sábado, 31 de julho de 2010

ERA UM, ERA DOIS, ERA CEM

Este ano ainda não vi nenhum filme brasileiro de ficção que fosse realmente bom. Em compensação, os documentários estão cada vez melhores. A bola da vez é o ótimo "Uma Noite em 67", sobre a final do Festival da Música Popular Brasileira (mais conhecido hoje em dia como Festival da Record) daquele ano. Os diretores Renato Terra e Ricardo Calil se concentram nas cinco primeiras colocadas: "Maria, Carnaval e Cinzas", com Roberto Carlos; "Alegria, Alegria", com Caetano Veloso; "Roda Viva", com Chico Buarque e o MPB4; e a grande vencedora, "Ponteio" com Edu Lobo e Marília Medalha. Como exceção da primeira, talvez o único samba gravado por Roberto em toda sua carreira, todas as outras se tornaram grandes clássicos da MPB e tocam por aí até hoje. O filme lhes faz justiça mostrando todas na íntegra, além do grande escândalo do ano: a vaia a Sérgio Ricardo, que fez com que ele quebrasse o violão e o atirasse na plateia (hoje seria preso e processado). A vaia, aliás, foi merecida, pois "Beto Bom de Bola" é simplesmente horrorosa. Saímos do cinema assombrados: como foi que canções tão elaboradas, tão sofisticadas, caíam tão fundo no gosto popular e provocavam verdadeiros tumultos entre os fãs presentes ao teatro naquela noite? E feitas por uma gente tão novinha: Chico tinha 23, Caetano um ano a mais. Eram realmente outros tempos. Aquela foi talvez a última geração da elite brasileira (nem todos "tinham berço", mas todos eram cultos e educados) que se interessou a sério por música. O resultado é que só agora seu domínio está arrefecendo, sem que outra geração do mesmo quilate tenha aparecido. Por quê, hein? Uma das minhas teorias é que o Plano Real favoreceu o take over da cultura brasileira pelas classes C e D. Claro que a música brega (hoje chamada de "romântica") sempre existiu, mas era relegada a um gueto, ao quarto das empregadas. Sertanejo, então, era o supra-sumo do ruim (e eu acho que ainda é...). O Brasil melhorou (um pouco) a distribuição de renda, mas a educação foi ladeira abaixo. E os um, dois, cem de 67 hoje parecem tão poucos.

17 comentários:

  1. Querido Marie Antonyette,

    Já parou para pensar na possibilidade de que as gravadoras tenham se tornado somente... mais voltadas para resultados (= lucro) nas últimas décadas, abandonando o costume de patrocinar novos talentos com a intensidade e vontade que faziam nos anos 60/70? E que com isso só ficou evidente que a elite brasileira (financeira, é claro, porque berço não patrocina nem contrata) realmente continua inculta, ignorante e sem saber diferenciar o excepcional do medíocre?

    Falo isso porque como integrante da classe C (que possui geladeira e aspirador de pó, conforme conceitos do IBGE, e que foi nutrido a iogurte e frango, graças ao Plano Real) que frequenta universidades reduto tradicional das classes B e A sinceramente percebo que falta de sofisticação e conhecimento cultural independem de classe social nesse país.

    Abraços,
    Fernando.

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  2. Hahaha, sabia que os comentários rancorosos não iam demorar a chegar.

    Fernando, gravadoras SEMPRE visaram o lucro, nos anos 60 ou agora.

    Quando falei em "elite", estava me referindo principalmente à elite CULTURAL, coisa que este país já teve melhor. Chico vêm de uma família de intelectuais, Edu de uma de diplomatas. Nenhum dos dois jamais foi rico. Caetano e Gil vêm de famílias mais humildes, mas os dois já tinham uma sofisticação que só uma educação primorosa consegue dar. Roberto não tinha educação formal, mas uma educação musical refinada, literalmente aprendida nos "bares da vida" onde foi crooner.

    Tanta informação gerou uma música inifinitamente mais elaborada (e, ouso dizer, muito melhor) do que a de hoje. A cultura dominante das classes C e D tem muita coisa ruim não porque as pessoas dessas classes sejam "ruins" ou seja lá o que forem, mas porque não têm acesso à informação e à educação. Não é culpa delas: é da desigualdade do país, provocada em imensa parte pela elite (a econômica, não a cultural).

    A elite de hoje é uma tristeza, uma desgraça. Neguinho só pensa em ir pro mercado financeiro. Viagem? Compras em Miami. Mas isto não faz com que a embregalhação da cultura brasileira seja postiva, veja bem.

    Alguém mais não está entendendo o que eu quis dizer ou vou ter que desenhar?

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  3. FERNANDO ARRASOU...
    TUNICO ASSUME SUA ARROGANCIA E PREPOTENCIA.

