY

Na boa. Não aguento mais sua influência nefasta sobre o nosso país. Ninguém aguenta. Você foi um presidente pífio e condenou seu estado natal aos piores indicadores nacionais. Mas continua mandando prender e mandando soltar, seja lá qual for o governo. Políticos da sua laia são eternamente situação. Depois de inúmeros escândalos e maracutaias, leio agora nos jornais que você e o Collor conseguiram que o governo Dilma alterasse o projeto de reduzir o tempo de sigilo dos documentos de estado. É óbvio que os dois não querem deixar vir à tona muitos podres que devem ter acontecido em suas presidências. Porque continuam aí, disputando votos, verbas e cargos. Exercendo o “pudê” com despudor. Então, só me resta pedir: morre, Sarney. Fecha os olhinhos, reza uma prece e pede para o Papai do Céu te levar. Ou então usa uns comprimidos, sei lá. Não faço questão que você sinta dor. Nem estou sugerindo a ninguém que cometa um assassinato. Só quero que você morra. Saia de cena. Entre para a história. Chega. Basta. Já deu.

P.S.: Só não peço a mesma coisa para o Collor porque tenho certeza de que ele não chegará à mesma idade que o faraó do Maranhão.

FH-UMA-C


Como é bom um político que não pretende se candidatar a mais nada, não? O cara pode finalmente dizer o que pensa, e ainda fazer alguma diferença. É o que está acontecendo com Fernando Henrique Cardoso: o ex-presidente poderia tranquilamente ser eleito senador ou governador de SP, mas preferiu seguir um caminho longe das urnas que só o dignifica (e que contrasta violentamente com a carreira pós-Planalto de um Sarney, por exemplo). Nos últimos anos FHC começou a entrar no debate sobre a descriminalização de algumas drogas, e este envolvimento está lindamente retratado no documentário "Quebrando o Tabu". Ele aparece conversando com ex-viciados, policiais e diversos líderes, das favelas cariocas às coffee shops de Amsterdam. Experiências como as de Portugal e da Suíça são comparadas, e entremeadas de depoimentos de políticos (todos ex- alguma coisa) como Bill Clinton e Jimmy Carter. O ponto de partida é claro: a "guerra às drogas" detonada pelos EUA nos anos 70 e logo difundida mundo afora simplesmente não deu certo. O consumo só aumentou e a violência atingiu níveis nunca vistos. Mas a conclusão é um work in progress. O próprio FHC exprime um fumacê de dúvidas, e o filme termina sem um proposta sólida. Aliás, termina um pouco tarde: os vinte minutos finais são meio redundantes, com as mesmas personalidades reiterando o que já haviam dito antes. Dá para perceber que o jovem diretor Fernando Gorstein Andrade (meio-irmão de Luciano Huck) quis aproveitar ao máximo as muitas horas de material que filmou. Mas com apenas uma hora de duração "Quebrando o Tabu" ficaria ainda mais contundente, e poderia até ser exibido como um episódio do "Globo Repórter" - aliás, na TV o filme teria uma repercussão infinitamente maior do que no pequeno circuito de salas onde está em cartaz. Apesar do final meio em aberto, o objetivo básico é alcançado. O debate sobre drogas precisa sair da esfera meramente criminalística e ser encarado de frente, sem preconceitos. Vamos apertar agora, nem que seja para acender mais tarde.

terça-feira, 14 de junho de 2011

FASTIDIOUS AND PRECISE

Esta noite sonhei que subia no palco com Freddie Mercury para cantar "The March of the Black Queen", uma música tão complicada que o Queen nunca chegou a incluí-la inteira num show. Acordei com a letra na cabeça e até postei um pedaço no Facebook. Qual não foi minha supresa ao descobrir algumas horas depois este versão esplendorosa de "Killer Queen" - OK, não é a mesma rainha, mas tá valendo.

