Conheci o irmão dela no pré-primário e de cara ficamos muito amigos. Essa amizade puxou as outras: primeiro entre as mães, que se encontravam na porta do colégio e nas festinhas. Depois entre os pais, pois frequentávmos todos o mesmo clube. Logo as famílias passavam férias juntas, na fazenda ou na Disney. Todos brincavam que ela e meu irmão menor deviam namorar, mas os dois jamais demonstraram qualquer interesse romântico um pelo outro. Em compensação, se tornaram praticamente irmãos de criação.
Ela foi a primeira da nossa turma a se casar e a primeira a engravidar. Antes de dar à luz, um susto enorme: linfoma de Hodgkins, diagnosticado no 6o. mês de gestação. Ela esperou até o 8o. mês, fez uma cesariana e imediatamente começou a quimioterapia, o que a impediu de amamentar a filha. O tratamento durou um ano, mas foi bem sucedido. Depois ela ainda teve gêmeas, e viveu bastante tempo feliz e despreocupada.
Cinco anos atrás, o câncer voltou. Primeiro no seio. Depois no fígado. Depois no estômago. A vida dela virou um entra-e-sai de hospital e uma via-crucis de operações. Perdeu peso e cabelos, mas nunca o bom humor. Há dois meses nos encontramos na porta do Suplicy. Ela não tinha nem cílios mais, mas continuava engraçada como sempre.
Semana passada foi internada novamente. Sabíamos todos que era a reta final. Fui visitá-la anteontem e fiquei impressionadíssimo. Nunca tinha visto um paciente terminal de câncer. A barriga estufada, a pele quente e úmida por causa da febre. Ela dormia e respirava com dificuldade. A enfermeira garantiu que não sentia mais dor. E eu, apatetado, contava piadas inadequadas para os presentes, depois de ter chorado no carro.
Ela morreu na tarde de hoje, 10 dias antes de completar 46 anos. A família, com exceção das filhas, demonstra aquela dor serena de quem teve tempo de se acostumar com o inevitável. Amigos vieram de longe para um velório que começou ainda em vida. Ela era querida – a melhor marca que se pode deixar neste mundo. E mais uma vez não estou revoltado com Deus. Estou é agradecido por ter convivido com ela por tantos anos.
é foda... eu tenho muito medo dessa doença, por ter histórico na família por ambas as partes...
ResponderExcluirQue bonito. Fiquei tocado com sua homenagem.
ResponderExcluirUma linda homenagem. Vc realmente tem o dom das palavras. Sinto muito.
ResponderExcluirTriste, mas é a vida. O pior de tudo é o sofrimento causado a vitima
ResponderExcluirEnfim...
É isso aí...
ResponderExcluirUM BEIJO ENORME E UM FORTE ABRAÇO EM VC, QUE FOI SEU GRANDE AMIGO! Tem sentimentos que são eternos e dificeis de explicar mas como disse a marca foi boa e será eterna em sua lembrança. FORÇA! Chora o que for preciso e depois fique feliz com as boas lembranças dela... eu nem conheci e só de falar ctg ontem já senti o peso e valor desta grande amizade. FIQUE BEM!
ResponderExcluirAchei muito positiva a forma como você se retrata em relação à morte da amiga querida, principalmente quando termina o texto "agradecido por ter convivido com ela por tantos anos".
ResponderExcluirEsse é o caminho para todos aqueles que não temos uma fé em que se apoiar. Só assim dá pra continuar a vida com força e tentar sempre deixar o melhor da gente espalhado por aí.
Meus sentimentos,
e um abraço
Meus pêsames Tony.
ResponderExcluirRapaz, te acompanho há bastante tempo. Ainda morava em S.Paulo. Agora estou em Porto Alegre, e teu blog me faz viajar sem passaporte. Mas esta postagem foi muito, muito especial. Você se superou. Linda maneira de descrever o que não tem nome, e apaziguar quem te lê. Valeu, Tony!
ResponderExcluirTony, que noticia mais triste. Gostei muito do teu texto. Vc tem razão em estar agradecido por ter convivido com ela por todos estes anos. Sinto muito pela familia. Beijos Bibinha
ResponderExcluirBelo texto, Tony. Você me emocionou.
ResponderExcluirlindo texto! parabéns!
ResponderExcluirMeus sentimentos Tony!! Mas a vida é assim, vale os momentos que se vive. E com o passar dos anos a gente vai notando que o ciclo de amizades vai se "fechando", a gente começa a ir cada vez mais aos encontros de despedida e o coração dando lugar as saudades!!
ResponderExcluirAmigo, sinto pela perda da sua amiga tão querida... e você fez um texto muito lindo, delicado e positivo mesmo dentro de uma situação tão sombria...
ResponderExcluirVocê além de um artista da escrita tem uma alma incondicional...
fiquei tocado... lágrimas me vieram aos olhos e fiquei a imaginar se algum dos meus amigos diria algo semelhante sobre mim.
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