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  4. Tony,
    vc está certíssimo e a coisa é muito pior do que você descreve. Vc se limitou à esfera da cultura, mas a embreguização do país é muito mais geral, infelizmente. Começando pela política, hoje comanda por uma gente muito casca-grossa e feia, com cultura de sindicato. Passa pelo entretenimento, com o endeusamento das burrices geradas nos Big Brothers da televisão e a cultura das celebridades instantâneas, as mulheres-bundas com nomes de frutas, os jogadores de futebol burros mas cheios de grana que pulam sem a menor cerimônia da crônica social para a policial... uma lista que não tem fim. A área da cultura só acompanha todo o resto descendo ladeira abaixo. Nesta ladeira todo dia rola um, rola dois, rolam cem...

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  5. Tony,

    Ainda discordo, cara. O seu argumento coloca a responsabilidade na questão social brasileira quando na minha opinião é resultado do fenômeno mundial de depreciação da cultura posta para ser vendida e consumida causado por uma busca maior de resultados.

    Claro que as gravadoras e empresas sempre visaram o lucro. Assim como as... companhias áereas, por exemplo. O que eu penso é que a intensidade da busca por resultados melhores mudou. A tendência é arriscar bem menos, e ir pelo lucro certo, intolerar erros e/ou investimentos perdidos. Ou sob a lógica atual de custos não parece absurdo imaginar uma VARIG servindo serviço completo com talheres de prata num simples Rio-Recife, como acontecia naquela época?

    Isso não foi exclusividade da gente (Brasil). O que eu mais encontrei na Itália foi gente reclamando da queda do nível cultural da população em geral, das discussões, da arte produzida e consumida. E afinal não custa lembrar também que obras-primas da cultura moderna como o Big Brother são originárias de bastiões da igualdade social como a Holanda. Ainda dá para relacionar queda do nível cultural à questão social, ou pensar que isso pode ser mesmo um fenômeno mundial de banalização da cultura vendida?

    E para terminar, "comentário rancoroso", Tony? Coloquei a minha cara, assinei com o meu nome. Discordo, e quando discordo comento. Com a minha típica ironia, que como quem lê o meu blog sabe que eu tenho, mas que fica só nisso. E assim é a dialética: você chega pensando A, eu chego pensando B, e se tudo der certo dá pra sair construindo uma idéia C. That's all.

    Abraços,
    e partindo pra night,
    Fernando.

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  6. Você me chamou de Maria Antoneieta, Fernando. Uma rainha alienada que morreu na guilhotina. Depois sou eu que pego pesado?

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  7. Tony,

    Concordo com Fernando. Você foi simplista no seu post, e sempre esperamos mais de você.

    Deixe de bobagem,
    nunca te vi, sempre te li. E vamos, que a noite é uma criança. Beijos!

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  8. É, também concordo com o ponto de vista do Fernando.

    Acho mais abrangente e lógico.

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  9. Concordo com o Fernando e as vezes acho que esses artistas têm um pouco de responsabilidade...A exemplo uma diarista que tinhamos que estava doida para ir ao show do Chico Buarque com o marido e o preço do ingresso era muito alto e fora uma confusão para qualquer um comprar. Esses artistas são mais acessíveis, em termos que fazem mais shows e em relação a preços. Gosto de sertanejo antigo, o que agora virou música caipira...Artistas como Inezita Barroso(que ja foi professora universitária e doutora honoris causa pela Universidade de Lisboa),Sergio Reis, Rolando Boldrin, Almir Sater, Renato Teixeira...Desconsiderar isso é uma falta de respeito.As vezes acho que esses grandes artistas da mpb viraram acomodados...

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  10. Ahan... e quem aí de vocês teve (ou tem) berço, cultural que seja, com a distância capaz de estabelecer de onde vem a avalanche de breguice, de ignorância e de falta de criatividade que se vê na cultura global (Fernando, vamos então generalizar, ok?), heim? Que essa idéia de cunho econômico para tudo é a mais fácil de entender, de fato o é, mas parece uma fórmula pronta para explicar aos universitários o que vão enfrentar na vida real...
    Não concordo com vocês que atribuem à ganância e ao lucro fácil todas as mazelas atuais, penso que as pessoas se apegam às explicações simples para não enxergarem o quão medíocres nos tornamos, por diversas e complexas razões. Tão complexas que não dá para resumir assim num peteleco as mudanças sociais e intelectuais que nos levaram a esta era de entretenimento burro e covarde. É bom frisar que a cultura é e sempre foi fomentada e consumida pela elite cultural, que antigamente (bons tempos...) se confundia com a elite econômica, mas que hoje, infelizmente, trocou de mãos, junto com as bolsas Louis Vuitton. Só posso lamentar a falta de visão de quem diz ser o LUCRO o vilão da história, pois é realmente tacanha esta ótica. Sempre se buscou lucro, mas a educação - palavra-chave, no meu entender - era muito melhor, mesmo aqui no Brasil, pois as escolas públicas - leia-se grátis - eram referência de cultura e saber. Com relação ao berço, embora hoje as chances sejam mais igualitárias, que me desculpe a ralé, mas é melhor sentar-se à mesa com quem não se atrapalha com os talheres...