GRAÇA INALCANÇADA

Vale tudo no humor? Eu pessoalmente acho que vale, CONTANTO que a piada seja engraçada. E aí entramos num terreno pantanoso e subjetivo, porque o que tem graça para mim pode ser insultoso para os outros. Este debate vem pegando fogo aqui no Brasil e lá nos EUA. O pessoal do "CQC" vem dando várias twittadas infelizes, ofendendo judeus e mulheres, e foi objeto de vaias na recente Marcha das Vadias em São Paulo. A MTV despertou a ira dos pais dos autistas com um quadro que passou despercebido, até explodir no YouTube. E um militante extremado está processando Marcos Mion por causa de uma piadinha boba envolvendo Nany People. Enquanto isto, tem americano pedindo a cabeça de Tracy Morgan, que faz um personagem baseado nele mesmo (têm até o mesmo nome) na ótima série "30 Rock". Tracy também é stand-up comic e disse numa apresentação semana passada que "apunhalaria um filho gay". Ele já se desculpou inúmeras vezes, mas ainda corre o risco de perder o emprego na TV. De fato, sua colocação foi muito além da sem-gracice: ela incita a violência pura e simples, e fica ainda mais chocante na boca de um comediante negro. Mas daí a ser despedido da NBC acho um pouco meio muito. Todo humorista exagera de vez em quando, faz parte do job description. Por outro lado, isto não significa que qualquer coisa possa ser dita a qualquer momento, e que viva a liberdade de expressão. "Politicamente incorreto" virou a maneira in com que os escrotos gostam de chamar a si mesmos.

Para terminar, gostaria de compartilhar uma piada maravilhosamente horripilante que é contada durante o filme "Blue Valentine":

O pedófilo e o menininho caminhavam de mãos dadas floresta adentro. Começou a escurecer.
- Tio, tô ficando com medo...
- E eu, que vou ter que voltar sozinho?

segunda-feira, 13 de junho de 2011

NOT JUST FOR GAYS ANYMORE

Porque cargas d'água a entrega dos Oscars não consegue ser tão divertida e excitante quanto a dos Tonys? Aos desavisados: sim, existe um prêmio com meu nome. Mas não é em minha homenagem - ainda não. Tony é a sigla de Theater Of New York. Uma descrição falsa, já que só são premiadas as peças em cartaz na Broadway e arredores. O famoso off-Broadway tem sua própria premiação. Mas voltando à pergunta do começo: a chatice dos Oscars se deve à pretensão olímpica de atingir 700 bilhões de pessoas em todo o planeta. Já os Tonys só esperam ser vistos por pessoas que adoram musicais. Todas as 37.

Se bem que o número de abertura da cerimônia deste ano, que rolou ontem à noite, fala exatamente que a Broadway não é mais só para as bibas. O sensacional Neil Patrick Harris, gay assumidérrimo, cantou e dançou junto com freiras, homens de negócio e missionários mórmons, todos personagens de espetáculos indicados. Claro que também também tem viado às pampas em outros shows, como em "Priscilla, Queen of the Desert" - que venceu o prêmio de melhor figurino, como a versão para o cinema já tinha faturado nos Oscars.

Mas o grande vencedor da noite foi mesmo "The Book of Mormon", que levou 10 dos 12 troféus a que concorria. Este musical iconoclasta é da autoria dos criadores de "South Park" e conseguiu agradar a todo mundo: crítica, público e até mesmo à Igreja dos Santos dos Últimos Dias, que provou ter algum senso de humor. Enquanto isto, o acidentado "Homem-Aranha" sequer concorreu: a estreia oficial só acontece semana que vem.

Outro que não conseguiu ser indicado foi Daniel Radcliffe, mais conhecido como Harry Potter. Ele é a estrela de "How to Succeed in Business Without Really Trying". Pelo vídeo dá para perceber que o rapaz canta mal e porcamente, mas não tem medo de release the chicken quando a coreô assim o exige. Que desenvoltura, hein? Os anos de treinamento com varinha mágica finalmente se pagaram. Arre, e essa vontade de ir para Nova York que não passa?