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  11. o passado é sempre melhor? essa foi a impressão que fiquei ao ler tanto o texto do Tony como o comentário sobre voo da Varig com talher de prata.

    acho que o Tony idealizou a popularidade real dos ídolos dos festivais naquela época. eram muito populares sim, mas entre aqueles que podiam assistir os festivais. ou seja, a pequena classe média brasileira, que era a única que tinha TV (e uma só por lar!) até então. O resto era na base do radinho de pilha mesmo, que sumiu junto com os quartos de empregada do cotidiano brasileiro.

    e, qual o problema do gênero musical X, Y ou Z ser o dominante na mídia hoje em dia? Parafraseando um político, nunca houve tanta facilidade e diversidade de acesso a qualquer tipo de música hoje em dia. Não gosta de brega? Ninguém te força a escutar. Por exemplo, na era pós-ipod, eu nunca mais escutei uma rádio na minha vida, então tanto faz o que toca nelas. E não assisto Faustão e similares, nem sei quem se apresenta nesses programas.

    acho os comentários do Fernando bem escritos, inteligentes, irônicos e instigadores de debate (o que eu pessoalmente gosto em blogs). mas isso se conseguirmos ignorar o ranço anti-capitalista (hífen ou não) embutido neles, além de uma ocasional escorregada ao comentar eventos anteriores à sua experiência de vida.

    uma Varig com talheres de prata, na minha modesta opinião, é exatamente o exemplo do que tinha de muito errado com a companhia. A empresa era um quase-monopólio mantido às custas de muita troca de favores não tão kosher assim, cobrava tarifa exorbitantes, ineficiente ao extremo. Acho que o país como um todo (e não apenas a mini-elite que voava na antiga Varig) está muito melhor com empresas focadas em baixo custo (com isso vem junto tarifas BEM menores). Cada vez que pego um voo da Gol pro Nordeste fico realmente contente de ver como tem gente andando de avião pela primeira vez. Tenho prazer em ajudar gente que nem sabe colocar um cinto de segurança. Uma senhora humilde veio uma vez pedir para eu desligar o celular dela na decolagem, pois ela não tinha ideia de como funcionava. A mulher do zelador do meu prédio pediu para eu olhar na net uma passagem para Teresina para ela. Para mim, isso é inclusão social, sinal de progresso para o país como um todo.

    tudo isso pra dizer que não acho que o passado fosse essa maravilha toda...

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  12. Tony,

    Foi na brincadeira que eu te chamei de Marie Antonyette. Desculpa, foi a primeira coisa que eu pensei quando eu li o seu post.

    E claro que não te acho alienado, Tony. Se achasse, não entraria no seu blog, nem o teria no meu blogroll e muito menos comentaria. Discordo pacas de você, verdade. Mas acho você um cara inteligente pacas. Com idéias diferentes das que eu tenho, é verdade. Mas ainda sim inteligente.

    Desculpa ae se a brincadeira pegou mal.

    Abraços,
    Fernando
    (ou George Danton, hein? :D)

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  13. E @beto: eu estudo Economia numa universidade federal. Como um professor deixou claro pra gente no primeiro dia de aula, nosso estudo é pago pelo contribuinte brasileiro, e a gente está ali para questionar TUDO o que é considerado como normal ou dado fora dali.

    Portanto, não me nomearia anti-capitalista. Mas um crítico do capitalismo, definitivamente sim.

    Abraços,
    Fernando.

    P.S.- E sobre a Gol, bem que ela podia se decidir entre preços da low-cost ou serviço de linha aérea premium, hein... Ficar no meio termo que não dá...

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  14. Me disse Cesar Charlone que a vocação do Brasil é fazer documentário, e ele tem toda razão.

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  15. Creio que o pessoal do "passado melhor e mais bonito" não se acostumam om a idéia de que o conceito de bom, soisticado etc e talz é mutável como sempre foi e sempre será. Pra mim as letras dessas músicas fazem sentido algum, e sei que nao sou desprovido de gostos piores que a galera dessa geração, apenas pertenço a outra época em que se passam por outras questões, menos romântica sim, mas não menos emocionante. Não temos festivais de gente cantando roda viva, mas temos festivais de música que modificam a vida da galera muito mais que antigamente... principalmente pro povo que lê esse blog... achei a brincadeira de maria antonieta apropriada pq essa era a mesmas visão que a nobreza francesa tinha em seu declinio, a elevação do terceiro estado destruiria séculos de sofisticação da realeza, até que acabou realmente... não foram construídos mais versailles por ae, mas a evolução humana a partir disto foi fantástica...

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  16. Quem não concorda com vc é "rancoroso"? Hahahahahahah... Hilário. Meu caro, estou convencido que depois do advento do Google precisa mto mais do que saber nomes, datas e fatos pra poder sair por aí dando mta opinião e posando de crítico. Ou seja, precisa saber articulra bem sim, mas precisa mesmo é de co-nhe-ci-men-to. E não estou falando de enciclopédia, viu?

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  17. A Revolução Francesa foi o verdadeiro pecado original. De resto, o mundo mudou... just that.

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