DIA DOS EX-NAMORADOS

Os exibidores brasileiros devem estar se divertindo muito com a pegadinha coletiva que pregaram neste final de semana. Milhares de pessoas foram ver "Namorados para Sempre" pensando que se tratava de uma comediazinha leve, totalmente apropriada para o dia 12 de junho - só para sair aos prantos do cinema. Até a Marta Matui se deixou enganar. E, apesar de ter comprado gato por lebre, ela ainda gostou mais do filme do que eu. Não que seja ruim, mas "Blue Valentine" (bem melhor o título original, não?) é mesmo árduo de se ver. É a decomposição de um casamento, entremeada de flashbacks dos tempos em que os pombinhos se conheceram no colégio. Sabe quando você está num restaurante e o casal da mesa ao lado começa a discutir a relação até às raias do insuportável? E você preso ali, sem poder intervir nem escapar porque sua comida ainda não chegou. O filme causa uma sensação parecida. Uma das regras de ouro da comédia romântica é fazer o espectador se apaixonar pelos personagens; aqui, eles são quase repugnantes de tão antipáticos. Mas o preço do ingresso vale pela câmera moderninha, obrigatória no cinema independente americano, e pelas incríveis atuações de Ryan Gosling e Michelle Williams. Ela chegou a ser indicada ao Oscar, e não faz o menor sentido ele também não ter sido. Além do mais porque seu papel de homem sem ambição é até mais difícil. Enfim: é preciso ter estômago e um mínimo de informação prévia para se apreciar esses "Namorados". Coisas que devem ter faltado ontem a inúmeros casaizinhos.

COXINHA EM TRANSE

Estou ouvindo o novo disco do ATB sem parar desde sábado, e me sentindo mais coxinha do que nunca. Não sei explicar porque, mas trance para mim é um guilty pleasure. Acho que é som de mauricinho. De boate hétero na Vila Olímpia - não que eu já tenha ido a alguma. Mas o fato é que o CD duplo "Distant Earth" é uma gostosura, apesar de não trazer rigorosamente nada de novo. E já houve um tempo em que o DJ e produtor alemão Andre Tanneberger era considerado transgressor: seu single de estreia, "9 AM (Till I Come)" foi o marco zero de um novo gênero. Fez um sucesso enorme em 1999 e escancarou o som que se tocava em Ibiza para as massas ignaras. Logo em seguida estouraram Tiësto, Paul Van Dyk, Armin Van Buren e muitos outros, com aquela sonoridade feita para a bala bater. Hoje já virou tudo trilha de comercial da C&A, apesar de ainda arrastar multidões para as raves - ou talvez por isto mesmo. ATB faz um estilo de dance music tão branco que é como se a África nunca tivesse existido: as batidas discretas lembram mais um BMW rodando numa autobahn do que tambores tribais. E mesmo assim não consigo parar de ouvir. A faixa "Gold" foi escolhida para tocar no rádio, e é das menos esotéricas deste álbum. No fundo não passa de new age para as pistas, mas quem disse que coxinha não é gostoso?

domingo, 12 de junho de 2011

GAGARE L'OMOFOBIA

Agora virou moda falar mal da Lady Gaga, mas é bom lembrar que nem mesmo Madonna se envolveu tanto na luta pelos direitos igualitários. Enquanto as outras divas que vivem às nossas custas estavam no cabeleireiro ou enchendo a cara, a Germanotta participou ontem do Roma Europride, justamente no país da Europa Ocidental onde os gays menos avançaram. A moça tem orgulho de sua ascendência italiana e cantou duas músicas, "Born This Way" e "Edge of Glory". E recebeu críticas tanto do Vaticano como do governo Berlusconi, sinal de que está fazendo algo certo. Daqui a duas semanas teremos em SP a tal da "maior parada do mundo"; quantas das nossas estrelas virão dar a cara para bater? O pessoal do "Pânico" não vale.

CINÉ-INSTAGRAM

Levou 9 anos, mas finalmente François Ozon fez um filme de pegada parecida com sua obra-prima "8 Mulheres". As cores exageradas, a trilha sonora kitsch, Catherine Deneuve: muitos dos mesmos ingredientes são usados novamente em "Potiche - Esposa-Troféu". Mas há uma novidade na obra ozoniana, geralmente encharcada de pessimismo e melancolia - e da qual nem mesmo "8 Mulheres" escapava, apesar de ser oficialmente uma comédia. Desta vez o clima é para cima, leve e ensolarado. Não que tudo sejam flores (de plástico). A vida de Suzanne, a esposa do título, está uma barafunda. Apesar da rotina confortável de dondoca, ela tem um marido adúltero, dois filhos problemáticos e um enorme vazio interior. Tudo muda quando o marido precisa se afastar da fábrica de guarda-chuvas que fez a riqueza da família, por causa de uma greve. Suzanne assume o comando e se revela uma administradora muito competente, e ainda reacende uma paixão do passado com o personagem de Gérard Depardieu - que está tão gordo, mas tão gordo, que daqui a pouco não terá mais o physique du rôle nem para continuar fazendo o Obelix. A história se passa em 1977 e traz uma mensagem feminista que soa perfeitamente ultrapassada nos dias de hoje: mulheres também podem trabalhar fora! Podem disputar cargos públicos! Nem Ozon leva isto muito a sério. O diretor prefere carregar nas tintas almodovarianas e inclui até números musicais, deliciosamente fora de propósito. "Potiche" parece ter sido finalizado usando o Instagram, aquele aplicativo do iPhone que deixa as fotos com cara de antiguinhas. Não é um filme substancial, mas é gostoso feito um éclair lilás.

sábado, 11 de junho de 2011

BORN THIS WAY

Semana passada eu disse que o "Vogue", da Madonna, era o vídeo mais gay de todos os tempos. Aqui está a prova: o escolhido pela revista "Out", o "Physical" da Olivia Newton-John, jamais inspiraria um remake como este, de 1991.

AMOR NO ESCRITÓRIO

Dica-relâmpago para quem estiver passando o fim de semana em São Paulo: o 15o. Festival Cultura Inglesa ainda apresenta hoje e amanhã a peça "O Contrato", do inglês Mike Bartlett. É o mesmo autor de "Cock", que eu vi no México em abril e me deixou estupefato. Este texto é mais antigo e tem toques de absurdo, mas também é muito bom. A funcionária de uma empresa é chamada pelo chefe repetidas vezes, por causa de uma cláusula em seu contrato que a proíbe de ter envolvimentos amorosos com os colegas de trabalho. Claro que é exatamente o que ela acaba tendo, e a ação vai ficando cada vez mais surreal - o que não deixa de ser um retrato fiel das relações complicadas entre patrões e empregados. O cenário é simples e eficiente, os atores estão afiados e a direção inventa marcas criativas para um texto que poderia facilmente descambar para a monotonia. E o melhor de tudo: a entrada é gratuita. Basta retirar os ingressos na bilheteria com uma hora de antecedência (ontem estava cheio, mas não lotado). Confira aqui horários e endereço.

sexta-feira, 10 de junho de 2011

GUERRA SANTA

Até meados do ano passado, o casamento gay e os direitos igualitários eram assuntos quase inexistentes no Brasil. E isto apesar da PLC-122 se arrastar há anos no Congresso, o beijo gay ser aguardado no final de quase todas as novelas da Globo e termos a tão trombeteada "maior Parada do orgulho LGBT" de todo o sistema solar. Isto mudou depois da campanha eleitoral, quando de uma hora para a outra começamos a entrar na pauta dos três principais candidatos - para o mal. Nenhum deles se posicionou claramente ao nosso lado; pelo contrário, assumiram compromissos com forças retrógradas para nos prejudicar ainda mais. O lado bom de tudo isto é que o gênio saiu da lâmpada. De repente, os homossexuais entraram na ordem do dia, empurrados por uma palavra que entrou na moda - o famigerado "bullying" - e agressões físicas que, se não inéditas, ganharam pela primeira vez as manchetes dos noticiários.

Todo esse debate caiu como maná do céu para as bancadas religiosas e os radicais da extrema-direita como Cheque Bolsonazi. Demos a eles de mão beijada uma causa, uma bandeira, um ideal facilmente identificável. O mais triste é que sei por fontes seguras que muitos dos líderes das maiores "igrejas" evangélicas nem são tão homofóbicos assim - assim como não levam exatamente uma vida que segue à risca os Dez Mandamentos, digamos. Mas essa gente é esperta e está de olho na grana dos pobres. Por isto, só falam o que este público-alvo quer ouvir: por exemplo, nada de salvação espiritual. O que interessa é o aqui e agora, a cura milagrosa, o carro novo, o emprego sonhado. Quem pagar mais dízimo ganha mais benefícios materiais e "compra" um lugarzinho no céu, num autêntico "cristianismo de resultados".

Por não terem tido acesso à educação de qualidade e serem ignorantes no sentido estrito da palavra, que não é ofensivo, muitas pessoas de origem humilde têm preconceitos contra os gays - e não só elas, é óbvio. Essa opinião é compartilhada por muitos pastores, mas muitos, muitos outros, simplesmente usam a homofobia como estratégia de marketing. É algo que inflama e mobiliza o rebanho; portanto, que seja usado em doses cavalares. A recente aprovação implícita pelo STF da união civil entre casais do mesmo sexo deu argumentos dourados para essa cambada por as manguinhas de fora e despejar seu discurso de ódio disfarcado de ira santa.

"A Bíblia diz que o casamento é entre um homem e uma mulher." Diz mesmo? Uma panorâmica pelo Antigo Testamento revela inúmeras contradições. Depois que Sodoma é destruída, as filhas de Ló embebedam o próprio pai e o seduzem, engravidando dele. Abrãao era casado com Sara, mas teve seu filho Ismael com a escrava Agar. O sábio rei Salomão tinha 700 esposas e 300 concubinas. Todos esses personagens são considerados patriarcas, profetas, heróis da religião; nenhum foi punido por Deus por seus pecadilhos sexuais. As incongruências da Bíblia não são novidade. Quem quiser viver 100% de acordo com seus preceitos teria que abdicar não só da carne de porco como também a de qualquer crustáceo. Também é permitido vender a própria filha como escrava. Alguém se habilita?

É muito fácil fundar uma nova igreja no Brasil. Bastam poucos trâmites burocráticos para se criar o que na prática é uma empresa à prova de impostos. Melhor ainda: à prova de críticas, pois qualquer contestação é logo enquadrada como atentado à liberdade religiosa e/ou à de expressão. Acontece que religiões são voluntárias, mas orientações sexuais não. Ofender alguém por causa disto deveria ser gravíssimo, mas a maioria da população ainda não tem essa consciência.

Nenhum lugar aprovou com facilidade o casamento gay e outros direitos igualitários. A avançada Holanda afundou num debate amargo, onde os reaças diziam que o país viraria motivo de escárnio internacional. Dez anos se passaram e a sociedade holandesa não acabou, como aliás não aconteceu nada demais nos já vários países onde temos direitos (quase) iguais. Isto precisa ser dito nos debates. Também precisamos perder o medo de reagir, de enfiar o dedo nos pontos fracos (pastores corruptos, padres pedófilos, milagres falsos) e rasgar. Vamos usar as mesmas armas, menos a violência física. Essa guerra mal começou.

quinta-feira, 9 de junho de 2011

A HORA DE SAIR DE CASA

Ontem foi o primeiro dia da Casa dos Criadores, um evento que precede a São Paulo Fashion Week. Desta vez os desfiles foram transferidos do shopping Frei Caneca para o Museu Afro-Brasil, dentro do parque do Ibirapuera. E só faltou nevar lá dentro, de tão frio que estava. O que só aumentou minha pena das modelos, obrigadas a desfilar moda praia e a descer escada com saltos de assustar Lady Gaga. Como sempre, fui só para assistir ao desfile semestral de meu amigo Rodrigo Rosner. Conseguimos lugares atrás do telão e não víamos nada do que era projetado nele. Esperava que o do Rodrigo fosse o último; quando começou o segundo desfile, eu estava mais preocupado em identificar com o aplicativo Shazam qual música que estava tocando. Mas eis que no final entra o próprio na passarela - era dele a coleção, da qual afinal gostamos muito. Eu não identifiquei seu estilo de cara. Os modelos estavam mais leves e mais coloridos do que de costume, inspirados na arte cinética de Abraham Palatnik. Foi de longe o melhor da noite. O que leva à seguinte questão: e agora? Esta é a sétima vez que a grife R.Rosner se apresenta na Casa dos Criadores, teoricamente um celeiro de jovens talentos. Está na hora de deixar o ninho e alçar voos mais altos. Mas conseguirá ele entrar na SPFW de janeiro? O mundo da moda tem mais cobras que uma convenção do PT. Pelo menos o pessoal está mais bem vestido.

(o desfile da R.Rosner pode ser assistido na íntegra aqui.)

SOLTE SUAS FERAS

Assisti ontem pelo TV a algumas das argumentações dos ministros do STF sobre a libertação de Cesare Battisti. Dessa vez o tribunal se dividiu: alguns votaram a favor, outros contra, todos com brilho e saber jurídico. Mas o que realmente interessa é que Battisti só pôde ficar no Brasil porque militou numa organização de esquerda. Fosse de direita, já teria sido despachado há tempos de volta ao país de origem - como Norberto Tozzo, aquele milico argentino acusado de torturador, preso no Rio de Janeiro e devolvido a Buenos Aires embrulhado para presente. Simples assim. Fim da discussão.

EVEN BRIGHTER THAN THE MOON MOON MOON

Domingo que vem estreia no canal a cabo Oxygen, nos EUA, o reality show "The Glee Project", que vai escolher um novo personagem fixo para a série da Fox. De interesse especial para nós é a participação do brasileiro Matheus, o pequenininho de casaco azul. Confesso que senti um pouco de aflição quando ele aparece pela primeira vez: achei que se tratasse de um homem tronco cuja mãe tomou talidomida. Mas no final o destaque para nosso compatriota é total e ele acaba mandando muito bem. Também gostei muito da ruiva que abre o clip e, claro, do gordinho negro desmunhecado - porque fazer parte de uma única minoria é para os fracos.

quarta-feira, 8 de junho de 2011

TRENZINHO DESCARRILADO

Todo mundo sabe que a Grã-Bretanha é uma democracia antiga e funcional, mas muita gente se esquece que por lá o governo ainda tem o direito de censura. Ele é raramente exercido e em geral é para proteger a família real ou algum suposto "segredo de estado". Mas de vez em quando é mesmo para zelar pela moral e bons costumes. O filme "The Human Centipede - part 2" acaba de ser banido por lá, em todos os formatos: não pode nem circular em DVD ou ser baixado legalmente. E isto só porque o cientista maluco que costura três pessoas umas às outras enrola um arame farpado no próprio pau para estuprar o último da fila, depois de se excitar vendo suas vítimas defecando na boca de quem foi costurado atrás. Que injustiça, não? Comentei sobre o primeiro filme ano passado, mas ele não passou no Brasil nem em mostras. Agora, com o escândalo provocado pela continuação, não vai ser mole o que vai ter de neguinho promovendo sessão "proibida" por aí.

SAI DESTE CORPO QUE NÃO TE PERTENCE

Para os muito jovens ou esquecidos: este comercial é baseado no clássico filme de terror "O Exorcista". Tem que ver até o final para descobrir qual é o produto.

terça-feira, 7 de junho de 2011

ESPOSA-TROFÉU

Sacrebleu! Mal chegou ao Brasil para a pré-estreia de "Potiche" no Festival Varilux de Cinema Francês, e Catherine Deneuve já assumiu o ministério da Casa Civil? Esta foi minha primeira reação ao ver Gleisi Hoffmann (já tinha ouvido falar dela, mas nunca prestei muita atenção): que mulher linda, n'est-ce pas? Ela tem só 45 anos, mas mesmo assim está óteeema para a idade. Quem será seu dermatologista? E seu cabeleireiro? Está tudo corretíssimo. Tomara que ele influencie Dilma, que nasceu com carência de cromossomos fashion. O que me leva à segunda reação: meu, que legal ter mulheres nos dois cargos mais importantes do país. Tomara que esse casamento dê certo: Gleisi vai ser a "esposa" da presidenta, assim como esta o foi de Lula. Dei uma googlada para saber mais e logo veio a primeira decepção, tão rápida como a passagem de Palocci pelo governo. A nova ministra, enquanto ainda senadora, se recusou a assinar a proposta de desarquivamento do PLC-122 patrocinada por Marta Suplicy. Deu umas declarações meio confusas e tentou não desagradar ninguém, mas não foi bem sucedida. Eu me junto aos que não gostaram.

BEIJO DO GORDO

"Eu conversei aqui com o ministro Antonio Palocci e não encontrei nada, nadica de nada, que o impeça de continuar à frente do Ministério da Casa Civil. Também não encontrei nada, é óbvio, que me impeça de cumprir mais um mandato como Desencontrador-Geral da República. A gente volta já, já!"